A Amnistia Internacional (AI) não esconde “bastante preocupação” com a proposta de extinção da Comissão Nacional para os Direitos Humanos e Cidadania (CNDHC). Ao Expresso das Ilhas, o director executivo da AI Portugal, Pedro Neto, afirma discordar da ideia da sobreposição de missões entre Comissão e Provedor de Justiça, estrutura que o governo quer que passe a monitorizar a situação de direitos humanos no arquipélago.
“Não verificamos essa sobreposição. A missão da provedoria é uma, o acompanhamento da justiça numa lógica muito mais processual, mais jurídica, que os cidadãos tenham acesso à justiça. É para isso que servem as provedorias de justiça por todo o mundo, acompanhar mais os órgãos da administração da justiça, que pertencem ao Estado. A CNDHC é para uma presença mais efectiva, porque há muitos direitos humanos que podem até nem ser questão jurídica ou questão de tribunal, por assim dizer”, explica.
O responsável da AI admite risco de “retrocesso” com o fim de uma instituição “tão presente no terreno.
“Em Portugal, não temos este órgão tão perto dos cidadãos. Em Cabo Verde têm-no. Não é à toa que, por vezes, o índice de qualidade da democracia em Cabo Verde é superior ao de Portugal e não é à toa que faço esta comparação. A CNDHC traz mais-valias significativas aos direitos humanos em Cabo Verde”, destaca.
Pedro Neto relembra a persistência de desafios de direitos humanos em Cabo Verde, nomeadamente no plano da habitação e pobreza, mas também relacionados com alterações climáticas e liberdade de expressão, que “tem contornos muito especiais”, pelas características do país.
“Preocupa-me muito este caminho que parece poder dar aso a um retrocesso. Uma coisa que trabalhava bem e que estamos aqui a mudar para outra natureza orgânica do trabalho”, assinala.
Se a reorganização institucional avançar, então a AI espera que “não haja diminuição do espaço da defesa dos direitos humanos”. Para isso, será fundamental uma provedoria “bem financiada”, “bem estruturada” e independente.
“Juntar dois órgãos com missões diferentes pode não trazer poupanças. Pode é trazer mais confusão, mais escassez de recursos e pode desproteger os direitos humanos”, sinaliza o director executivo da organização em Portugal.
Aquilo de que necessitamos em todo mundo é de fortalecer os direitos humanos, num tempo em que estão a ser postos em causa por tantos governos”, alerta.
*com Fretson Rocha
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1077 de 20 de Julho de 2022.