A pandemia da Covid-19, as mudanças climatícas e a guerra na Ucrânia causada pela invasão da Rússia, mergulhou o planeta num mar de incertezas rumo a um horizonte nublado e com probabilidades de grandes tempestades a nível plenetário. Mesmo a globalização – uma arquitectura mundial de integração económica, social, cultural impulsionada pela redução dos custos de transporte e das comunicações há cerca de 40 anos – está gravemente beliscada e já existem teses de especialistas em geopolítica defendendo uma nova era para a Globalização.
A guerra da Ucrânia
Desde o fim da Segunda Guerra Mundial e da guerra nos Balcãs que o continente europeu não tinha sido palco de um conflito tão sangrento no seu território. Contudo, quando menos se esperava, no dia 24 de Fevereiro de 2022, a Rússia invadiu a Ucrânia, e de imediato fez-se sentir os estilhaços desse terramoto à escala mundial.
Os bombardeamentos continuam em grande escala e tudo o que se sabe até agora, depois de quatro meses de intensos combates, é que não se vislumbra nenhuma solução no horizonte capaz de por fim a esta sangrenta guerra que já provocou cerca de 7 milhões de refugiados e seifou milhares de vidas.
A guerra na Ucrânia expôs a Europa à grande dependência e risco energético depois dos vários pacotes de sanções aprovados pela União Europeia. Uma autêntica bomba económica que começou com os oligárquicos ligados ao regime de Putin e praticamente isolou a Rússia na arena internacional. Neste domínio, as consequências têm sido desastrosas. E por isso a Rússia é hoje um estado pária.
A onda da catástrofe alimentar
Segundo a revista britânica The Economist, a Rússia e a Ucrânia contribuem com cerca de 28% no comércio de trigo internacional, 29% de cevada, 15% do milho e 75% do oléo vegetal. A exportação de produtos alimentares da Ucrânia fornece calorias para alimentar cerca de 400 milhões de pessoas no mundo. A guerra tem impedido a saída desses alimentos porque a Ucrânia minou o Mar Negro, a estrada do mar por onde passam os alimentos e a Rússia tem bloqueado o Porto de Odessa. Contudo, mesmo antes da guerra, o Progama Alimentar Mundial (PAM) já tinha alertado que o ano de 2022 deveria ser um ano muito difícil.
A China, a maior produtora mundial de milho, já tinha avisado que devido à escassez e ao atraso das chuvas, as consequências seriam dramáticas. Para complicar ainda mais a situação, a Índia, o segundo maior produtor mundial de milho, resolveu bloquear a exportação deste produto, como medida de precaução para garantir a segurança alimentar à sua população.
Tudo isto terá um violento efeito nas camadas mais desfavorecidas do planeta. Ainda segundo o conceituado jornal Financial Times, as famílias nos países emergentes gastam cerca de 25% do seu orçamento em comida e na África sub-sariana esta percentagem chega a atingir os 40% do orçamento familiar reservada à comida. Tanto quando se sabe, nesses países os governos não conseguem aumentar os subsídios por forma a ajudar os pobres, sobretudo se a dependência energética for grande, o que complicará com a esclada do preço do petróleo.
Infelizmente, com essa tendência, dificilmente se consegue evitar a proliferação da fome no mundo. Apenas com o desminamento do Mar Negro e a boa vontade dos líders mundias poderemos evitar uma catástrofe alimentar que se avizinha no planeta.
Em suma, o mundo mudou. Mesmo que pelo efeito da invasão da Ucrânia tenha contribuido para reforçar a coesão em torno da União Europeia, pelo reforço da importância estratégica da NATO, e mesmo com a onda de solidariedade mundial à volta de Zelensky e o seu povo, a Rússia parece completamente isolada como estado pária, mas hostilizá-la poderá ser um risco muito grande.
Enquanto isto, os Estados Unidos e a comunidade internacional têm bombardeado equipamento bélico para dentro das fronteiras da Ucrânia, mas a guerra sangrenta prossegue e neste momento ainda não se vislumbra uma solução no horizonte. Por esta razão, a estabilidade e a prosperidade das Nações estão em “stand by”. Consequentemente, o mundo vive momentos de escassez de alimentos, uma inflação galopante a nível planetário, um combate sem tréguas ao virus da Covid-19 e os efeitos devastadores do aquecimento global do planeta, um elevado risco para toda a humanidade.
Isto prova que os problemas do mundo estão todos interligados assim como as soluções. Mesmo que tende a nascer uma nova ordem mundial, a cooperação entre os Estados é fundamental para o desenvolvimento sustentável que se pretende! Mas o palco deverá ser entregue à criatividade e à inovação. It’ s time...
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1076 de 13 de Julho de 2022.