Que expectativas é que tem para este ano parlamentar que vai começar agora?
Que este seja um ano mais produtivo. Com isto não quero dizer que os outros anos não foram produtivos, nomeadamente nós temos os relatórios de actividades da Assembleia Nacional que mostram que temos tido um bom desempenho. Espero que para o próximo ano nós nos concentremos, sobretudo na questão que tem a ver com a eleição dos órgãos externos. Evidentemente vamos começar com o debate sobre a situação da Justiça. Já temos os relatórios do Conselho Superior de Magistratura Judicial e o do Conselho Superior do Ministério Público. Nós despachamos, consoante manda o regimento da Assembleia Nacional e ontem recebemos também, cumprindo o prazo, o relatório parecer circunstanciado da 1ª Comissão, que é o relatório que vai servir de base para o debate dessas questões. Depois vamos ter o Orçamento de Estado, que vai dar entrada hoje [terça-feira] e vamos despoletar todo o processo que tem a ver com o Orçamento de Estado. Mas nós temos também a questão que tem a ver com a eleição dos órgãos externos à Assembleia Nacional. Temos a CNPD, temos a ARC, temos a Comissão Nacional de Eleições. Nós não vamos agora entrar nessa actividade logo em Outubro, porque temos eleições em Dezembro e não é aconselhável que se mexa nesses três órgãos num período eleitoral.
Eu ia perguntar se não seria extemporâneo estar agora a mexer na CNE.
Agora sim, agora. Tanto a CNE como a ARC. A ARC também tem um papel importante no acompanhamento da democracia, das eleições, etc. A própria Comissão Nacional de Protecção de Dados, porque as eleições têm a ver com dados dos cidadãos. Há um entendimento entre os grupos parlamentares para avançar com este processo a partir de Janeiro. Não lhe vou dizer que vamos conseguir, vai depender evidentemente, do consenso entre os grupos parlamentares, sobretudo entre o MPD e o PAICV. Mas espero que consigamos chegar lá, tendo em conta que é um processo também que se vem arrastando desde o início da minha legislatura. Nós conseguimos eleger os órgãos que têm a ver com a justiça, mas não conseguimos eleger ainda esses três. E temos agora, por acréscimo, a eleição dos juízes para o Tribunal Constitucional. Como sabe, o mandato está a terminar e nós temos que conseguir chegar a entendimento para a eleição desses outros. Então, são as questões fundamentais. Mas também vamos avançar com a diplomacia parlamentar. Nós voltámo-nos um pouco para África, quisemos aproximar-nos um pouco, sobretudo, a nossa sub-região, a CEDAO. Nós agora estamos um pouco também com a Europa, tivemos agora a visita do nosso homólogo de Luxemburgo, em princípio vamos retribuir a visita no primeiro trimestre do ano que vem. Temos Portugal, que ainda vai visitar antes do final do ano e vamos continuando com essa diplomacia parlamentar que é muito importante. Portanto, a minha perspectiva é de ser um ano bom, apesar de ser um ano eleitoral.
Temos também partidos a falar da possibilidade de continuar a questão da reforma do Parlamento, especialmente do Regimento da Assembleia.
Exacto, é uma questão que nós temos sobre a mesa, uma questão central. Neste momento, como se sabe, nós tínhamos uma comissão eventual para a reforma do Parlamento, a comissão já fez o seu trabalho, já temos todos os instrumentos elaborados e aprovados a nível dessa comissão e neste momento estamos à espera que a comissão dê entrada de alguns desses documentos, dessas propostas, para podermos despoletar o processo. Os partidos, sobretudo os dois maiores, pensam avançar primeiramente com o regimento e a regulamentação da Comissão de Ética e de Decoro Parlamentar, para depois avançarem com outros instrumentos, como a lei orgânica da Assembleia Nacional, que neste momento está um pouco desfasada daquilo que é realidade, depois temos o estatuto dos funcionários, porque nós também achamos que é preciso ter funcionários motivados, com uma carreira fluída, para que possamos ter alguém que nos dá suporte, que dê suporte aos deputados no exercício das suas funções. E entre esses documentos está também o Estatuto dos Titulares de Cargos Políticos que, como se sabe, na sociedade cabo-verdiana é um assunto um pouco tabu. É preciso que o Parlamento seja reformado para ser mais eficiente, para ser mais eficaz, para ser mais aberto, mais transparente, para que as comissões especializadas possam, de facto, exercer aquilo que é o seu papel fundamental.
Há também a possibilidade de revisão da Constituição.
Sim, já entrámos no período que nós chamámos de período de revisão. O problema que tem a ver com a reunião da Comissão Permanente, que deu muito que falar, porque a Constituição, antes da sua última revisão, dizia que a Comissão Permanente funciona no intervalo das sessões e a última revisão complica as coisas. Diz que deve funcionar no intervalo das sessões legislativas. Sessão legislativa é de um ano. Começa em Outubro e termina em Julho. Significa que a comissão permanente só poderá reunir-se nos meses de Agosto e Setembro. A segunda questão tem a ver com a substituição do Presidente da República. Há um entendimento entre as partes, quer a nível do governo, quer a nível da Assembleia Nacional, como da Presidência da República, de que não faz sentido o Presidente da Assembleia Nacional estar a substituir o Presidente da República quando ele esteja ausente do país em missão como Presidente da República. Se se for analisar, pode-se ver que estaremos a ter dois Presidentes da República ao mesmo tempo. É claro que os constitucionalistas, os peritos na matéria não gostam que a gente mexa constantemente na Constituição. Mas eu creio que há coisas que acabam por dificultar o funcionamento dos órgãos. E como sabemos, as instituições são muito importantes na democracia. Temos de ter instituições que funcionam e que sejam fortes, eficazes.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1192 de 2 de Outubro de 2024.