Que balanço faz depois destas visitas que fez pelas universidades e instituições de ensino superior?
O ensino superior é capaz de desempenhar um papel formativo no futuro de Cabo Verde. Obviamente que, apesar dos ganhos, eu tenho de abordar alguns dos desafios decorrentes dos constrangimentos que essas instituições vêm enfrentando e de expectativas que a própria sociedade tem relativamente ao sector. Porque o que eu desejo é que o país desenvolva um sistema de ensino superior internacionalmente reconhecido e que apoie a visão de desenvolvimento que temos e o projecto de sociedade que preconizamos. Por isso, eu queria assumir de forma frontal que podemos ter muitas propostas no país, algumas podem ser muito boas, mas a condição fundamental, essencial para se avançar com sucesso é, primeiramente, vontade política. As propostas e recomendações que existem e existirão podem ter uma grande base técnica mas terão pouco impacto se não existir vontade política para as implementar. E aqui é preciso ter muita atenção, porque as decisões no ensino superior podem afectar as esperanças de milhares de famílias e jovens. Portanto, é fundamental desenvolver uma estratégia de longo prazo para podermos orientar os investimentos e estribarmos as decisões. É preciso reorganizar e racionalizar um programa de bolsas de estudo para uma expansão mais justa e estrategicamente orientada. Também é preciso investir nas infraestruturas das tecnologias de informação e comunicação para podermos chegar a uma Universidade Aberta de Cabo Verde e podermos fazer com que o ensino superior chegue a qualquer jovem, a qualquer cabo-verdiano onde quer que ele esteja. Por último, é fundamental que se dê uma atenção especial à relevância do ensino superior. Estivemos dois anos parados com a governação do MpD. Não houve nenhuma ruptura com a visão anterior e não se apresentou ao país uma nova visão. Porque havendo visão podemos concordar ou discordar, não havendo visão não podemos sequer caminhar ou pretender avançar.
E acha que a entrada deste novo Secretário de Estado da Educação pode trazer essa ruptura?
Por mais propostas tecnicamente boas, estratégicas e sólidas que existam é preciso vontade política. Estamos a falar de um secretário de Estado que entrou há pouco tempo. Mas a questão que se coloca é: terá ele capacidade, peso político para fazer avançar as medidas, implementar as decisões que são necessárias?
Justifica-se a existência de tantas instituições de ensino superior em Cabo Verde?
O objectivo do Estado deve ser levar o ensino superior a todos aqueles que queiram fazer a sua graduação. O Estado tem a missão de satisfazer as expectativas da população promovendo a melhoria da condição de vida e a educação é um sector fundamental para se garantir o desenvolvimento. Portanto, eu não coloco a questão dessa maneira, coloco-a em como fazer com que o ensino superior chegue a todo o lado, porque não obstante termos dez instituições de ensino superior ainda não temos um ensino superior acessível para todos. E aqui nós temos de ter em conta a nossa insularidade. Eu não tenho o direito, e ninguém tem, de dizer a um jovem da Brava ou dizer a um jovem de São Nicolau que eles não se podem licenciar porque nasceram na Brava ou em São Nicolau. A obrigação do Estado é fazer a sua parte, definir a visão, tomar as decisões para que a vida da sua população melhore.
Entramos numa outra área desta entrevista que é a questão do emprego e desemprego. Tendo em conta o número crescente de pessoas que procuram o ensino superior, pensa que há mercado para absorver tanta gente?
Entramos na questão que eu apontei relativamente à relevância do ensino superior como um dos pilares na definição da visão que nós teremos de ter: definir para podermos ser coerentes com as decisões que tomamos de forma estratégica, preconizando sempre o desenvolvimento do país. É essencial reorientar as ofertas de ensino superior para mediar a tensão entre três factores: as expectativas individuais dos estudantes universitários, as oportunidades do mercado de emprego e os objectivos nacionais de desenvolvimento. Se nós não conseguirmos reorientar as ofertas de ensino superior para mediarmos a tensão entre estes factores corremos riscos de não termos a juventude satisfeita nem garantirmos a empregabilidade nos termos em que pretendemos e muito menos atingirmos os objectivos nacionais de desenvolvimento.
O que lhe dizem os números do emprego e do desemprego que foram divulgados pelo INE?
A descida da taxa de desemprego deve sempre ser motivo de satisfação para todos aqueles que querem o melhor para o seu país. Mas os números não devem ser analisados de forma simplista e ligeira. Houve, primeiramente, uma descida da taxa em linha com o contexto internacional. Veja-se, por exemplo, o caso de Portugal em que a taxa já baixou para os 7% e eu refiro Portugal como podia referir a Espanha que são os nossos parceiros mais próximos tendo em conta as trocas comerciais. Mas é preciso perguntar o seguinte: por que razão há degradação de indicadores chave do mercado de trabalho? Houve uma diminuição da população activa em cerca de 14.500 pessoas, houve uma diminuição da taxa de actividade que passou de 63,7% para 59,2%, houve uma diminuição da taxa de ocupação que passou de 54,2% para 51,9% e a população inactiva aumentou drasticamente com mais 20 mil pessoas na inactividade. E houve também destruição líquida de emprego em Cabo Verde. Se temos menos desemprego é preciso perguntar onde foram parar os 8500 cabo-verdianos que deixaram de estar desempregados. Porque ao mesmo tempo constata-se que temos menos seis mil pessoas empregadas. E há um aspecto que é relevante: houve uma redução da taxa para 12%, mas temos menos 8531 pessoas no desemprego. Temos menos 6 mil pessoas empregadas em 2017. E há um aspecto que é relevante, há um indicador revelado pelo INE que tem a ver com o sector empresarial privado e esse indicador mostra de forma clara que houve destruição de empregos no sector privado e houve também destruição de empregos por conta própria. Onde é que estão esses empregos?
Será que a emigração explica...
Os fluxos migratórios também têm sido referenciados. E nessa análise não podemos deixar de fazer um paralelismo com o crescimento económico. Se a economia cresce, como tem sido dito, com alguma basofaria pelo governo, é porque os factores que determinam o crescimento tiveram um desempenho favorável. Mas, também é impossível fazer essa análise sem analisar o enquadramento externo. Isso quer dizer que uma melhor ou pior performance da economia externa tem impacto directo sobre o desempenho da nossa economia. Vamos ver do ponto de vista externo e em termos macroeconómicos o que é que se pode destacar. Primeiro a recuperação da economia mundial que vem acontecendo desde 2014/15, e que se reforçou em 2017, melhorando por isso as expectativas para 2018. E, em segundo lugar, a redução do desemprego sendo que algumas economias já se encontram perto do pleno emprego. O INE, no seu relatório referente ao último trimestre do ano passado, diz que a economia nacional cresceu neste período 4,7%. Desde logo uma primeira nota: este crescimento está longe da meta do governo, do compromisso de garantir um crescimento de 7% em média por ano. As previsões do FMI têm apontado para uma continuação da recuperação da economia mundial. Portanto, o maior crescimento económico no quarto trimestre de 2017 em Cabo Verde coincidiu com um maior crescimento dos nossos parceiros. A Zona Euro cresceu 2,7%, os EUA cresceram 2,5%, mas houve também dois acontecimentos de grande envergadura em Cabo Verde que terão tido reflexos no desempenho da nossa economia: o 4º Fórum Mundial de Desenvolvimento Local e o 17º Seminário do Afreximbank sobre financiamento do comércio estruturado. Para além disso, acrescento uma dimensão fundamental em qualquer análise de crescimento económico: se é consensual que uma economia só se desenvolve com um bom ritmo de crescimento, também é verdade que o crescimento económico não é o melhor indicador para traduzir a melhoria do nível de vida dos cidadãos de um país. O que deve ser perguntado é se este indicador que está a traduzir os ganhos de crescimento está, ao mesmo tempo, a garantir que em Cabo Verde está a ocorrer uma melhor distribuição de rendimento.
Havia espaço, neste Orçamento do Estado, para um aumento salarial na função pública?
Antes de responder a isso, devo dizer que quem está na política deve ter seriedade e ser coerente e ter responsabilidade. O Primeiro-ministro quando previu na sua plataforma eleitoral, e confirmou no seu programa de governo, que iria promover a actualização salarial anualmente, deveria ter em conta os dados orçamentais macroeconómicos do país. Pelos vistos não tinha todas as contas feitas, porque já foram aprovados três Orçamentos do Estado no Parlamento e não ocorreu nenhuma actualização salarial. Não houve aumento de pensões. E muitas medidas prometidas e propaladas ainda estão engavetadas, porque ocorreu um problema basilar com o MpD que foi fazer uma campanha à esquerda e agora quer governar à direita. Governar é estabelecer prioridades. Mas como é que o governo vai estabelecer prioridades se ainda não definiu a sua visão de desenvolvimento?
O ministro das Finanças diz nestes dois anos houve um aumento da massa salarial a rondar os 10% tendo em conta as progressões na carreira e as promoções.
Não, ele tem dito isso mas esse é um discurso que não colhe. O ministro das Finanças nunca se propôs resolver os pendentes alternativamente ao aumento salarial. O que foi prometido era a resolução dos pendentes e, ao mesmo tempo, promover a actualização salarial.
O governo tem evitado falar de assuntos mais sensíveis como foi o caso da alteração dos direitos aduaneiros. Notou-se também um certo silêncio da sua parte...
No debate parlamentar eu não estava ausente. Aliás, as garantias, ao ministro das Finanças, foram pedidas por mim e há gravação.
Mas agora mais recentemente houve um debate em que esteve ausente pelo menos um dia.
Não. Eu estive ausente no primeiro dia da sessão do mês de Fevereiro por razões de saúde. Mas eu participei em todas as discussões e pronunciei-me várias vezes.
Um dos argumentos que o MpD tem usado é a entrevista que deu à TCV, na sequência de uma visita à Tecnicil, em que defendeu a protecção ao sector empresarial e diz depois não concorda com esta medida tomada pelo governo.
Não. Não concordo com esta medida tomada pelo governo nos moldes em que foi tomada. Nós entendemos que a produção nacional deve ser protegida e defendemos a protecção da indústria nacional de uma forma coerente e responsável porque acreditamos que é industrializando o país que teremos condições de aumentar a empregabilidade, as oportunidades e promover o crescimento. Diferente é o ministro em nenhum momento ter referido que tinha interesses próprios nessa questão. Se analisar a gravação da discussão do Orçamento do Estado, confirmará que eu, enquanto líder parlamentar, questionei várias vezes, aquando da discussão do artigo que propõe incentivos para as Sociedades Gestoras de Participações Sociais (SGPS), se o ministro conhecia alguma sociedade que seria directamente beneficiada. O ministro não me respondeu e comprometeu-se a enviar-me os dados depois. Já estamos em Abril de 2018 e eu ainda estou à espera dos dados das SGPS. Em nenhum momento ele partilhou com o país de forma clara, pública e notória que era accionista da empresa. Todos sabiam que ele era ex-administrador. Mas entre ser antigo administrador e ser accionista há uma diferença. Porque administrador, enquanto desempenha tem interesse directo, mas deixando de desempenhar, desvincula-se. Nós pedimos três garantias: qualidade, quantidade e preço. Defendemos que deve haver sempre um equilíbrio entre a protecção dos interesses, de proteger a indústria nacional e a protecção dos consumidores. E foi para garantir isso que pedimos que esses pressupostos fossem cumpridos e de facto essas garantias foram prestadas no Parlamento. Mas eu não poderia deixar de dizer que entre se apresentar uma proposta abstracta para protecção da indústria nacional e se apresentar uma proposta em que dias depois se descobre que o ministro das Finanças é titular de uma percentagem de acções de uma das empresas que directamente, ou mais imediatamente, vai beneficiar com a medida, há uma diferença enorme.
Surpreendeu-vos esta medida do governo? Analisando o posicionamento de cada um dos partidos este tipo de proteccionismo seria muito mais natural se surgisse da vossa parte.
Muitas pessoas têm dito isso. Mas como disse, algumas decisões do governo do MpD já não estão a surpreender muito por causa do nível de incoerência que demonstram.
Olavo Correia continua a ter espaço no governo?
Aqui, mais uma vez, eu penso que é preciso apelar à coerência. Olavo Correia foi quem mais falou de transparência, de lisura e de ética desde que estava em campanha eleitoral e depois de assumir a governação. A transparência, a lisura e a ética não se propalam, demonstram-se com atitudes. E a nível de transparência vou dar alguns exemplos: nós pedimos ao ministro das Finanças que nos facultasse o contracto de arrendamento que foi feito com a empresa onde ele é accionista para funcionamento do Gabinete de Grandes Contribuintes, esse pedido foi feito há mais de três meses e ainda não tivemos resposta. Pedimos que nos facultasse informações sobre o total dos montantes reembolsados às empresas desde que assumiu a governação e ele não respondeu. Pedimos que nos facultasse informações e os contractos de gestão que já celebrou com várias chefias do Ministério das Finanças, desde que assumiu o ministério, há mais de três meses e ele ainda não respondeu. Porquê? O senhor ministro das Finanças sempre defendeu, ele e o Primeiro-ministro, que com a governação do PAICV havia contractos com valores exorbitantes. Estabeleceram uma estratégia dizendo que ninguém na função pública ou no sector empresarial do Estado ganharia mais que 300 contos. Isso não corresponde à verdade. Há vários dirigentes na função pública que estão a ganhar muito mais que isso. Mas, como ele não faculta as informações, a própria oposição diz, mas fica sem os documentos de prova. Porque também, o que está a ocorrer, é que há uma grande perseguição e intimidação na função pública que está a ser denunciada de forma quase quotidiana. Por outro lado há uma gestão de assuntos do Estado e de bens do Estado como se de bens próprios se tratassem. Exemplo disso foi o negócio feito com a Icelandair em que o senhor ministro respondeu-me dizendo que não me pode facultar a cópia do contracto do acordo porque há uma cláusula de confidencialidade que o impede de partilhar o contracto até com os deputados que têm por missão fiscalizar a acção governamental.
Contractos que deviam ter sido publicados no Boletim Oficial?
Se o governo respeitasse o ordenamento jurídico cabo-verdiano e as leis. Porque de acordo com o Regime Geral das Privatizações não só a minuta do contracto devia ter sido publicada como também as informações mais relevantes do negócio deviam ser partilhadas num dos jornais mais lidos do país.
A TACV tem sido um ponto de polémica ao longo destes dois anos. O negócio com a Icelandair, já por várias vezes o disse, é um negócio obscuro. Que expectativas é que o PAICV tem até que acabe este contracto de gestão?
Qualquer resposta que eu lhe desse aqui não teria a profundidade que seria necessária pela escassez de informações. O que nós sabemos é aquilo que com muita dificuldade conseguimos ter no Parlamento, sendo certo que o ministro das Finanças tem evitado as audições com a Comissão Especializada de Finanças e Orçamento e o Primeiro-ministro vai ao Parlamento de seis em seis meses. Portanto, não aparece para não responder aos questionamentos dos deputados porque terá muita coisa a esconder. Eu tenho dito que quem governa com resultados tem vontade de partilhar para mostrar os ganhos que o país e as populações estão a ter. Para o Primeiro-ministro não querer ir ao Parlamento e o ministro das Finanças dificultar as audições em sede de Comissão Especializada de Finanças e Orçamento e se recusar a responder às cartas com pedidos de esclarecimentos dos deputados é porque os negócios que estão a ser feitos são obscuros. Quanto aos TACV, sabemos, primeiramente que as soluções milagrosas e imediatas que foram prometidas tardam em chegar por uma razão muito simples: o actual governo pensou que com a nomeação de um novo Conselho de Administração resolveria todos os problemas. Nomeou-o logo após as eleições, os problemas continuaram, começou a promover a liquidação dos TACV, entregou o mercado doméstico a uma empresa privada. Por outro lado decidiu fazer um negócio que também ninguém conhece com a Icelandair. E o que nós sabemos é que depois de todas as promessas e soluções mágicas e imediatas feitas por Ulisses Correia e Silva e por Olavo Correia, é que os TACV foram desmantelados e estão em plena liquidação. O governo já ‘meteu’ dois milhões de contos na transportadora aérea, uma transportadora que já nem está a voar nos voos internos, os trabalhadores da empresa não conhecem o seu futuro. Uns estão a ser transferidos, outros devem ir para a reforma antecipada sem terem todas as respostas e o hub aéreo foi transferido para o Sal por decreto. A nossa apreensão é grande e a nossa preocupação com o futuro é ainda maior.
Quanto à regionalização, o Primeiro-ministro rejeitou totalmente a vossa proposta. O que entenderam daquela mensagem, principalmente quanto à redução do número de deputados à Assembleia Nacional?
Cabo Verde tem procurado, ao longo dos anos, um modelo de governação das ilhas que melhor sirva o interesse das pessoas e que contribua para um desenvolvimento equilibrado do território nacional. Nessa busca avançou-se com a descentralização com a implantação do poder local. Durante os anos de governação do PAICV, desde 2001, desencadeou-se um processo de discussões e reflexões que apontou caminhos e forneceu pistas para a organização administrativa do país. E, nesses debates que se fizeram, uma das vias apontadas para o aprofundamento da descentralização foi a da regionalização administrativa. Para o PAICV, esse processo deve ser no âmbito de uma forte e ampla reforma do Estado com desconcentração da administração central do Estado, ou seja, da efectiva transferência do poder de decisão para as ilhas/regiões sob orientação dos serviços centrais com o objectivo de, por um lado, aproximar os centros de decisão às populações e, por outro, facilitar e imprimir celeridade e realismo à decisão. Por isso é que nós iniciaremos em breve a socialização do nosso projecto de lei que cria as regiões administrativas. O PAICV é, de forma clara, pela regionalização administrativa. Mas no âmbito de uma ampla reforma do Estado. Quanto à recção, o Primeiro-ministro tem-nos habituado a algumas reacções imponderadas. Eu devo dizer que encaro todas as declarações, sejam favoráveis ou desfavoráveis com respeito e atenção. Mas naturalmente que as encaro desde que tenham alguma dose de seriedade. Por isso, não constituem motivo de muita preocupação as reacções do Primeiro-ministro às propostas do PAICV. Esta questão não começou a ser trabalhada ontem. A primeira conferência que fizemos sobre essa questão neste mandato foi em Junho de 2016 em São Vicente. Nós socializamos as linhas gerais deste projecto de regionalização enquadrado numa ampla reforma do Estado no Conselho Nacional do partido que teve lugar a 15 e 16 de Julho de 2017. Já discutimos essa questão por duas vezes na Comissão Política Nacional. Já levamos essa questão para análise no grupo parlamentar.
Mas apenas uma regionalização administrativa e não política?
Administrativa. Quando falamos nessa reforma do Estado estamos a falar de diversas dimensões. Primeiro, nós queremos atingir dois objectivos: o aprofundamento da democracia e a redução do peso da estrutura central. E com isso entendemos como fundamental promover-se o redimensionamento da estrutura do governo e da administração central e por outro lado um redimensionamento da estrutura da Assembleia Nacional. Com base nisso propusemos que se avance com a proposta de redução do número de Deputados Nacionais. Isto tem a ver com duas dimensões. A primeira é a proposta que estamos a fazer em matéria de regionalização administrativa, porque, segundo a nossa proposta, devem ficar na administração central as áreas de soberania e ser transferidas para as regiões todas as áreas que tenham a ver com a administração do desenvolvimento. Para as regiões estamos a propor três órgãos: a Assembleia Regional, a Junta Regional e Conselho Regional. As Assembleias Regionais terão os seus eleitos, terão deputados regionais que vão ter como missão fiscalizar a actuação da Junta Regional em matéria de administração de desenvolvimento. Se num governo central devem ficar os sectores de soberania, por que razão devemos manter a estrutura do Parlamento como está? Mas é claro que o Primeiro-ministro quando reage daquela forma, acusando-me de populismo eventualmente esteja então a ver-se ao espelho. Eu tenho sido muito coerente com as posições que tenho assumido. Também vamos propor a votação uninominal em listas fechadas mas não bloqueadas para dar ao cidadão a oportunidade de escolher o representante que lhe dê mais garantia e que ele sinta que o represente melhor. Mas essas propostas não foram apresentadas por mim agora e não são uma resposta a ninguém. A votação nominal foi avançada por mim na minha moção de estratégia na candidatura à liderança do PAICV em 2014. A qualificação da governação territorial para o aumento da eficiência e a redução dos gastos públicos também consta da plataforma eleitoral que eu, enquanto presidente do partido, e o PAICV apresentamos aos cabo-verdianos nas eleições de 2016. Na plataforma está a perspectiva de emagrecer o Executivo e o Legislativo, passando claramente pela redução do número de deputados. Nas eleições de 2016 a plataforma tinha o compromisso de qualificar a governação territorial, reduzir o custo do Estado e melhorar a sua eficiência. O PAICV comprometeu-se a lançar um debate nacional sobre a dimensão do aparelho do Estado para se debruçar sobre todas as questões chave como o número de deputados, a necessidade de emagrecimento de alguns corpos como o Legislativo e o Executivo, as nomenclaturas fixas dos ministérios, a estrutura do governo e do Estado incluindo as questões de descentralização e desconcentração administrativa e regionalização. Quando falo, quando tenho a preocupação de ter em conta os custos, os gastos para o país, é porque eu defendo um Estado suficiente, defendo um Estado eficiente mas que os cabo-verdianos possam pagar. Analisando a proposta do MpD não se pode acreditar que é uma proposta feita com seriedade, salvo o devido respeito. Porque o Primeiro-ministro não pode imaginar, e não quero crer que ele possa imaginar, que vai poder, de forma séria e com efeitos na vida das pessoas para melhor, criar regiões e criar mais estruturas deixando a actual como está. Porque não faz sentido. Se o Primeiro-ministro quer de facto transferir os poderes para as regiões, ou ele transfere, e é consequente com essa transferência, ou ele apenas está a tentar enganar os cabo-verdianos mais uma vez. Porque, que sentido faz transferir-se efectivamente poderes para as regiões, criarem-se Assembleias Regionais com deputados eleitos pelo povo para fiscalizar a actuação do órgão executivo regional ficando o Estado só com algumas competências e continuarmos exactamente com a mesma filosofia a nível central? Ou transfere, de facto, ou então não transfere. O que não pode acontecer é ele continuar a pensar que pode enganar eternamente os cabo-verdianos.
O PAICV quer uma regionalização com 10 regiões? Não lhe parece demasiado?
Nós defendemos é, de facto, a criação de 10 regiões com Santiago dividido em duas regiões. Defendemos regiões em todas as ilhas tendo Santiago as regiões de Santiago Norte e Sul.
Não se estará a transferir as ‘gorduras’ do Estado para cada uma das ilhas?
Não. A perspectiva é potenciar um planeamento regional com efectivos poderes de decisão naturalmente enquadrados em todos os instrumentos de planeamento nacional que sejam estratégicos.
E o PAICV está convencido que vai conseguir avançar com o seu modelo de regionalização?
O PAICV sempre que avança com uma matéria, fá-lo de forma convicta. Mas o PAICV, neste momento, não tem maioria no Parlamento e o MpD tem dado sinais claros de que muitas vezes em vez de usar a razão usa a força da maioria.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 856 de 25 de Abril de 2018.