O Orçamento do Estado para 2022 tem previsto valores que rondam os 72 milhões de contos, mas “será um instrumento limitado por uma enorme rigidez ao nível da estrutura das despesas”, escreveu o ministro das finanças, Olavo Correia, no Facebook.
Segundo o governante, apesar das perspectivas positivas, o cenário para 2022 será ainda árduo e de contenção. “Em 2022, teremos um aumento do Serviço da Dívida em mais de 9 milhões de contos, o que é crítico para o Orçamento do Estado Cabo-verdiano”, sublinha o ministro.
Na sexta-feira, no final do encontro com o Conselho de Concertação Social, Olavo Correia referiu que “não temos condições, neste momento, face às condições orçamentais e financeiras, para procedermos, no próximo orçamento, ao aumento salarial na função pública porque o cenário é muito difícil. O Estado tem verificado perda de receitas acumuladas na ordem dos 60 milhões de contos em três anos. Perante este cenário temos em primeiro lugar de garantir os compromissos obrigatórios”.
O vice-primeiro-ministro explicou também que há ainda, no quadro do Orçamento para 2022, um gap de nove milhões de contos, que não pode ser aumentado ou o país pode entrar num quadro de insustentabilidade ao nível da tesouraria do próprio Estado.
O ano económico actual
Os dados provisórios da execução orçamental, do 2º trimestre de 2021, apontam para um saldo global negativo de 8.084,0 milhões de CVE, o que representa um défice de 4,6% do PIB (um agravamento homólogo de 1,3%). É o resultado da quebra nas receitas totais (-9,3%, comparativamente a Junho de 2020), com destaque para as receitas fiscais (-5,9%) e donativos (-50,4%).
As despesas, no mesmo período, registaram um agravamento de 4,4%, por causa das actividades de combate e resposta à Covid-19, para atenuar os efeitos causados pela pandemia relativamente ao emprego e ao rendimento das famílias, bem como o reforço do sistema sanitário.
A diminuição das receitas totais e a limitação estrutural de ajustamento do lado das despesas, traduziram-se num aumento das necessidades de financiamentos com impacto directo na dívida pública, cujo stock, em Junho de 2021, fixou-se nos 268.339,2 milhões de CVE (152,8% do PIB projectado para o ano), um aumento de 2,7% em relação ao mesmo período de 2020.
“A dívida pública, principalmente a externa, é hoje uma questão ainda mais crítica, contrariando o recente percurso de diminuição da dívida em percentagem do PIB”, escreveu esta terça Olavo Correia, dia em que se iniciou uma missão de acompanhamento do FMI, que vai durar até sexta.
2020 – o Annus horribilis da economia cabo-verdiana
A crise económica provocada pela pandemia, com quebra nas receitas fiscais e a necessidade de aumento de apoios sociais e às empresas, fez com que o Governo tivesse de recorrer, a partir de Abril de 2020, ao endividamento público para financiar o funcionamento do Estado, através de empréstimos internacionais e da emissão de títulos do Tesouro no mercado interno.
No final do ano passado, 50,5% do total da dívida pública cabo-verdiana era multilateral, 22,5% era bilateral e 27,0% era comercial. Já o serviço da dívida externa, no total, foi de 5. 759 milhões de CVE. 4.120 milhões de CVE para os credores multilaterais, 933 milhões de CVE para os bilaterais e 705 milhões de CVE para os comerciais.
Os apoios orçamentais disponibilizados pelo Fundo Monetário Internacional, Banco Mundial e Banco Africano de Desenvolvimento aumentaram os desembolsos líquidos da dívida pública em 46 por cento (representaram 49 por cento do total dos desembolsos de dívida efectuados, em 2020, pelos credores externos do Estado).
As receitas públicas caíram cerca de 24 por cento, fixando-se em 43.751 milhões de escudos em finais de 2020, com a queda generalizada de todas as suas componentes. As receitas fiscais, com maior peso no total das receitas, caíram (23 por cento) para níveis de 2016, devido à redução dos valores arrecadados dos impostos sobre o valor acrescentado, sobre o rendimento de pessoas colectivas e sobre os direitos das importações.
As despesas correntes de investimento aumentaram 30,9 por cento (8,9 por cento em 2019), devido ao aumento dos gastos com a aquisição de bens e serviços (arrendamento de espaços para isolamento de infectados, aluguer de viaturas para proteção civil, aquisição de material de consumo clínico e medicamentos, entre outros) e benefícios sociais (decorrentes da implementação dos regimes de rendimento solidário e de inclusão social, particularmente) em 67 e 118 por cento, respetivamente.
Cabo Verde teve, em consequência da crise sanitária global, o pior desempenho económico dos últimos 40 anos. De acordo com as estimativas do INE, em 2020, o produto interno bruto caiu 14,8%.
Classificação da Dívida externa por tipo de credor
- Multilateral – quando o credor é uma instituição de crédito internacional ou regional (Banco Mundial, Banco Africano de Desenvolvimento);
- Bilateral – quando as transações de crédito ocorrem entre dois países ou instituições de créditos públicos (empréstimos entre Portugal e Cabo Verde ou entre o Instituto de Crédito Oficial de Espanha e Cabo Verde);
- Comerciais – quando o credor é um banco comercial ou uma empresa privada.
Serviço da Dívida – Pagamento de juros, comissões e capital para amortização da dívida.
Stock da dívida – Valor da dívida ainda não restituído/reembolsado.