No dia em que se celebra o Dia do Professor Cabo-Verdiano, faz sentido analisar quão importante é a educação numa sociedade. O Mundo encontra-se num momento decisivo da sua evolução histórica. Não é apenas uma mudança de geração, é toda uma era que se transforma, redefinindo a civilização. Hoje os paradigmas mudam em minutos.
Através das políticas recentes é possível antever um sistema educativo mais inclusivo, moderno e eficiente. No entanto, e apesar de acreditar nos sinais dados, tenho a firme convicção de que o futuro passa por pensarmos no que queremos para o país e desenharmos um modelo de ensino que possa conduzir Cabo Verde a esse destino. Os desenvolvimentos atuais representam desafios persistentes, mas também oportunidades emergentes para as quais é necessária uma Visão que passe pela inovação, tecnologia e posicionamento estratégico de Cabo Verde.
“O objetivo principal da educação é criar pessoas capazes de fazer coisas novas, e não simplesmente repetir o que as gerações anteriores fizeram.” - Jean Piaget
Um dos pilares fundamentais da transformação educativa reside na universalização da educação pré-escolar. Embora me pareça evidente que todos concordamos com este paradigma, já não tenho a certeza de que todos incorporemos o modelo ideal para as crianças de Cabo Verde. Pelos dados conhecidos somos levados a acreditar que o compromisso em garantir o acesso precoce à educação existe, mas está ainda longe do objetivo que se deveria aproximar dos 100%.
E não é só o acesso a todos que é importante, é a eliminação de assimetrias regionais e a ligação ao Ensino Básico, transformando por completo estes dois blocos do nosso sistema de ensino.
Um mundo em mudança não permite usar os mesmos métodos. A formação contínua de educadores e a integração de recursos tecnológicos deverão ser aprofundadas. A Visão que tenho de futuro obriga à existência de jardins-de-infância públicos bem equipados, com educadores qualificados e acompanhamento pedagógico eficaz em todos os concelhos do país, capazes de eliminar barreiras e estigmas sociais e de dotar todos com as capacidades básicas para um mundo tecnológico e em mudança.
Não podemos ignorar uma realidade com desafios que dificultam o sucesso das nossas crianças. Realidades como dificuldades de aprendizagem em Língua Portuguesa, insucesso escolar entre os rapazes ou lacunas na utilização das TIC são fatores de preocupação.
Projetar o futuro não passa apenas por uma alteração de currículos e formação contínua de docentes. O sucesso das nossas crianças passa por uma aposta inequívoca na utilização das TIC como ferramenta pedagógica transversal e no apoio para que estas crianças possam ter acesso a equipamentos e tecnologias que nos permitam dizer com total convicção que o nosso modelo de ensino é verdadeiramente diferenciado e inclusivo. Só apostando nas crianças de hoje poderemos ter adultos de sucesso no futuro.
“As cem linguagens da criança devem ser reconhecidas, valorizadas e respeitadas.” - Loris Malaguzzi
Os jovens vivem num mundo mais desafiante do que nunca. Talvez nunca uma geração tenha sido tão influenciável, tão dependente e tão frágil. A reestruturação do Ensino Secundário teve um objetivo claro de valorização do conhecimento e da qualificação. Foi seguido um padrão internacional, mas no qual identifico algumas lacunas que merecem especial atenção.
A fragilidade já mencionada leva-me a acreditar que é fundamental incluir uma componente de fortalecimento das competências individuais e sociais de cada um dos nossos jovens. Ter nas escolas um apoio psicológico é estruturante e pode fazer a diferença. Ter uma escola inclusiva não é suficiente se não adotarmos medidas que garantam essa mesma inclusão. E a atenção dada à componente social e de desenvolvimento humano nunca poderá ser descurada.
Perdeu-se, nos últimos anos, a importância de ser criança, perdeu-se também a distância necessária entre quem ensina e quem aprende, e, acima de tudo, perdeu-se a capacidade de impor respeito e exigir um comportamento digno por parte dos jovens. A formação cívica é fundamental, bem como um ensino que aproxime a escola do mundo atual, dando atenção à diferença entre virtual e real e focando os jovens na sociedade e não no isolamento das redes sociais.
Currículos focados na inovação irão garantir não apenas um futuro de sucesso, mas também a formação de jovens capazes de entrar no mercado de trabalho ou prosseguir estudos superiores com preparação sólida e competências transversais bem desenvolvidas.
“A nossa progressiva ascensão como nação depende, em última análise, da qualidade da educação que o nosso povo recebe — e isso inclui, acima de tudo, o ensino superior.” - John F. Kennedy
A nossa taxa bruta de escolarização no ensino superior é de apenas 23%. Embora este valor nos coloque no top 10 em termos de países africanos (onde a média é de apenas 9%), a verdade é que atualmente, três em cada quatro jovens não prossegue os seus estudos para o grau universitário, o que um fator amputador de um futuro de sucesso para o país e para as futuras gerações. Cabo Verde tem a obrigação de expandir o acesso à universidade, democratizar oportunidades e, acima de tudo, tornar-se num país com competências para mudar o seu destino.
As medidas implementadas pretendem alcançar um sistema mais justo e eficiente. No entanto, acredito que devemos ser mais ambiciosos procurando ser um farol de conhecimento e desenvolvimento em África. Temos uma população jovem, temos estabilidade política e institucional, temos uma ligação às nossas raízes africanas e temos ligações privilegiadas com a Europa e o continente americano. Talvez nenhum outro país africano possa combinar estas variáveis, pelo que é responsabilidade dos governantes de Cabo Verde criarem condições para potenciar esta nossa vantagem e dar aos nossos jovens um futuro de liderança.
Devemos investir numa forte ligação à investigação, ao desenvolvimento e às empresas, numa aposta clara nas novas tecnologias. Devemos reforçar a ação social universitária e garantir que existe igualdade de oportunidades e maior acesso ao ensino superior. E devemos apostar na captação de talentos regionais e continentais para Cabo Verde.
A recente decisão de revogação de vistos a investigadores por parte do governo dos Estados Unidos abre a possibilidade aos restantes países de poderem receber nas suas universidades fontes primárias de conhecimento e inovação. Obviamente que não queremos nas nossas praias quem não partilhe dos nossos valores, mas professores, cientistas e investigadores mundiais podem ser atraídos pela qualidade de vida e localização ímpar das nossas ilhas. Isso poderia, efetivamente, elevar o nosso ensino e os nossos jovens.
“A educação é a arma mais poderosa que você pode usar para mudar o mundo.” - Nelson Mandela
A minha Visão de futuro para a educação em Cabo Verde é ambiciosa, talvez pareça utópica, por muitos vista como megalómana, mas possível e ao nosso alcance, assim o queiramos fazer. Não devemos ignorar o caminho, simplesmente temos de querer ir mais longe!
Enfrentaremos desafios nesta jornada, incluindo a resistência daqueles que receiam a educação por ela emancipar o Povo, tornando-o mais independente, livre e capaz. No entanto, esta é uma caminhada que temos de trilhar unidos, enquanto Nação. Embora o meu sonho de fazer de Cabo Verde a Singapura de África possa ser alvo de escárnio por parte dos que querem manter o status quo, a nossa determinação deve prevalecer. Cabo Verde tem de ser de todos os cabo-verdianos. Por isso, devemos: acelerar a aposta na transição digital; fortalecer as competências sociais; conectar o ensino às empresas e ao Mundo; continuar a investir em professores, garantindo-lhes conhecimento e reconhecimento; e, de forma prioritária, redobrar a aposta nos nossos jovens.
Quem teme a ambição de educar, teme um Cabo Verde livre. Não devemos ter medo do futuro, devemos querer liderá-lo!
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1221 de 23 de Abril de 2025.