Independência não significa Liberdade!

PorPaulo Veiga,20 jan 2025 8:13

​No ano em que o nosso país celebra os seus cinquenta anos de independência, tornou-se relevante debater não essa classificação jurídica entre nações, mas a liberdade, um conceito mais filosófico e que encontra, muitas vezes nas leis, um entrave para ser plena. Um dos maiores lutadores pela liberdade em África no século XX foi Nelson Mandela, que sobre isso escreveu: “Ser pela liberdade não é apenas tirar as correntes de alguém, mas viver de forma que respeite e melhore a liberdade dos outros”.

A África do Sul era um país independente, reconhecido internacionalmente e membro de pleno direito de inúmeras organizações mundiais. No entanto, o seu povo não era livre, as suas ruas não eram livres e a Nação não era mais que um clube privado daqueles que ocupavam o poder.

No ano que em se celebram 50 anos de independência, “apenas” celebramos 34 anos de liberdade. Não esquecer isto é garantir uma luta permanente pela renovação dessa mesma liberdade e o compromisso que garanta às futuras gerações viver de forma plena e livre. O 13 de Janeiro comemorado esta semana, é a data maior da nossa História como nação independente. É nesta data que o nosso povo pôde finalmente ser livre, e sem receios de correntes e perseguições pôde gritar os seus pensamentos e decidir o seu futuro.

A memória e a História não devem ser esquecidas, o que se torna importante é utilizar as nossas datas simbólicas para sarar feridas, conseguir olhar os olhos dos outros, reconhecer os erros e garantir que o futuro será diferente, e o nosso futuro será sempre o da liberdade, o da democracia e do respeito, sem reservas, das ambições de um povo, que é ímpar no Mundo e que faz destas ilhas o seu paraíso.

Os riscos para a democracia

No Mundo atual, existe a perceção que as democracias podem estar em risco. O pós- covid trouxe uma crise de inflação, guerras, populistas e uma explosão nas redes sociais. A esmagadora maioria dos jovens já acompanha a “atualidade” pelas redes sociais e não pela imprensa tradicional, e mesmo os jornalistas foram substituídos por comentadores e influencers. Provavelmente, o maior desafio que as democracias atuais enfrentam é o da verdade. Antigamente, a dúvida (muitas vezes verdadeira) era se os políticos eram capazes de dizer a verdade. Atualmente, com as imagens geradas em computadores, com vídeos produzidos e/ou manipulados, com pseudojornalistas que não são mais que comentadores e com ativistas disfarçados de influencers, as nossas redes sociais e os nossos órgãos de comunicação partilham mentiras, criando realidades paralelas e onde a verdade é um ativo mutável.

Este sentimento de falsidade, aliado a uma quebra total de expectativas, fazem os jovens afastar-se da democracia e do sistema político. As perceções passam a ter mais valor que os factos, a verdade passa a ser algo manipulável e os políticos atores numa peça onde o argumento não é escrito para o povo. É fundamental que exista a coragem e o altruísmo de voltar a lutar pela verdade, pela democracia, pela liberdade e pelas novas gerações. É fundamental que os jovens possam voltar a viver fora das bolhas das redes sociais e que sintam o cheiro da terra, o calor do Sol e o abraço do mar. A verdade não pode ser algo que mude para servir os nossos interesses.

A História deve ser ensinada, para que todos, em especial aqueles que não a viveram. Revivalismos do passado não podem ser opção em democracia e liberdade, mesmo que mascarados por populismos e falsos profetas. E esta importância ganha força porque importa sempre ter na memória que cerca de 60% da nossa população tem menos de 35 anos, ou seja, não sabe o que foi viver sem independência ou em ditadura. O valor da liberdade e da democracia para esta geração não é tão intenso como para aqueles que sofreram com os horrores da ausência de liberdade. Os jovens querem-se rebeldes, mas também se querem inquisitivos. Os jovens devem colocar todos os temas em causa, questionar todas as medidas, colocar todas as dúvidas, e devem fazê-lo pela verdade, procurando a verdade e lutando sempre pela verdade. Só existirá futuro se for em liberdade, e nunca essa liberdade esteve tão próxima de ser apagada de forma tão simples como apagar um perfil.

A necessidade de renovação de uma data

O 13 de Janeiro não pode, apenas, ser um feriado onde os políticos fazem discursos longos e de auto-glorificação. O 13 de Janeiro deve ser uma oportunidade constante de nós, enquanto Povo, refundarmos a nossa democracia e lutarmos pela nossa liberdade. Os barómetros políticos mostram uma democracia em crise, os jovens mostram uma descrença total com o regime e o Povo está cada vez mais cansado e desiludido.

Foi a combater este Estado que os nossos Senadores lutaram e fizeram os 13 de Janeiro. Foi contra o declínio da democracia, contra a opressão de liberdades e pelo respeito pela vontade livre dos nossos cidadãos.

Não podemos ser complacentes com o declínio da democracia, não podemos ignorar os desafios da nossa nação, e, acima de tudo, não podemos negligenciar a nossa História, a nossa herança e o nosso Povo.

O MpD precisa de um 13 de Janeiro

Cabo Verde deixou de ser um país de partido único, e é fundamental que saibamos enquanto sociedade respeitar esse legado e garantir esse futuro. O MpD representa, e sempre representou, melhor que qualquer outro partido, os valores da democracia, da pluralidade, da alternância e do respeito pela liberdade. A forma como o partido entendeu lidar com a vontade expressa do povo nas últimas eleições, e a resposta dada este fim de semana na sua reunião de Direção Nacional, mostram sinais preocupantes para a sua democracia interna.

A política é feita de e para o Povo. Saber ouvir, ter a coragem de aceitar as criticas e responder de forma séria é crucial para quem quer ser um farol dos valores democráticos e da defesa dos superiores interesses da população.

Não podem existir dúvidas nem meias verdades sobre os resultados desta reunião. Não podem existir receios de assumir os erros e definir estratégias que os corrijam. A antecipação da marcação de uma convenção, não sendo a resposta mais célere é a única posição correta, abrindo o partido ao debate e reforçando a democracia interna.

Tenho receio que se perca tempo precioso na resposta aos anseios do povo cabo-verdiano. Conforme escrevi no meu primeiro artigo de 2025, o ano começa no dia 1 e todos os dias são preciosos. É fundamental, e acredito que será possível, ter a competência de mudar estratégias, aplicar mudanças, implementar políticas e acelerar reformas, de forma a que este não seja um ano perdido e que se garanta que, mais que lugares e poder, o Povo está no centro das preocupações de quem governa.

Tenho a convicção que havendo respeito pelos militantes e pelo Povo, estes saberão dar uma resposta de união, de mudança e de futuro, um futuro que acredito passa pelo MpD, mas por um MpD que saiba centrar as suas políticas na população, saiba escutar a população e saiba atrair os melhores para o serviço da Causa Pública. 

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1207 de 15 de Janeiro de 2025.

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Autoria:Paulo Veiga,20 jan 2025 8:13

Editado porSheilla Ribeiro  em  20 jan 2025 23:27

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