Economia Marítima: O que propõem os partidos?

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​A transformação da Economia Marítima num dos pilares fundamentais para o desenvolvimento do país é uma das metas dos partidos políticos concorrentes às legislativas de 18 de Abril.

A Economia Marítima é o tema de hoje do “Fórum 2021 – A Caminho das Legislativas”.

UCID

A União Cabo-Verdiana Independente e Democrática (UCID) afirma que as políticas implementadas para a Economia Marítima e pescas não surtiram efeito. O partido justifica a posição com a alegada degradação do sector e com as diversas queixas dos operadores.

Através de Francisco Silva, a UCID faz um num balanço negativo dos últimos anos.

“Estamos a falar de um eixo de desenvolvimento de Cabo Verde, dos mais importantes. Quando fazemos uma análise, um roteiro sobre as políticas públicas implementadas no sector da Economia Marítima, contactando esses operadores, nós encontramos somente queixas, isso quer dizer que, embora tão propaladas, as políticas públicas implementadas não surtiram efeito”, avalia.

“Por exemplo, se formos ver os transportes marítimos, é ineficiência total. Os pescadores e armadores queixam-se da ineficiência da política implementada nesse sector. Por isso, o nosso balanço não pode ser positivo”, observa.

Os democratas-cristãos apontam para a falta de uma política de acompanhamento dos operadores, nomeadamente, para peixeiras e pescadores.

A UCID também crítica o acordo de pesca entre Cabo Verde e a União Europeia

“Não há uma política clara e transparente de financiamento, formação e acompanhamento para os pescadores e as peixeiras neste sector, porque se houvesse nós encontrávamos satisfação. Vemos que a nível das pescas há um grande descontentamento com o acordo que o governo celebrou com a União Europeia. Os pescadores não têm capacidade de pescar no alto mar, onde se pode fazer a maior captura, não há uma política de industrialização para utilização das capturas em excesso e não há uma política clara para concessão de equipamentos aos pescadores que muitas vezes têm fraca possibilidade económica para conseguir um barco de pesca ou motor de popa”, aponta.

Para reverter o actual quadro, a UCID propõe a redefinição de políticas.

“É preciso que se criem condições para que haja não só investimento interno, dos nossos pescadores, mas também criando toda uma dinâmica de captura, do tratamento, da industrialização para podermos competir não só com os nossos concorrentes a nível de Africa Ocidental mas também a nível Europeu. Criar um sistema de joint-ventures com os operadores internacionais para a pesca, em que os nossos pescadores também terão direito e a capacidade técnica de navegar e pescar em qualquer parte, dentro da nossa área marítima”, recomenda.

MpD

O Movimento para a Democracia (MpD) diz que nos últimos cinco anos dignificou e fez a reestruturação do sector das pescas, com a revisão da legislação e do modelo de embarcação, nomeadamente para a pesca artesanal.

O porta-voz do partido e candidato às eleições legislativas de 18 de Abril, pelo círculo eleitoral de Santiago Sul, Paulo Veiga, refere que o objectivo é chegar a 100% de embarcações de pesca motorizadas e seguras, ainda este ano.

“Nós fomos um bocado além, tendo em conta que queremos embarcações seguras. Deixámos de comprar motores de 8 cavalos. Só comprámos de 15 cavalos para cima, por causa da potência, das nossas correntes e da segurança do homem no mar. Dignificámos o sector. Criámos o cartão do pescador que permite ao pescador ser reconhecido como uma profissão e que irá permitir ao pescador ter acesso mais facilitado à segurança social”, enumera

“Estamos a investir fortemente na segurança do pescador e das embarcações. Estamos a dar um kit de segurança a todos e é um processo que termina em finais de 2021. Queremos ter todas as embarcações registadas, com kits de segurança, para que depois se possa aplicar a lei que é outra questão que tínhamos muita dificuldade”, acrescenta.

No que diz respeito à pesca semi-industrial, Paulo Veiga, refere que o executivo em final de mandato encontrou um sector abandonado. Veiga garante que foram criadas condições para apoiar os armadores no investimento e na renovação da frota, assim como a resolução do problema de falta de gelo em todos os pontos do país.

“A nível do sector semi-industrial havia quase que um abandono total. Nós criámos um ecossistema entre a Pró-Empresa, Pró-Capital e Pró-Garante, que está a apoiar os armadores na renovação da frota. Nós encontramos 120 embarcações, das quais só 45 estavam a operar em 2016. Neste momento, temos cerca de 75 a operar. Outra questão que não estava a funcionar em 2016 e que hoje já não se ouve falar é falta de gelo. Nós definimos uma política, criámos as condições, ajudámos a criar o financiamento, para que privados investissem no sector do gelo. Estamos a trabalhar com a APESC – apoiámos na criação da cooperativa - e agora já estamos na fase de procurar dois barcos industriais para que eles também possam começar a mover do semi-industrial para o industrial”, afirma.

O representante do MpD aponta o mergulho seguro, regulamentado e supervisionado, o reforço da inspecção das pescas e a formação de pescadores sobre pesca sustentável e regulamentada como outros projectos em andamento.

Ter armadores e barcos industriais, diversificar a pesca e desenvolver a aquacultura são os principais objectivos para os próximos cinco anos.

“Para os próximos cinco anos, definitivamente, ter um sector e com armadores de barcos industriais. Objectivamente, estarmos a pescar o atum que passa nas nossas águas e diminuindo as autorizações que damos às embarcações estrangeiras. Diversificar a pesca, formar mais, conhecer melhor o mar que nos rodeia e os recursos que tem para podermos diversificar o tipo de pescado que podemos pescar e também exportar mais diversidade. Desenvolver a aquacultura – um projecto que já arrancou com a Fazenda do Camarão, e nós demos todo o suporte. E agora estamos com um projecto norueguês para produção do atum-rabilho, que é um projecto pioneiro no mundo”, exemplifica.

PAICV

O Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV) entende que se pode fazer muito mais pelo sector das pescas.

O PAICV não tem dúvidas de que persiste a necessidade de redinamizar as pescas e sectores conexos, integrados no domínio da economia marítima, através da definição e implementação de políticas assertivas.

Através de Adalberto Vieira, o partido defende que só assim será possível contribuir, por exemplo, para a diversificação das fontes de receita e para a melhoria das condições de vida dos cabo-verdianos.

“Para isso, nós achamos que de facto persiste a necessidade de se ter em consideração uma estratégia assertiva e integrada para o sector das pescas e outros domínios ligados à Economia Marítima, que possam tirar partido da nossa Zona Económica Exclusiva, que encerra um conjunto de oportunidades que podem e devem ser exploradas. Sem contar com as potencialidades inerentes à pesca além-fronteiras, offshore, no âmbito dos protocolos existentes”, adianta.

“Nós achamos que Cabo Verde deve apostar nas pescas, no mar como alavanca para o desenvolvimento e diversificação económica, e que persiste a necessidade de se ter em consideração um conjunto de directrizes, nomeadamente a necessidade de se promover valor acrescentado dos produtos provenientes da pesca artesanal”, complementa.

O PAICV fala na necessidade de se promover a cooperação e competição entre os diferentes intervenientes ligados ao sector da pesca artesanal, beneficiar de economia de escala e contribuir para a existência de cooperativas ou empresas comunitárias, dando assim maior formalização à actividade.

Também defende a renovação da frota semi-industrial e a criação de condições para a pesca de longo curso.

“Constatamos também que existe a necessidade de se apoiar a dinamização da pesca semi-industrial, através da criação de condições para que possamos ter pesca de longo curso por via do incentivo à renovação das embarcações. As embarcações existentes estão obsoletas, acarretando com isso enormes custos operacionais e impossibilitando a diversificação da captura e, de certa forma, contribuindo para que a actividade pesqueira em si seja pouco rentável ou não rentável”, diz.

“Existe também a necessidade de apoiar o subsector intermédio do processamento/agregação de valor para que possamos ter cada vez mais agregação de valor aos produtos da pesca, por exemplo, através de incentivos direccionados, tendo em vista a estruturação da actividade, através da melhoria da eficiência produtiva, concessão e implementação de estratégias de acesso a novos mercados”, acrescenta.

O PAICV pretende promover o programa “exportar cá dentro” que possibilite a ligação entre os diferentes sectores da cadeia de valor das pescas, para que se possa ter o nicho do mercado turístico hoteleiro como uma opção.

O apoio à beneficiação e à construção de infra-estruturas de suporte à actividade pesqueira, ao longo da cadeia de valor, e a criação de um fundo rotativo, proporcionando a geração de postos de trabalho, são outras apostas.

“Daremos uma atenção especial ao combate à pesca ilegal, não declarada e não regulamentada, a aposta na investigação haliêutica como suporte à tomada de decisões num plano de definição de políticas de sustentabilidade. Em outros domínios, daremos uma atenção especial à questão do turismo de cruzeiro, à reparação naval, e com isso a Cabnave merecerá a nossa especial atenção, com o relançamento do dossier. Nós vamos trabalhar para que, efectivamente, o domínio do transbordo possa ser explorado e possamos contribuir para que as diferentes potencialidades sejam efectivamente exploradas e dêem um contributo para que as outras actividades que estão relacionados possam também se desenvolver”, assegura.

PP

O Partido Popular (PP) afirma que o sector das pescas e economia marítima é estratégico e de importância vital para o desenvolvimento social e económico do país, mas também entende que não tem merecido a devida atenção dos governos. Para o partido, os governos não têm capitalizado os investimentos necessários, para que possa contribuir, de facto, para o crescimento da economia nacional.

Nelson Monteiro, membro do PP, afirma que os problemas começam, sobretudo, nos pescadores locais, que não têm condições para o exercício da actividade.

“Em alguns locais, o pessoal tem muitos problemas em relação à saída e entrada de barcos dos locais onde estão, portanto, uma das soluções seria a construção de cais de pesca. O pescador sai, faz a sua pesca, volta com a sua mercadoria e tem problema para conservação do pescado. Temos que investir neste tipo de coisas, câmaras frigoríficas, no fornecimento de gelo para que possam preservar o pescado, ajudar na aquisição de motores para os barcos, na compra de combustíveis para que possam sair para o mar”, aponta.

O partido aponta a necessidade de revisão do acordo de pescas entre Cabo Verde e a União Europeia. Segundo Nelson Monteiro, nos moldes em que está, o acordo não serve os interesses do país.

“Dentro do sector da economia marítima, o acordo de pesca com a UE é um acordo que em parte beneficia Cabo Verde, diz que os navios que fazem parte da UE têm 8 mil toneladas de pescado por ano para capturar nas nossas águas, em relação a isso, tem o valor estipulado de 750 mil euros por ano, que o governo recebe. Mas tem um lado que peca, por exemplo, quando estabelecem a quota de pescado, se o pessoal ultrapassar isso é aplicada uma multa, então, esse valor de multa é o mesmo, independente da quantidade de peixe em excesso. Eu acho que deveria haver multas severas para os infractores que ultrapassam as quotas”, afirma.

Nelson Monteiro destaca as potencialidades do país na área das pescas e da Economia Marítima, mas afirma que falta capacidade para negociar.

Por isso, o PP defende o desenvolvimento de actividades que sejam mais-valia para Cabo Verde.

“O investimento tem que ser feito onde o país possa ser dono do negócio ou principal accionista, porque fazer um acordo onde o maior beneficiário não seja o nosso país é deixar que nos roubem a cavala na bolsa. Por isso que eu digo, a parte da aquacultura, que ainda é pouco explorada, é um sector onde temos que aproveitar, porque baías para isso temos, precisamos explorar isso de forma que beneficie o nosso país e não terceiros”, preconiza.

“Dentro da área da pesca, ajudar os que realmente precisam, que são os nossos pescadores que dia-a-dia estão na luta, e ajudá-los a fazer isso de uma forma que seja sustentável”, sublinha.

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PSD

O Partido Social Democrata defende um maior investimento no sector das pescas, através da renovação da frota, formação de pescadores e maior segurança para a classe.

O coordenador político nacional do PSD, José Rui Além, propõe igualmente a criação de cooperativas de pesca.

“O que precisamos de fazer é apoiar os nossos pescadores através de cooperativas. O Estado deve apoiar com barcos, com formação, com segurança para os trabalhadores, para que as pessoas possam exercer a sua profissão sem receios. Nós temos que ter em consciência que os governantes tomam decisões para a satisfação do cidadão. O povo não votou para ter um governante a chorar, vota para ter uma alternativa. Se se candidatou, já sabia à partida que não ia chover daqui a cem anos e que poderiam aparecer pandemias ou guerras lá fora, a qualquer momento, que impediriam que Cabo Verde tivesse turistas ou importação de produtos, de bens e serviços”, nota.

Para o PSD, investir nas pescas significa criar emprego. Contudo, o partido entende que o governo de Ulisses Correia e Silva não soube fazer o trabalho como deve ser.

O partido defende a industrialização do sector.

“Temos que ter um sector industrializado e com barcos. Temos que ter indústrias, fábricas, unidades produtivas que possam conservar, transformar o pescado, e depois ter os armazenistas, os distribuidores que possam fazer o seu trabalho. Isso dá trabalho a mais de 45 mil pessoas”, pontua.

“O Ulisses não soube fazer o trabalho que ele prometeu, ele não soube, porque aquilo era tudo uma mentira. Todo esse processo, desde a captura, transformação, conservação, o transporte, a distribuição implica muitos empregos. O acordo que nós temos com a União Europeia e com a China terá que ser revisto obrigatoriamente”, avalia.

José Rui Além entende que são os próprios governos que optam por não fazer os investimentos necessários nas pescas, porque não lhes interessa que as pessoas tenham capacidade económica…

“Há uma razão muito simples, que é estrutural. Se se fizer isso, as pessoas terão alguma capacidade económica. Com capacidade económica terão a possibilidade de, por exemplo, comprar livros para se instruírem aqui, ali e acolá. Lembro-me de uma entrevista da senhora Fontes, que foi ministra, ao jornal Observador, em que ela disse que agora é mais difícil governar porque o povo está a começar a abrir os olhos. Ou seja, o que podemos extrair dessa entrevista é querem que o povo esteja de olhos fechados. Se o povo for inteligente, dificilmente será governado”, defende.

PTS

O Partido do Trabalho e da Solidariedade (PTS) crítica aquilo que classifica de venda das águas de Cabo Verde e aponta para a necessidade de uma política que salvaguarde os recursos marinhos.

Jailson d’Aguiar, representante do PTS, crítica a falta de patrulha das águas nacionais, para além de falta de investimento nas comunidades pesqueiras.

“Registámos a venda das nossas águas, Cabo Verde faz um contrato com a União Europeia porque esta ajuda o arquipélago, mas também não deveria ter sido feito no preço de banana. Antigamente compravas 10 cavalas por 100 escudos, neste momento uma cavala custa 150 escudos, porque temos um mar que não é patrulhado. Quando dás condições para os barcos europeus pescarem nas nossas águas, vêm cá e os navios ultrapassam a quota de pesca porque não há controlo”, afirma.

“Os pescadores aqui no país não recebem a ajuda merecida, não lhes dão condições para que possam adquirir um barco de pesca, por exemplo. Tem que ser criada uma política que ajuda os pescadores a desenvolverem a sua actividade”, afiança.

A criação de condições para garantir a resiliência e sustentabilidade dos pescadores artesanais, para que possam deixar a situação de miséria ou de vulnerabilidade em que se encontram, o apoio na renovação das frotas e a construção de infra-estruturas de pesca são algumas propostas.

“Os pescadores não têm condições para evoluírem, criar rendimentos, não têm capacidade de pesca. É preciso criar mais condições para esta classe, cais de pesca, produção de gelo. Os pescadores da pesca artesanal, a maior parte vive na miséria porque não têm condições, têm que pedir um barco emprestado e depois a maior parte do lucro vai para o dono do barco. Parece-nos que o governo prefere deixar algumas pessoas na miséria para poder tirar proveito da miséria das pessoas”, realça.

O PTS propõe a elaboração de acordos comerciais na área das pescas e Economia Marítima que não coloquem em causa os interesses do país. Também propõe investimentos na pesca artesanal.

“As condições devem ser criadas. As pescas, juntamente com outros sectores, se beneficiarem de um investimento efectivo, vão gerar muitos postos de trabalho. E nós, como partido do trabalho, temos que procurar as soluções que geram empregos no nosso país”, sublinha.

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O Fórum 2021 - a caminho das legislativas - é o programa de cobertura eleitoral da Rádio Morabeza. Pode ouvir-nos de segunda a sexta-feira, até 16 de Abril, às 09h00 e às 17h00, em 90.7 (São Vicente, Santo Antão e São Nicolau), 93.7 (Santiago, Maio e Fogo) ou radiomorabeza.cv.

A ordem de apresentação dos partidos segue um critério alfabético na primeira edição (05/04) e rotação a partir daí.


*Nuno Andrade Ferreira (edição), Ailson Martins, Fretson Rocha, Lourdes Fortes

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Autoria:Rádio Morabeza, Expresso das Ilhas,14 abr 2021 11:57

Editado porAndre Amaral  em  19 jan 2022 23:20

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