O texto começa por criticar a forma e a abordagem do conteúdo do artigo, concordando com algumas partes e discordando de outras. No entanto, em momento algum o texto criticou, de facto, o conteúdo do artigo e a relação apresentada, à exceção da análise pouco conseguida sobre o desemprego.
O artigo, originalmente publicado, teve como único objetivo demonstrar que, de facto, a economia cabo-verdiana está a gerar rendimentos e que os agentes económicos privados, ou seja, empresas e famílias, são os principais responsáveis por esta dinâmica. Em consequência, a taxa de desemprego também tem sido positivamente impactada.
Por um lado, seria contraditório fazer uma análise que demonstrasse que a economia estaria a ser dinamizada pelo rendimento do setor privado e, depois, mostrar que o maior impulsionador seria, afinal, o Governo. Aliás, todos os documentos e a linha estratégica do Governo se resumem a apresentar políticas para dinamizar o setor privado, em vez de apostar numa política de estímulo económico ao estilo keynesiano. Por sua vez, seria injusto desassociar o papel do Governo nesta dinâmica e fundamentar que esta é exclusivamente exógena.
É sobejamente conhecido que a economia cabo-verdiana é totalmente dependente do turismo, setor que está muito concentrado em algumas ilhas, nomeadamente Sal e Boa Vista, embora tenha havido alguma dinâmica nas ilhas de Santiago, São Vicente e Santo Antão.
Apesar dos impactos da crise pandémica e da subida dos preços, que abalaram a economia mundial, em Cabo Verde este efeito foi prontamente contornado, graças à implementação de medidas pelo Governo, em conjunto com a intervenção do Banco de Cabo Verde, que esteve à altura das exigências requeridas, antecipando a retoma económica e contrariando todas as projeções, tanto nacionais como internacionais.
Por conseguinte, o crescimento é liderado pelo setor privado (e não tanto pelo setor externo), mas sustentado por reformas públicas. O crescimento do PIB em 2024, na ordem dos 7,3%, é inegavelmente impulsionado pelo setor privado, nomeadamente pelo turismo e pelos setores a jusante e a montante. No entanto, este dinamismo privado não surgiu de forma espontânea. Surgiu num ambiente de estabilidade macroeconómica, de confiança dos agentes económicos e de medidas concretas de apoio à competitividade e ao investimento. Entre as várias medidas, é pertinente destacar o alívio da carga fiscal sobre empresas e trabalhadores, que aumentou o rendimento disponível, bem como a redução da taxa do IVA no setor da restauração, medida com impacto direto na cadeia do turismo e que aumentou a margem de manobra dos operadores privados. Durante a pandemia, o Governo introduziu ainda várias medidas que garantiram a sobrevivência das empresas nacionais, as quais, por sua vez, corresponderam às expetativas no momento da retoma, dinamizando a economia.
Não se deve descurar a importância dos choques externos favoráveis, como o aumento da procura turística. No entanto, não é intelectualmente justo excluir as medidas internas de apoio que permitiram transformar esse choque num crescimento sustentado. O setor público criou as condições institucionais, fiscais e infraestruturais que permitiram ao setor privado prosperar.
Em suma, o crescimento de Cabo Verde é, de facto, o reflexo de uma interação positiva entre um setor privado dinâmico e um Estado reformista e facilitador.
Voltando aos dados, é necessário esclarecer que foi um lapso indicar que o turismo teve um contributo de mais de 74% para o crescimento do PIB. No entanto, reconhece-se que cerca de metade do crescimento do PIB foi influenciado pela dinâmica dos setores conexos ao turismo, dinâmica essa inegável e que se deseja que continue.
Além disso, o texto refere que o investimento público, ou seja, as despesas em ativos não financeiros, diminuiu de 10% do PIB em 2013 para 1,7% em 2023. O que o texto não menciona, por um lado, é a existência do ciclo de vida dos novos projetos de investimento público e, por outro, não refere que os cerca de 26 milhões de dólares investidos em capital humano (investimento na melhoria da qualificação da mão de obra, com foco na formação técnica e profissional e na reforma do sistema educativo), bem como os 20 milhões de dólares investidos no programa de transformação digital, que aposta na digitalização da administração e no apoio à modernização das empresas, não são contabilizados como ativos não financeiros ("betão"), mas sim tratam-se de investimentos transformadores com impacto na dinamização da economia.
Ainda, seria pertinente mostrar que grande parte dos grandes projetos de investimento privado externo pode não ser contabilizada pelo INE ou pelo BCV, dado que os pagamentos dos investimentos são efetuados no estrangeiro, por razões de custo de transação, mas que, na realidade, estão a dinamizar a economia nacional e são registados pela CVTI. Seria justo mencionar esta questão.
O Governo tem vindo a dinamizar a produtividade através de reformas estruturantes, trilhando um caminho deliberado de reformas com foco na produtividade, pilar central para sustentar o crescimento a médio prazo.
O único ponto em que o texto de facto discorda da abordagem do artigo publicado é em relação às políticas ativas de emprego, mas como não conseguiu fundamentá-lo nem com dados nem com teoria económica, a abordagem não foi muito bem-sucedida. De facto, o foco do texto contraria toda a teoria económica do crescimento endógeno e da economia do trabalho.
Baseando-se num excerto do texto, “Para isso, bastaria investir na educação, qualificação técnica e estágios profissionais e – pumba! – eliminaríamos completamente o desemprego”, fica evidente que a teoria económica não foi respeitada nesta análise. De facto, esta análise apresenta algumas lacunas relativamente à teoria da economia do trabalho, o que é particularmente inquietante.
A formação e a capacitação do capital humano não são o fim em si mesmo no combate ao desemprego, mas sim o meio principal para dinamizar e impulsionar a procura e a oferta de trabalho e, consequentemente, a atividade económica. Ter uma força de trabalho mais capacitada, produtiva e com os conhecimentos necessários para responder às exigências do mercado vai permitir produzir mais e, consequentemente, dinamizar a procura de trabalho por parte das empresas. Antes de entrar em pormenor nesta correlação, é conveniente falar de dados e factos. Segundo o relatório do “Estudo sobre a Empregabilidade das Políticas Ativas de Emprego Implementadas no Ano de 2024”, do Observatório do Mercado de Trabalho, 72.9% dos diplomados do ensino técnico e da formação profissional estavam inseridos no mercado de trabalho até um ano após a conclusão da formação. Além disso, a taxa de inserção no mercado de trabalho dos beneficiários das políticas ativas de emprego até um ano após a respetiva frequência foi de 73.0%. Por sua vez, o programa de empreendedorismo apresenta uma taxa de inserção mais elevada, com 88%. Destacam-se também os participantes da formação profissional, com 77%, e os de estágios profissionais, com 75%. Constata-se também que, à exceção dos inquiridos do ensino técnico, todas as medidas apresentaram taxas de inserção superiores a 70%.
Estes dados mostram que, para além do papel da procura, também há um contributo efetivo do lado da oferta, por meio de programas que melhoram a empregabilidade e incentivam a contratação.
A formação foi proporcionada pelo Governo, mas as empresas privadas foram responsáveis pela contratação. Ou seja, não foi a formação que eliminou o desemprego, mas uma força de trabalho mais qualificada, mais adaptável às novas tecnologias e com mais conhecimentos, terá um impacto mais significativo na produção e na melhoria da produtividade, podendo levar a uma maior procura de trabalho. Um agricultor de Santo Antão com conhecimentos mais aprofundados sobre as novas técnicas de produção conseguirá produzir mais e necessitará de mais trabalhadores para expandir a produção. Uma empresa de consultoria com consultores mais capacitados terá um melhor desempenho e precisará de aumentar a equipa para poder responder ao aumento da procura.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1233 de 16 de Julho de 2025.