Carlos Monteiro, Presidente do Conselho de Administração do TechParkCV: “O TechPark é um centro de trabalho para Cabo Verde e principalmente para o mundo”

PorJorge Montezinho,10 mai 2025 7:35

Apesar de estar a funcionar desde 2023, o Parque Tecnológico da Praia – e o de São Vicente – foi inaugurado oficialmente esta semana. Empresa pública, nascida como SA, poderá no futuro abrir à participação privada.

O digital, quer o governo, será a próxima âncora económica do país, equiparada, no futuro, ao peso do turismo (25% do PIB). Até lá, regressamos ao presente, aos impactos, ao plano de negócios e aos desafios, nesta entrevista com o PCA do TechParkCV.

A frase é sua: “não vamos inaugurar paredes, vamos inaugurar um ecossistema a funcionar”. É importante abrir o TechPark como um processo já dinâmico?

Claramente. Tudo que começa a andar tem melhores condições de continuar. O TechPark, sendo um projecto grande, teve os diversos componentes prontos em momentos diferentes. Em 2023 começamos a ter as primeiras operações do TechPark e hoje, devido a essa decisão, estamos a inaugurar um parque já com 23 empresas a funcionar, com eventos, etc. Já estamos, digamos assim, na pista a levantar o voo. Além destas 23 empresas, temos feito vários programas de formação, parcerias ao mais alto nível, por exemplo, em Janeiro tivemos cá o MIT, que é nada mais nada menos que o melhor instituto de tecnologia do mundo, e temos tido eventos privados, públicos, com instituições de renomes, embaixadas, etc. Igualmente importante, o TechPark já está a dar trabalho, a empregar pessoas. Neste momento temos cerca de 400 pessoas a trabalhar directamente no TechPark, por dia, sem contar com os empregos indirectos: seguranças, limpeza, catering, etc. Portanto, o TechPark já está a gerar economia.

Quais são os principais objetivos e expectativas para o TechPark?

O objectivo mais imediato é consolidar e pôr a funcionar todos os componentes e a estratégia do plano do negócio que foi pensado para o TechPark. A médio prazo queremos que todos os componentes comecem a dar rendimento, a auto-sustentarem-se, para que o TechPark seja um projeto economicamente viável.

Já vamos ao plano de negócios, mas antes gostava de lhe perguntar também como vão incentivar a inovação, a pesquisa e o desenvolvimento das novas tecnologias?

De várias formas. Para já começa-se logo com o TechPark em si, além das infra-estruturas, o governo determinou que esta área seria uma zona económica especial para as tecnologias, o que desde logo atrai investimentos, não só nacional como internacional. Atrai investimentos devido aos incentivos que já estão previstos na lei da zona económica. Com o investimento atrai empresas que vêm fazer inovação, o que permite que os nossos recursos humanos tenham espaço para fazer inovação nas empresas que vêm sedear-se no TechPark. Além disto, apostamos na formação, no treinamento, que é uma das componentes do TechPark. Outro componente importante do TechPark é o nosso centro de incubação, onde temos os programas de startups, onde vai haver incentivos para que jovens talentos, pessoas recém-licenciadas e outros tenham condições inovar, consolidar, crescer e criar empresas.

A capacitação de talentos locais será uma área fundamental para o TechPark, mas também para o país.

Com certeza. A decisão do governo de diversificar a economia do país para o digital já foi anunciada várias vezes e o TechPark tem um papel de charneira nesta estratégia, de todo o país. Se pretendemos ter uma economia digital, um novo sector na economia, uma nova âncora, a formação é essencial. A formação permanente, porque o digital tem tudo a ver com o know-how, com o talento, com o saber humano, não é uma área que depende de minérios, depende principalmente do saber, do treinamento que os nossos recursos humanos têm. E não só a formação, mas também apostamos na certificação. O que é certificação? O TechPark não é um investimento apenas para o mercado local – pequeno, de meio milhão de pessoas de habitantes – a ideia é exportar serviços, como aliás já está a acontecer. Vemos o TechPark como um centro para trabalhar para Cabo Verde, mas principalmente para trabalhar para o mercado do mundo.

O TechPark, neste momento, tem 23 empresas a funcionar, até 2030 esperam ter pelo menos 30 empresas, quais são as previsões de novos projectos a serem lançados?

Neste momento estamos com 7 nacionalidades a trabalhar. As empresas estrangeiras que estão no TechPark exportam serviços, ou seja, trabalham aqui, mas com foco no mercado de origem, contratam jovens cabo-verdianos, jovens talentos, jovens formados, prestam serviço para Cabo Verde, mas também para os mercados de origem. projectos há muitos. Estamos a montar vários de incubação, é um ponto que ainda não arrancou em força, está numa fase muito embrionária, e temos projetos de formação e de treinamento. Por exemplo, queremos transformar o nosso centro de treinamento num centro de referência regional em matéria de cibersegurança. Hoje, para termos formações de topo em cibersegurança, não encontramos bons treinamentos em África, é preciso ir a Europa, Estados Unidos, etc., e nós queremos transformar o TechPark num centro de excelência de cibersegurança. É um dos projetos que temos em carteira. Temos também projectos energéticos, para baixarmos os custos de contexto, mas neste momento estamos a concluir o projeto fundamental, que é a construção do parque. Depois não faltarão projectos, tanto para o crescimento como para a sustentabilidade do TechPark.

Vamos então ao plano de negócios. Quais serão os principais segmentos de clientes/utilizadores? Startups, empresas de tecnologia, investidores, universidades?

Queremos todos esses que, aliás, têm papéis diferentes. As universidades são nossos parceiros, porque o Parque Tecnológico é a ponte entre a universidade e o mercado. O Parque Tecnológico serve para saber as necessidades do mercado, para estar em ligação com as universidades e para desenvolver as soluções para o mercado através do TechPark. A figura do TechPark não é originária de Cabo Verde. Existem pelo mundo, Europa, Estados Unidos, Ásia, e tem sempre um polo universitário por trás. No nosso caso, já temos um protocolo assinado com a Universidade de Cabo Verde e vamos ver com outras universidades. Depois, queremos atrair empresas consolidadas, porque um dos negócios do TechPark é receber empresas, as empresas pagam para estar no TechPark, é uma das nossas fontes de rendimento, não só com o que pagam para estar cá, mas também com a contribuição para o ecossistema que criamos. E queremos, naturalmente, atingir as startups.

Quais são as estratégias de marketing e divulgação para atrair clientes para o TechPark?

Já iniciamos a montagem do nosso gabinete de comunicação para essa estratégia toda. Já temos uma especialista em comunicação internacional e também estaremos a concluir o design do branding, etc., para a promoção de TechPark. Embora o parque já tivesse arrancado, tivemos de dosear a comunicação para não ultrapassar o timing da inauguração. Com a inauguração do TechPark vamos entrar em força com o marketing, principalmente lá fora, onde o TechPark ainda é menos conhecido, para atrair investimentos externos.

Como avalia o mercado de tecnologia e inovação em Cabo Verde e que oportunidades de crescimento é que existem?

Penso que há espaço para crescimento em Cabo Verde. Não está tudo por fazer, até estamos à frente de alguns vizinhos, mas na transformação digital ainda há passos largos para serem dados. Como diz um governante nosso, não são as pessoas que têm de se mover, mas sim os dados. Por exemplo, na questão da economia moneyless, ou seja, os pagamentos digitais, o pagamento online, ainda há em Cabo Verde espaço para crescimento que pode ser aproveitado pelas startups. Sempre analisamos o TechPark olhando para o mercado local, mas precisamos de olhar também para o mercado internacional e regional. Neste momento, temos já empresas no TechPark, posso dar dois exemplos, uma que trabalha em cibersegurança, que faz a cibersegurança para Cabo Verde e para Portugal. Temos outra empresa que trabalha na área da cartografia e serve uma grande operadora de energia em Portugal. Ou seja, as pessoas podem trabalhar de Cabo Verde, mas servindo no mercado lá fora.

Quais são as fontes de receita previstos? Aluguer de espaço, programas de aceleração, eventos, consultoria?

Tudo isso, ainda acrescido do negócio dos data centers. O negócio dos data centers é parte considerável do plano de negócio do TechPark. Com o projeto TechPark, passamos de um data center para três data centers, porque foi construído mais um data center na cidade da Praia, que nós chamamos de Data Center 2, e um terceiro data center em São Vicente, que é o Data Center 3. Este data center em São Vicente é muito importante para a questão da redundância, para ser o espelho, os dados têm que ser seguros e há recomendações para os backups, porque, por exemplo, pode haver um problema provocado por desastres naturais, ataques cibernéticos, etc., por isso é recomendado que a distância entre data centres e data centres de backup seja de, pelo menos 75 quilómetros. No nosso caso, em Cabo Verde, ainda estamos melhor porque estamos a 200 e tal quilómetros de São Vicente. Resumindo, os rendimentos do TechPark vêm de programas de treinamento, receitas de certificação, receitas provenientes de renda das empresas, receitas provenientes de eventos, consultoria, etc. Portanto, são vários meios de rendimento.

Que indicadores de desempenho serão utilizados para avaliar o sucesso do TechPark?

Os indicadores serão taxa de ocupação, porque o negócio do Tech Park também é um negócio imobiliário, não é? Portanto, ocupação de espaço, eventos produzidos no TechPark, taxa de formação, treinamento, níveis de incubação. No fundo, os indicadores terão a ver com os negócios do TechPark.

Quais são os desafios que poderão afetar o sucesso do projeto, o que é que antecipam, por assim dizer?

O maior desafio é o abatimento do custo de energia, que é um factor de contexto com muito peso no TechPark, porque, como disse há pouco, o negócio dos data centers é uma fonte de rendimento importante para o TechPark, mas para os data centers conseguirem competir com os data centers globais temos que ter uma energia também com custo competitivo e, como sabe, o custo de energia em Cabo Verde é o nosso calcanhar de Aquiles. Como mitigar? Atacar com energias renováveis, já temos projetos, os edifícios serão autónomos em termos de energias renováveis, mas o data center ainda nos traz um desafio, porque a energia consumida pelos data centers é mais elevada. Portanto, o desafio principal é a questão energética e depois há também o desafio de dar a conhecer globalmente o TechPark e conseguir atrair as empresas que pretendemos atrair.

Agora que os parques abriram oficialmente, há alguma mensagem que gostasse de deixar?

Devemos valorizar este investimento, esta ousadia, é assim que os países se desenvolvem. Todos os países, para se desenvolverem, têm que ter infra-estrutura, não há nenhum país desenvolvido que não tenha infra-estruturas de relevo e de peso. O TechPark é para servir toda a sociedade, não é só para servir quem está nas tecnologias, o TechPark deve ser aproveitado e deve ser percebido que é uma oportunidade enorme para Cabo Verde, deve ser o orgulho de todos os cabo-verdianos. E fazemos votos que tenha o impacto na economia que está projectado.

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1223 de 07 de Maio de 2025.

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Autoria:Jorge Montezinho,10 mai 2025 7:35

Editado porFretson Rocha  em  11 mai 2025 23:29

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