António Lopes da Silva, secretário executivo da Comissão Organizadora das Comemorações do 50.º Aniversário da Independência Nacional: “Queremos que as comemorações sejam de todos”

PorNuno Andrade Ferreira,25 abr 2025 14:15

Na semana em que começam as celebrações de meio século de Cabo Verde independente, o Expresso das Ilhas e a Rádio Morabeza entrevistam o secretário executivo da Comissão Organizadora, António Lopes da Silva.

Arrancam esta semana as comemorações oficiais do cinquentenário da independência nacional. O programa decorrerá ao longo de mais de oito meses, com actividades em todo o país e na diáspora, sob o lema “Cabo Verde, Nosso Orgulho, Nosso Futuro”.

Haverá três pontos altos: a abertura, em São Vicente, esta sexta‑feira; 5 de Julho, na Praia; e o encerramento, em Dezembro, no Sal.

A escolha da data da Revolução dos Cravos, 25 de Abril, para início das celebrações não é aleatória, mas antes uma forma de realçar a importância desse momento histórico nos processos de independência das antigas colónias portuguesas.

Numa festa que se pretende para lá dos partidos e das tricas políticas do dia‑a‑dia, há espaço para todos, diz António Lopes da Silva, secretário‑executivo da Comissão Organizadora.

Comecemos pela própria comissão responsável pelas comemorações. Como é que está organizada?

A iniciativa foi do governo, que apresentou a proposta na Assembleia Nacional, onde foi aprovada por todos os partidos. Depois, a proposta foi para o Presidente da República e foi promulgada.

Podemos ver três elementos importantes. Primeiro, a Comissão de Honra, formada pelo Presidente da República, Presidente da Assembleia Nacional, Primeiro‑Ministro, representantes do Supremo e do Tribunal Constitucional, três personalidades escolhidas pelo Conselho de Ministros – Pedro Pires, Carlos Veiga e Helena Semedo – e presidentes dos partidos que têm assento na Assembleia.

Para além da Comissão de Honra, há a Comissão Executiva, que tem um secretário‑executivo, é presidida pela ministra de Estado Janine Leles, e integra representantes de várias instituições, desde os ministérios da Educação, do Desporto, das Comunidades e dos Negócios Estrangeiros; passando pela Polícia Nacional, pelas Forças Armadas e pela Assembleia Nacional.

Depois, também temos a Comissão Concelhia.

Cada município tem a sua Comissão Concelhia?

Cada município terá a sua Comissão Concelhia, que será coordenada pelo presidente de câmara. Queremos que, de facto, estas comemorações sejam de todos, sem excluir ninguém. Não vamos comemorar um dia, nem dois, nem três. Vamos comemorar o percurso que Cabo Verde fez de 1975 a 2025. São 50 anos.

Tivemos conquistas super interessantes, mas não vamos só celebrar o passado. Também vamos ouvir a sociedade civil, os jovens, falar das dificuldades e obstáculos, criar possibilidades, principalmente agora, que estamos a viver num mundo mais complicado. Daí que o slogan é precisamente “Cabo Verde, Nosso Orgulho, Nosso Futuro”. Nosso orgulho, porque o que fizemos durante os 50 anos, todos nós, sem excepção, foi bom.

Percebo que houve a preocupação de envolver o maior número possível de actores, quer da situação, quer da oposição…

Isso é importantíssimo. Sabemos que há pessoas que pensam de forma diferente e só assim é que uma sociedade se desenvolve.

Para comemorarmos o nosso orgulho, é preciso participarmos todos. Queremos que se tire um pouco a carga ideológica. Todos os partidos, toda a sociedade, municípios juntos com o governo central, o governo central junto com os municípios, para se fazer uma festa em que todo o mundo saia a ganhar.

Todas as comemorações sob um mesmo chapéu.

A Comissão Nacional é o chapéu de tudo isso. Tem de haver uma concertação e nós queremos que ela exista. Daí estarmos a entrar em contacto com os municípios.

O mais importante é que todos participem, porque é uma festa na festa. Não há partido A, B, C, D, quem foi melhor, quem foi pior. Tal como aconteceu na Assembleia Nacional, em que todos votaram a favor, temos de estar todos juntos.

Há dias, na apresentação oficial do programa, tocou em três eixos centrais: “memória e identidade”, “desenvolvimento e conquistas”, “futuro e inovação”. Parece-me haver aqui um exercício de olhar para o passado, mas também perspectivar aquilo que pode ser o futuro do país.

É isso mesmo. Quando comemoramos a independência, temos de questionar o que é que está a acontecer em Cabo Verde, no sentido de dar a nossa contribuição para que as coisas melhorem. É isso que queremos.

Uma coisa é certa, o futuro do Cabo Verde está nas mãos dos jovens de hoje. Então, esses jovens têm de estar envolvidos neste processo de comemoração. Por exemplo, vamos ter uma plataforma digital que vai permitir que os jovens digam alguma coisa. Temos o Instituto Nacional de Estatística a fazer um estudo interessante, que vai ser lançado a nível nacional e na diáspora, para saber o que os jovens pensam sobre o futuro do país.

Sobre a diáspora, o programa deixa claro que as comemorações também devem ser feitas a nível de diáspora, através das embaixadas, dos consulados, das associações de cabo‑verdianos. Temos recebido propostas e projectos.

O programa vai sendo construído ao longo do ano.

Cabo Verde é um país profundamente diasporizado, espalhado pelo mundo. Esta dimensão de um pequeno Estado Atlântico, mas globalizado, define muito daquilo que é Cabo Verde.

Evidentemente. O nosso logo tem a bandeira nacional, que é o símbolo da unidade, tem dez ilhas e tem uma outra, numa outra cor, que é a diáspora. Não podemos esquecer de forma alguma que a diáspora faz parte. Aliás, a diáspora contribuiu imenso para o desenvolvimento de Cabo Verde.

Já recebemos propostas concretas das embaixadas em Portugal, Angola e Estados Unidos. O ministro Augusto Veiga esteve nos Estados Unidos e reuniu‑se com os artistas cabo‑verdianos e a maior parte deles mostrou‑se disponível. Também vamos fazer programas na rádio e na televisão que vão tentar reforçar esse laço com a diáspora.

Queremos que esse chapéu, a que se referiu, apanhe não só as 10 ilhas, mas também quase o mundo inteiro, porque, em qualquer parte do mundo, encontramos cabo‑verdianos.

Muitas das datas históricas do país, incluindo o 5 de Julho, têm sido celebradas de forma solene e institucional, mas sem um verdadeiro envolvimento popular. Há uma preocupação para que, desta feita, seja diferente?

É isso que queremos, basta ver o programa. Quem viveu o 5 de Julho, lembra‑se de como foi, gente na rua a festejar. É isso que queremos ver. Daí que organizamos actividades muito viradas para a nossa cultura.

Um número considerável de cabo‑verdianos que celebrarão este meio século de independência nasceu e cresceu num país independente. Para essas pessoas, em particular para quem é jovem e adolescente, como é que se transmitem os valores que estão na base destas comemorações?

A história oficial é sempre a história oficial, mas a história da independência não é só essa história oficial. Há pessoas comuns que têm histórias interessantíssimas sobre a independência, que participaram activamente e que hoje não estão cá.

Creio ser necessário criarmos, na rádio, na televisão, nos meios de comunicação mais modernos, momentos em que haja esse confronto. Não um confronto no sentido de cada um defender a sua causa, mas no sentido de os jovens escutarem. Os jovens precisam, de facto, de conhecer o que se passou, não a nível oficial, mas a nível das pequenas histórias.

Independentemente das diferenças de pensamento e ideológicas…

Isso é fundamental. Na época da independência, lembro‑me muito bem, o tempo passava tão depressa, os dias passavam tão depressa, porque, no momento revolucionário, o indivíduo quase não dormia e o que eu sentia é que a maior parte das pessoas não tinham nenhum tipo de pensamento ideológico. O que queriam era a independência.

O programa é financiado por verbas do Orçamento de Estado, foram anunciados 50 mil contos. Há dias, ouvi‑o dizer que há uma vontade em que a própria sociedade civil, as empresas, se mobilizem e possam patrocinar e apoiar algumas das actividades.

Estamos a trabalhar nesse sentido, a contactar as empresas, a explicar o que queremos. Achamos que qualquer empresa cabo‑verdiana deverá sentir‑se orgulhosa em participar numa comemoração desse tipo.

Estamos a falar também com grupos musicais, com pequenas empresas, que podem colaborar com trabalho. Tem de haver participação, para que seja uma festa rija, uma festa que nos deixe a todos felizes.

Um djunta mon

Disse a palavra certa. Pensamos que estas celebrações devem ser um verdadeiro djunta mon de todos os cabo-verdianos. Aqui e na diáspora.

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Agenda para os próximos dias

O luto nacional, decretado pela morte do Papa Francisco, obrigou a pequenos ajustes no programa, mas o início das celebrações do Cinquentenário da Independência acontecerá esta semana, em São Vicente.

Já hoje (quarta‑feira, 23), o espaço Bombu Minino acolherá, às 20h00, uma roda de conversa subordinada ao tema “novo olhar para a cultura em Cabo Verde”.

Quinta‑feira (24), às 18h00, será aberta a exposição alusiva ao 25 de Abril de 1974, patente no Centro Cultural do Mindelo (CCM). Logo a seguir, às 19h00, também no CCM, haverá um espectáculo de música tradicional com Edson Oliveira. No mesmo dia, a partir das 21h00, a Praça Nova receberá um concerto com Fábio Ramos.

Sexta‑feira, 25 de Abril, às 17h00, no CNAD, terá lugar a sessão protocolar de abertura das comemorações, com a presença do Primeiro‑Ministro, do embaixador de Portugal e do presidente da Câmara Municipal. Haverá música com Jorge Humberto.

Às 19h00, Ulisses Correia e Silva visitará a exposição patente no CCM. Durante a visita serão apresentadas “poesias da liberdade”, pela Associação Mindelact.

Com início previsto às 20h00, a Rua de Lisboa receberá um concerto comemorativo com Rodji, Kings e Riza Sanches. O fogo‑de‑artifício, à meia‑noite, antecederá a actuação de Gil Semedo.

O programa prosseguirá no dia 26, sábado: às 16h00, na Praça D. Luís, com a Associação Kolá Sanjon; às 18h00, no Parque Nhô Roque, com Avelino Chantre e uma demonstração de dança tradicional e contemporânea; às 20h00, com um desfile de moda de época (aos nossos dias) na rua pedonal. A partir das 21h30, regresso à Rua de Lisboa, para uma festa com sons e cores carnavalescos.

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1221 de 23 de Abril de 2025.

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Autoria:Nuno Andrade Ferreira,25 abr 2025 14:15

Editado porAndre Amaral  em  26 abr 2025 7:22

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