Segundo Liza Vaz, Directora Nacional das Receitas do Estado, ainda não foi definido um “quadro excepcional” para esta matéria, mas está a ser analisado o que o regime jurídico do Estado de Calamidade permite fazer.
A responsável indicou que as medidas em estudo abrangem não só a questão dos stocks, mas também pagamentos correntes e negociados, bem como a suspensão de penhoras e inspecções.
“As questões estão a chegar, estão a ser ponderadas e estaremos a dar indicações em breve”, disse, acrescentando que não é possível apontar uma data para a decisão devido aos constrangimentos operacionais provocados pela situação de calamidade.
Seguradoras
Já do lado do sector segurador, o Director Comercial Norte da Garantia, Paulo Monteiro, afirmou que os clientes devem comunicar os danos “o quanto antes” para que a seguradora possa agendar as peritagens e levantar os prejuízos com a maior brevidade possível. “No âmbito das coberturas da apólice contratada, faremos a regulação do sinistro”, garantiu, lembrando que a existência ou não de cobertura para acidentes naturais depende das condições de cada contrato.
Paulo Monteiro sublinhou que, no actual contexto, os sinistros registados em São Vicente relacionados com as chuvas terão prioridade no tratamento. Questionado sobre a possibilidade de a seguradora assumir indemnizações mesmo sem cobertura contratual, remeteu uma resposta concreta para a administração da empresa, mas assegurou que “todas as possibilidades estarão em cima da mesa” e que a empresa está “sensível à situação” que São Vicente atravessa.
O responsável revelou que, até ao momento, não há dados concretos sobre o número de participações recebidas nem sobre o valor total dos prejuízos, uma vez que muitos clientes ainda estão a fazer o levantamento dos danos.
“Algumas participações são apenas avisos, informando que houve entrada de água ou inundação, mas sem todos os detalhes”, referiu.
Tanto a Direcção Nacional das Receitas do Estado como a Garantia pedem que os comerciantes e particulares mantenham contacto com as respectivas entidades para facilitar a avaliação e a tomada de medidas. Enquanto o Governo analisa soluções legais e administrativas, a seguradora reforça que cada caso será avaliado “em função do seguro e das coberturas contratadas”.
Já o presidente do Conselho de Administração da seguradora Ímpar, Luís Vasconcelos, afirmou que a empresa já recebeu “na ordem das centenas” de reclamações de clientes afectados pelas recentes cheias em São Vicente, algumas envolvendo “grandes perdas”. Em entrevista, o gestor sublinhou que a seguradora actuou de imediato, mesmo tendo as suas próprias instalações afectadas, criando um “gabinete de acção” para acelerar o pagamento de indemnizações.
“Passadas umas horas já estávamos em condições de dar assistência à nossa clientela”, afirmou, explicando que as equipas técnicas têm estado no terreno, desde segunda-feira, a verificar danos, orientar clientes e recolher documentação. “A materialidade da eficácia do seguro só se dá com o desembolso das indemnizações”, frisou.
Segundo Luís Vasconcelos, a prioridade é garantir que as perdas cobertas sejam ressarcidas “no mais curto espaço de tempo possível”. Reconheceu, contudo, que “infelizmente não há muitos lesados com seguros”, destacando a importância de ver o seguro “não como um custo ou imposto, mas como um investimento na protecção”.
O responsável recordou que fenómenos como tempestades, inundações e sismos — cobertos na cláusula TIFS — nem sempre são incluídos por opção do cliente, situação que agora deixa alguns em “posição desprotegida e difícil”. “Tecnicamente não conseguimos fazer o enquadramento [das perdas] quando a cobertura não foi contratada”, disse, lembrando que as seguradoras também recorrem ao resseguro internacional e têm regras contratuais a cumprir.
Além da resposta no âmbito da actividade seguradora, a Ímpar disponibilizou 10 mil contos para apoio à reposição de bens e infraestruturas, em articulação com instituições como Cruz Vermelha, Cáritas, Casa da Sopa e Biosfera. Foi ainda aberta uma conta no BCN para angariação de donativos, que serão canalizados para entidades no terreno.
Aos clientes, a seguradora recomenda recuperar o que for possível sem colocar a segurança em risco, inventariar e documentar os danos com fotografias, e fornecer todos os elementos necessários para agilizar os processos. “Este é o momento em que se materializa a função da actividade seguradora, como corpo protector da sociedade”, concluiu Luís Vasconcelos.
Em meio aos estragos causados pelas recentes chuvas em São Vicente, que resultaram em ruas alagadas, infraestruturas danificadas e mercadorias destruídas, os empresários da ilha enfrentam o desafio de manter os seus negócios de pé e mitigar o impacto financeiro.
Cumprir requisitos
Éder Lisboa, contabilista certificado da BTOC, explicou na rubrica 'Economia Descomplicada' na Rádio Morabeza, que é possível os comerciantes e empresários afectados pela tempestade enquadrarem as perdas causadas por eventos climáticos extremos como "custos ou perdas extraordinárias", desde que os danos sejam irreversíveis. No entanto, para que estas perdas sejam aceites fiscalmente, os empresários precisam cumprir certos requisitos.
O primeiro passo é garantir uma prova documental robusta, que inclua fotografias dos danos, inventários detalhados das mercadorias afectadas, relatórios de ocorrência de entidades competentes, pareceres técnicos e, se aplicável, a comunicação formal à seguradora. É essencial que a ocorrência seja caracterizada como um evento involuntário, causado por força maior e sem responsabilidade da gestão do negócio. Além disso, os bens danificados devem estar devidamente registados em inventário antes do evento, sendo um inventário actualizado uma peça-chave para a aceitação do prejuízo pelas autoridades fiscais.
A aceitação fiscal da perda pode ser total, desde que se comprove que a perda é indispensável para a obtenção ou manutenção dos rendimentos e que haja validação da administração fiscal. Para aumentar as hipóteses de aceitação, recomenda-se que o empresário mantenha o inventário actualizado, elabore um relatório de contagem e avaliação do valor perdido, e comunique formalmente a situação às autoridades competentes, como a Protecção Civil, a Polícia e a seguradora.
Éder Lisboa concluiu que, num momento de crise, a rapidez na reacção e a organização das informações fazem toda a diferença. A experiência mostra que investir em prevenção — através de inventários actualizados, seguros adequados e estratégias de gestão de risco — é crucial para garantir a resiliência empresarial face a eventos inesperados.