Na rota das privatizações

PorJorge Montezinho,11 ago 2019 7:25

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Nos próximos sete meses o governo vai alienar a sua participação nas empresas farmacêuticas, na Electra, na Cabo Verde Airlines, na CV Handling e vai estabelecer acordos de concessão para as empresas que operam no sector portuário e de aeroportos. A informação está no último relatório do Fundo Monetário Internacional sobre o Instrumento de Coordenação de Políticas (PCI), o programa de apoio técnico do FMI, assinado no passado mês de Julho.

O governo quer acabar com os apoios financeiros às empresas estatais até 2022. As dificuldades financeiras das empresas públicas têm um peso enorme sobre as finanças públicas e o dinheiro disponibilizado para essas empresas deficitárias tem contribuído fortemente para as necessidades de financiamento do Orçamento de Estado e para a acumulação de dívida pública/garantia pública. Os riscos fiscais permaneceram concentrados em três empresas estatais: a companhia aérea (antiga TACV), a habitação e o sector imobiliário (IFH) e a Empresas de Eletricidade e Água (ELECTRA), que representam a maior parte do passivo das empresas estatais.

No final de 2018, seis empresas-chave receberam cerca de 0,8% do PIB para financiar os seus projectos de investimento, e a TACV obteve 2,1% do PIB para capitalização. A privatização da TACV em Março de 2019 e o plano das autoridades de vender os 49% restantes das acções para funcionários e outros investidores privados até o final de 2019 ajudarão a reduzir os riscos fiscais, diz o FMI.

No relatório do FMI, escrito a partir de informações transmitidas pelo governo cabo-verdiano, é sublinhado que as autoridades pretendem acelerar as reformas das empresas estatais para apoiar o crescimento económico do país, assim como a sustentabilidade fiscal e da dívida. Após a reestruturação do programa de habitação social gerido pela IFH, Casa para Todos, no final de 2018, e a privatização da TACV, as autoridades planeiam privatizar cinco empresas estatais adicionais, incluindo a empresa de eletricidade em 2020. Até lá, é considerado essencial aperfeiçoar os relatórios fiscais para as seis maiores empresas estatais, compilando informações financeiras sobre o desempenho do fluxo de caixa (cash flow) para o ano fiscal de 2019 e para monitorizar trimestralmente o desempenho dos orçamentos aprovados, acções que vão começar no final deste ano. Para melhorar a supervisão das empresas estatais e melhorar a gestão das propriedades do governo, as autoridades planeiam criar uma empresa de gestão de activos, também até o final de 2019.

Mapa das privatizações

Segundo a agenda transmitida pelo governo ao FMI, até Dezembro de 2020 deve estar concluído o desenho e a implementação de uma plataforma para monitorização do sector público empresarial. Objectivo, mais dados e informação mais precisa sobre as empresas do sector público, para facilitar o acesso dos gestores de carteiras e dos diversos stakeholders que interagem com o sector.

O cronograma do processo de privatização também já está definido: TACV - conclusão da venda de 49% de acções até o final de 2019, estabelecimento de contrato de concessão para transporte marítimo (concluído), privatização da Electra (Março de 2020), privatização da EMPROFAC (Dezembro de 2019), venda da participação na INPHARMA (Dezembro de 2019), licenciamento de serviços portuários (Maio de 2020), estabelecimento de contrato de concessão de serviços aeroportuários (Dezembro de 2019), privatização do CV Handling (Dezembro de 2019).

Reformas Estruturais

Cabo Verde tem 23 empresas estatais que operam em várias áreas, incluindo transporte (aéreo e marítimo), serviços públicos, habitação e farmacêutica. Como referido, muitas empresas estatais têm enfrentado importantes desafios de desempenho ao longo dos anos e o apoio orçamental às suas operações tem sido um dos principais contribuintes para a rápida acumulação de dívida pública.

Os esforços das autoridades para reestruturar as empresas públicas foram acelerados em 2017 através da implementação de um programa de reformas que abrange as 23 empresas. O programa tem como objectivo eliminar o apoio do orçamento. Os principais passos incluíram: (i) a venda de participações maioritárias na TACV para um parceiro estratégico; operação concluída em Março de 2019 com a venda de 51% das acções da empresa para uma subsidiária da Icelandair, com custos para o orçamento do governo em termos de património (1,3% do PIB) e obrigações de serviço da dívida; (ii) a introdução de maior participação do sector privado no transporte marítimo inter-ilhas; (iii) a reestruturação da ELECTRA para reduzir as elevadas perdas comerciais e preparar a empresa para a privatização; e (iv) a reestruturação do programa habitacional gerido pela IFH para minimizar perdas e aumentar a transparência.

Em 2018, o governo aumentou o apoio financeiro às empresas estatais, com um dispêndio de cerca de 4 biliões de escudos, equivalente a 2,1% do PIB, uma subida substancial em relação a 2017, em parte relacionado ao custo das actividades da TACV. Embora o desempenho das 23 empresas públicas varie, algumas têm registado perdas nos últimos anos, acumulando passivos e exigindo apoio financeiro contínuo do Orçamento de Estado para empréstimos, serviço da dívida e capitalização. No final de 2018, o stock de endividamento das empresas estatais era de 98,7 biliões de escudos, equivalente a 53,2% do PIB, com uma dívida garantida pelo governo num total de 13,2 biliões de escudos (7% do PIB).

No período de quatro anos (2014-17), o apoio cumulativo do Orçamento de Estado às empresas estatais (que cobrem transferências, repasses, capitalização e subsídios) 108,2 biliões de escudos, equivalentes a 62,4% do PIB. Mais da metade desse valor está relacionado ao empréstimo contratado pelo governo, e “reemprestado” à empresa imobiliária (IFH), para financiar o programa social de habitação Casa para Todos.

As reformas nas empresas mais ‘problemáticas’

Nos últimos anos, o governo implementou medidas de reforma no sector das empresas públicas. Para três empresas estatais que enfrentam dificuldades financeiras, as acções seguintes foram implementadas:

A companhia aérea Transportes Aéreos de Cabo Verde (TACV), em Agosto de 2017, todas as rotas domésticas foram transferidas para uma nova companhia aérea, a Binter Cabo Verde, com 30% de participação do Estado. Para as rotas internacionais, foi assinado um contrato de gestão de um ano com a Icelandair (Outubro de 2017) para operar e preparar a TACV para a privatização. A empresa foi privatizada em Março de 2019 com a venda de 51% do capital da TACV para uma subsidiária da Icelandair, e a criação de uma nova empresa: Cabo Verde Airlines (CVA).

Empresa de habitação, Imobiliária, Fundiária e Habitat, S.A (IFH). Em 2011, o governo contratou um empréstimo externo para construir unidades habitacionais sociais para serem vendidas abaixo dos preços de mercado e/ou alugadas. A gestão do programa Casa Para Todos foi realizada pelo IFH. Dado o baixo desempenho do programa, o mesmo foi reestruturado em 2017 em três grupos: unidades de classe A (baixa renda) foram transferidas para as câmaras municipais e para o governo central; as unidades de classe B e C (média e alta renda) seriam vendidas a preço de mercado. O desempenho do programa melhorou em 2018, com as vendas das unidades a ficarem acima das expectativas.

A empresa de energia e água (Electra). O Conselho de Administração da empresa recebeu um mandato para melhorar seus níveis de eficiência e prepará-la para a privatização. Um programa de protecção de receita foi posto em prática para reduzir as altas perdas comerciais. Em 2016, a empresa registou perdas de distribuição e transmissão de 27%. Além disso, foi iniciado um processo de reestruturação para separar as operações de água e energia. Em 2017/18, a situação financeira da Electra melhorou, eliminando o risco para o orçamento do governo.

Na rota das privatizações

O governo quer reduzir o tamanho do sector público empresarial. A agenda de reformas para 2019-20 tem várias medidas que têm como objectivo último a eliminar o apoio financeiro do Orçamento de Estado às empresas estatais deficitárias.

A conclusão da concessão do transporte marítimo para o sector privado, com participação de 51 por cento do capital detido por um investidor estrangeiro e 49 por cento detido por investidores nacionais.

A venda dos 49% restantes da participação do Estado na CVA, principalmente através da Bolsa de Valores.

Privatização das empresas do sector farmacêutico (Inpharma e Emprofac) e energia e água (Electra).

Estabelecimento de contratos de concessão para empresas do sector portuário (Enapor) e aeroportuário (ASA e CV Handling), com tratamento diferenciado da gestão do espaço aéreo (FIR Oceânica), que continuará sob controlo estatal.

Reestruturação do programa habitacional Casa para Todos gerido pelo IFH.

Texto originalmente publicado na edição impressa do expresso das ilhas nº 923 de 7 de Agosto de 2019. 

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Autoria:Jorge Montezinho,11 ago 2019 7:25

Editado porFretson Rocha  em  5 mai 2020 23:21

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