Quem são e como funciona este negócio?

PorSheilla Ribeiro,15 mai 2022 9:35

Nos últimos anos os influenciadores digitais do mundo inteiro têm sido cada vez mais procurados pelas marcas para divulgarem os seus produtos e em Cabo Verde não é diferente. Pessoas que somam milhares de seguidores no Instagram têm usado esta rede social para ganhar dinheiro com publicidade. Mas, afinal, quem são esses influenciadores e como funciona este mercado?

Kathy Moeda 65.7 mil seguidores, Oracy Cruz 97.4 mil seguidores. Com nomes, idades, personalidades e conteúdos diferentes, ambos têm em comum a profissão, influenciadores digitais.

Há cerca de três anos, Kathy Moeda começou a trabalhar como apresentadora de um programa de televisão. Um ano depois de começar, conta ao Expresso das Ilhas que abriu um perfil no Instagram como figura pública.

“Quando abri esse perfil não tinha nenhuma intenção de ser uma influenciadora digital. Abri o perfil para publicar o meu dia-a-dia na televisão, nos programas em que eu era convidada, nas galas e outros eventos. Desde que criei o perfil houve um crescimento rápido e exponencial e percebi logo que algo se passava”, narra.

A criação de um perfil profissional, segundo Kathy Moeda, coincidiu com um momento sensível na sua vida devido a um surto de acne.

“O meu rosto ficou completamente desfigurado e tinha de lidar com isso porque apresentava um programa de televisão. Usava maquilhagem, mas quando tirava uma foto ou estava nas redes sociais, nem sempre usava. Como procurei a ajuda de um especialista, resolvi partilhar a minha experiência porque havia muitas outras meninas bonitas que poderiam estar a sofrer com acne”, diz, acrescentando que foi o que motivou o aumento do número de seguidores.

Conforme a influencer, muitas meninas que se identificaram com o problema que expôs entraram em contacto, relataram as suas experiências e deixaram-na saber que era uma inspiração para superarem a acne.

Também foi quando uma amiga procurou Kathy Moeda para mostrar, no seu perfil, as roupas que vendia na sua loja.

“Depois da sua insistência, comecei a sentir-me mais à vontade e passei a fazer stories do provador de roupa. Todos os dias colocava fotos das roupas que eu levava para o programa. Tudo que eu publicava, vendia. Roupas, cosméticos, penteados, qualquer coisa que eu publique no meu Instagram esgota”, afirma.

Depois de a amiga pagar pelas publicações, Kathy Moeda percebeu que podia também ganhar dinheiro com o perfil do Instagram, além das publicidades que fazia para outras marcas, fora da rede social.

Trabalhar no Instagram

Kathy Moeda garante que não publicita produtos que não consome ou serviços que não usa e que, por isso, os seguidores acreditam nas suas publicações. Isso, constata, faz com que tudo que publica venda.

Com isso, resolveu especializar-se neste tipo de marketing. Durante o confinamento imposto pela pandemia fez um curso de redes sociais e agora procura sempre outros cursos de marketing digital para que possa estar sempre “antenada” e saber como pode trabalhar.

“Daí fiz um portfólio como influenciara, uma tabela de preços e tive de abrir uma empresa. É tudo preto no branco e, inclusive, pago as Finanças. Ou seja, fora apresentadora, influenciadora também é uma profissão”, frisa.

Segundo esta entrevistada, há empresas que, ou por não acreditarem no potencial dos influenciadores, ou por desconhecerem como funciona este universo, na primeira abordagem oferecem o produto em troca de publicidade.

“Tenho de explicar que não é assim que funciona. Eu não posso pagar as minhas contas com os seus produtos. E quando tenho esse tipo de abordagem estranham. Mas, há empresas que podemos fazer uma permuta. Isso quando vai ao encontro do interesse de ambas as partes”, reconhece.

A influencer admite que há vezes em que toma a iniciativa de abordar uma empresa, pelo interesse se conhecer os seus produtos.

“E, muitas vezes, na primeira abordagem pode haver troca de serviços e, na segunda abordagem, após verificarem minha qualidade como profissional, essas mesmas empresas contratam-me e pagam para determinados serviços”, informa.

Entretanto, a jovem diz acreditar que as marcas ainda resistem a esse tipo de marketing porque acreditam que as publicidades podem ser feitas apenas nos meios de comunicação tradicionais porque consegue-se vender muito mais “com o que é real”.

“Porque as pessoas se conectam quando algo é real e que toca os seus corações”. Por exemplo, eu para falar de um automóvel, a pessoa fica com mais vontade de conhecer o carro do que ver uma publicidade numa paisagem e actores fora de Cabo Verde. Acredito que essa proximidade é muito melhor”, exemplifica.

Kathy Moeda é, actualmente, embaixadora de uma marca nacional de sumos, ou seja, é responsável por transmitir a mensagem da marca ao público. É influencer de uma empresa de telecomunicações e está a ser paga para usar um carro de uma stand de automóveis.

“Pagam para usar os seus carros, para dar o feedback ao cliente, para mostrar que o carro é moderno, cheio de novidades, com um bom preço, entre outras vantagens. Todas essas marcas, assim como algumas lojas de roupa, pagam pelos meus serviços. Todas as empresas que eu levo para o meu Instagram de uma forma consistente, mostrando e falando do produto, pagam”, relata.

Para esses trabalhos, a influenciadora digital assinou um contrato anual com algumas marcas, assim como contratos mensais e trimestrais.

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“Tudo depende da estratégia de marketing da empresa”, explica.

Um perfil de Humor

Oracy Cruz resolveu ser influenciador digital no início da pandemia. Antes, possuía um número significativo de seguidores devido ao trabalho social que fazia na Associação Safende Tudora e, por isso, qualquer publicação tinha muitas visualizações.

“Logo que surgiram os primeiros casos da COVID-19 no país, partilhei um vídeo de um suposto médico de São Vicente e algumas pessoas não gostaram porque achavam que eu tinha uma certa influência e que, portanto, não deveria espalhar pânico”, conta.

Então, Oracy Cruz constatou que, se tinha influência para pânico, também podia fazer algo para divertir as pessoas e fazê-las esquecer a pandemia.

Assim nasceu um perfil que além do humor que se dedica ao trabalho social e divulgação de trabalhos que, no seu entender, merecem ser conhecidos pelo público.

Interacção além dos números dos seguidores

Assim como Kathy Moeda, Oracy Cruz diz que na maioria das vezes as marcas fazem a abordagem para uma publicidade. Por isso, tem pacotes de publicidades que podem ser cobrados semanalmente, mensalmente ou anualmente.

Contudo, também pode haver casos em que se cobra por um vídeo ou uma publicação no feed do Instagram ou Facebook.

O preço, avança, varia de acordo com a empresa que apresenta uma contraproposta para ser negociada. Porém, o processo é igual a uma publicidade feita num meio de comunicação tradicional, tem hora e número de vezes para ser publicada.

“Há conteúdos que não cobro nada para publicar. Isto quando se trata de um artista pouco conhecido ou de um negócio novo. Faço a divulgação gratuita para que as pessoas possam conhecer e assim ajudar alguém”, declara.

No entanto, há publicidades em que o influenciador recebe um produto da marca como pagamento, além do dinheiro.

Para Oracy Cruz, as marcas cabo-verdianas já se aperceberam do potencial dos influenciadores digitais. Mas, ressalva que é algo que devia ter maior notoriedade uma vez que o digital é o futuro.

“Uma publicidade feita numa rede social pode ser vista a qualquer momento do dia e em qualquer lugar. É por isso que muitas empresas começam a investir nesse tipo de marketing e a maioria já começa a criar sua própria página no Facebook ou no Instagram e mesmo Youtube”, fundamenta.

Na sua declaração ao Expresso das Ilhas, assegura que para fazer uma publicidade não basta ter milhares de seguidores, porque as empresas preocupam-se, sobretudo, com a interacção do público.

“Eu tenho hora e forma de fazer uma publicação. Há erros que são cometidos propositadamente para gerar a participação do público e atrair novos seguidores. Nas negociações, as empresas não querem saber apenas do número de seguidores, mas também o seu envolvimento”, denota.

Cruz menciona que essas publicidades tornaram-se numa fonte de rendimento e, por esta razão, quando aparecem gere, da melhor forma possível, todo o pagamento que recebe.

“Porque não é algo que aparece todos os dias, já que muitas pessoas ainda não levam a sério o nosso trabalho. Há aqueles não têm a decência de pagar por uma publicação de divulgação porque acham que é brincadeira o que fazemos nas redes sociais. Só reconhecem o nosso potencial quando é para fazer de graça, para pagar desistem”, lamenta.

Desafios

Kathy Moeda considera que não há contras em ser influenciadora digital e encara como uma profissão que ainda está a dar os seus primeiros passos em Cabo Verde.

“É preciso empenho, gosto e convicção de ser um profissional da área para poder fazer com que as pessoas acreditem no seu valor, no que é transmitido e assim as empresas começam a encarar como um meio de vender os seus produtos. Para mim há mais desafios do que contras”, opina.

Mas, refere, às vezes aparecem pessoas que torcem contra, os chamados haters. Quando aparecem, assevera que os ignora e quando trata de assédio bloqueia.

No seu entender, o primeiro desafio da profissão em Cabo Verde diz respeito à pequenez do mercado e fazer com que as empresas acreditem no potencial dos influenciadores.

Por sua vez, Oracy Cruz aponta como desafio o facto de muitos ainda não encararem um influenciador digital cabo-verdiano como um profissional.

“Aqui somos vistos como palhaços, mas quando são influenciadores estrangeiros admiram o seu trabalho”, lastima.

Apesar disso, vê muitas vantagens em ser um influenciador digital, como por exemplo, o facto de trabalhar ao mesmo tempo em que se diverte. Em contrapartida, aponta que lidar com os haters também é um desafio, porque nem sempre consegue ignorar e deixar de responder a comentários maldosos.

Ainda como principal desafio, Oracy Cruz indica a falta de monetização do país que ainda é desconhecido pelas redes sociais que mais pagam, como é o caso do Tik Tok e o Youtube.

“Eu tenho um canal no Youtube e para ganhar dinheiro com os meus vídeos tive de criar a conta como se estivesse nos EUA. O meu dinheiro vai para os EUA e depois volta para Cabo Verde. Então, para mim este é um dos maiores desafios”, considera.

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Conforme os dados da Mediakix, nos últimos cinco anos, o marketing, através dos influenciadores digitais movimentou mundialmente de 5 a 10 bilhões de dólares. O estudo revela ainda que com mais de mil milhões de utilizadores e uma rede de influenciadores em rápido crescimento que produz milhões de publicações patrocinadas todos os anos, o- Instagram tornou-se o canal mais importante desse tipo de marketing.

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1067 de 11 de Maio de 2022. 

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Autoria:Sheilla Ribeiro,15 mai 2022 9:35

Editado porJorge Montezinho  em  27 jan 2023 23:27

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