Professores entre a descrença no sistema de avaliação e a espera pela resolução de pendentes

PorNuno Andrade Ferreira*,3 set 2023 7:47

Escola de Chã de Cemitério, São Vicente
Escola de Chã de Cemitério, São Vicente

Novo ano lectivo chega com esperanças e energias renovadas, mas também com problemas que tardam em ser resolvidos. Professores partilham preocupações e deixam alertas.

Com Setembro à porta, eis também o novo ano escolar. O início formal está marcado para esta sexta-feira, dia 1. As aulas arrancam cerca de duas semanas mais tarde, a 18, com o regresso às salas de aula (com excepção dos que por lá chegam pela primeira vez) de mais de cem mil alunos, distribuídos por diferentes níveis de ensino.

Para cerca de seis mil professores, os primeiros dias do mês serão dedicados à preparação de aulas, organização interna nas escolas, balanço do que ficou para trás e antecipação dos desafios profissionais que continuam por resolver. A problemas antigos juntam-se, para os sindicatos da classe, questões mais recentes.

Desde logo, o presidente do Sindicato Nacional dos Professores (SINDEP), Jorge Cardoso, não esconde a sua apreensão perante as actuais regras de avaliação, com alunos “a fazer provas e mais provas”, depois de falharem os objectivos de aprendizagem, com o único objectivo de transitarem de ano.

“É necessário maior rigor na feitura das avaliações, porque não se pode pensar apenas na aprovação, se os alunos não atingiram os objectivos em várias disciplinas. Daí que consideramos que o ensino não está da melhor forma”, estabelece.

A redução da carga horária em várias disciplinas, incluindo científicas, introduzida com a reforma curricular, também preocupa os docentes, que se julgam incapazes de desenvolver com os alunos a quantidade e qualidade de trabalho necessário para produzirem todos os elementos de avaliação esperados.

“Estamos a viver uma situação anormal. Nessa revisão curricular, mesmo as disciplinas científicas foram reduzidas para dois tempos semanais para cada turma. Se fizermos as contas, em condições normais, sem faltas, sem feriados, ao longo de um trimestre, um professor entra numa sala de aula 24 vezes”, contabiliza.

O presidente do SINDEP sublinha que a redução de carga horária implica que os professores assumam maior número de turmas, relatando casos de docentes com 11 turmas sob sua responsabilidade.

“Essa revisão curricular, dessa forma, é para não fazer a contratação de mais professores”, sentencia.

Reclassificações por fazer desde 2019, não pagamento de subsídios por não redução de carga horária, congelamento de carreiras e transição de professores licenciados. A lista de pendentes elaborada por Jorge Cardoso é extensa. Será com ela na mão que os professores entrarão no novo ano lectivo.

À falta de sinais por parte de tutela, que demonstrem vontade de fechar dossiers abertos, o SINDEP convocará os professores para uma greve, “logo nos dias 18 e 19 de Setembro”.

“Nós representamos mais de 50% dos professores cabo-verdianos, temos mais de quatro mil associados a nível nacional. Esta é a nossa posição e é em defesa dos professores. Os professores estão agastados com toda essa situação”, desabafa.

“O professor quer um incentivo”

O Sindicato Democrático dos Professores (SINDPROF) privilegia uma abordagem “pedagógica”, mas não deixa dúvidas quanto à existência de inúmeras queixas por parte da classe. A presidente da organização, Lígia Herbert, também quer mais professores nas escolas, enquanto ambiciona por carreiras descongeladas e por uma perspectiva de futuro para quem escolheu uma vida no ensino.

“O professor quer um incentivo. Não há promoção, há estagnação na carreira, sem falar do grave problema que aconteceu com o INPS, com professores doentes que não conseguem adquirir os medicamentos na farmácia, porque estão sem cobertura, quando o desconto é feito no seu salário todos os meses”, alerta, numa referência à situação enfrentada por vários docentes, que viram negado o acesso à previdência, alegadamente por constrangimentos na adaptação ao novo modelo electrónico de submissão de folhas de vencimento.

Tal como o SINDEP, o SINDPROF não é indiferente aos mecanismos de avaliação de estudantes e ao mau aproveitamento “exagerado” que se verifica nas disciplinas exactas. Um reflexo, acredita Lígia Herbert, da opção por “passagens automáticas”.

A sindicalista pede estabilidade curricular e programática, contrariando as sucessivas reformas. Parar, pensar e dar tempo para consolidar mudanças é o conselho.

“Épreciso sentar para rever todo o sistema educativo, porque são reformas sucessivas. Não se consegue mastigar, nem fazer a digestão de uma reforma, aparece imediatamente outra, para o professor voltar a digerir”, ilustra.

Lígia Herbert tenta manter a esperança de que o ano escolar se iniciará e decorrerá sem sobressaltos. Contudo, o optimismo é contrariado pelos sinais que recebe. A saída “massiva” de professores, “em busca de melhores condições”, não deixa grande margem para entusiasmos por parte da dirigente sindical.

O ano 2023/2024 decorrerá ao longo de 36 ou 37 semanas, divididas em três períodos. A excepção será o 12º ano, que terá 34 semanas de actividades lectivas. As aulas começarão com uma fase de aplicação da avaliação de diagnóstico e recuperação de aprendizagens, pelo período máximo de um mês.

*com Fretson Rocha

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1135 de 30 de Agosto de 2023.

Concorda? Discorda? Dê-nos a sua opinião. Comente ou partilhe este artigo.

Autoria:Nuno Andrade Ferreira*,3 set 2023 7:47

Editado pormaria Fortes  em  30 abr 2024 23:28

pub.

pub.

pub
pub.

Últimas no site

    Últimas na secção

      Populares na secção

        Populares no site

          pub.