Há muito que navios de países europeus visitam Cabo Verde, abrem-se à população, apresentam o seu trabalho, apoiam na segurança marítima. Contudo, a presença de cinco navios, de 2 a 10 Dezembro, nos portos da Praia e Mindelo, é diferente. Vem representar, de certa forma, uma mudança que ocorre em termos de segurança marítima desde 2021. Desde então, a presença de navios europeus em águas de Cabo Verde – e do Golfo da Guiné em geral – já não tem só origem em acordos bi-laterais, mas sim em um esforço comum coordenado de Estados-membros da UE e a própria UE, num conceito que se apelida de Presenças Marítimas Coordenadas (PMC).
Assim, a presença dessas embarcações é uma “confirmação do sucesso das PMC”, avalia a ministra da Defesa, Janine Lélis.
Em resumo, as PMC garantem “sistematicamente e de forma organizada uma presença [da UE] nas nossas águas”, reforçando a segurança marítima de Cabo Verde e demais Estados do Golfo da Guiné, explicou a ministra, que falava à imprensa esta terça-feira, na abertura da Conferência sobre as PMC.
“Existem vários programas que se repetem ao longo do ano, o que se traduz na presença marítima coordenada, onde, em concertação, alinhamos as perspectivas e conseguimos planificar o nível de segurança onde todos participam”, acrescentou.
Que quando se fala em Oceanos e segurança marítima, lembrou, estão em causa potencialidades e preocupações múltiplas como o desenvolvimento sustentável, o tráfico internacional, a pesca ilegal ou a pirataria. Questões sob alçada da Guarda Costeira e tutela, a nível nacional, mas onde é fundamental ter plataformas conjuntas de acções para dar resposta às dificuldades e ameaças.
Temas que perpassam a conferência, evento que serviu “para perspectivar aquilo que é uma acção coordenada de nós todos enquanto parceiros e promotores da paz e segurança marítima, para que todos nós possamos agregar valor nesse contexto que é desafiante”, concluiu.
PMC e Reforço
A Conferência sobre as Presenças Marítimas Coordenadas foi realizada pela Delegação da União Europeia em Cabo Verde, no quadro das celebrações dos 15 anos da Parceria Especial e contou com a presença do Coordenador Principal da União Europeia para o Golfo da Guiné, Nicolas Berlanga.
À imprensa, o embaixador lembrou que a cooperação entre a UE e Cabo Verde em matéria de segurança e defesa é antiga, “mas baseava-se sobretudo no diálogo político e nos projectos de cooperação”. O intuito é, hoje, que haja um reforço da parceria, olhando problemas e pontos comuns, e também uma discussão sobre a cooperação com a marinha nacional e exercícios conjuntos.
Em suma, o objectivo é “reforçar e lançar a linha de acção para o futuro”, disse à entrada para a Conferência
Sobre a PMC, Nicolas Berlanga recordou que os barcos europeus já estavam em “águas do golfo da Guiné”. A partir 2021, como referido, a UE passou a coordenar essa presença de forma a poder “ajudar de uma maneira mais eficiente os países do golfo da Guiné”.
A iniciativa PMC foi alvo de uma avaliação em 2022 e prorrogado. Houve ganhos, concluiu-se. “Graças a esta coordenação e a este trabalho com os países costeiros do Golfo da Guiné a presença [de navios europeus] é mais permanente. Vou dar um exemplo, Espanha, antes da PMC da UE, enviava dois barcos durante um período de 4 meses cada um, ao ano. 8 meses. Agora decidiu enviar 5 mais 5. Ou seja, durante 10 meses por ano, há um barco espanhol nas águas do golfo da Guine. E isso ocorreu também com outros estados membros da UE. Este é um trabalho conjunto não só da UE como também da UE com os seus Estados membros”, enunciou.
Nicolas Berlanga avaliza que estes dois anos de PMC trouxeram já ganhos. Do ponto de vista da UE, esta passou a ser “considerada como um actor ligado à segurança marítima”. O programa permitiu maior eficiência junto aos países do Golfo da Guiné, tendo-se estabelecido uma relação de maior confiança com esses países e suas marinhas. A UE soma-se assim, de alguma maneira, à arquitectura de Yaoundé, que é regional.
“Penso que com a PMC adicionamos mais valor à arquitectura de Yaoundé”, resume.
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Cabo Verde e Zona G
Cabo Verde tem, como é reconhecido pela UE, uma posição estratégica importante a nível da segurança marítima do golfo da Guiné (Zona G), sub-região para a qual a UE adoptou uma estratégia própria em 2014 para responder aos desafios ligados à insegurança marítima e à criminalidade organizada.
O valor estratégico do arquipélago, relembra a ministra da Defesa, Janine Lélis, está a ser reforçado pelo papel assumido, dentro da arquitectura de segurança marítima de Yaoundé (2013) - que prevê a criação de seis centros de coordenação multinacionais regionais com vista a assegurar a partilha de informação e uma coordenação eficiente entre os países da África Ocidental e Central.
Cabo Verde tem um papel determinante nessa arquitectura ao sediar o Centro de Coordenação Marítima da Zona G da CEDEAO (da qual fazem parte também Gâmbia, Guiné-Bissau, Mali e Senegal).
As obras do Centro foram concluídas esta semana, mas é necessário ainda “fazer a formação do pessoal e aguardar pela indigitação do director do centro, que é feita a nível da CEDEAO”, avançou.
“Temos o COSMAR e que agora este centro representa uma competência regional, vamos dizer assim, onde nós vamos jogar este papel importante no quadro da segurança marítima”, disse Janine Lélis.
O Centro de Operações de Segurança Marítima (COSMAR), recorde-se, foi inaugurado em 2010 e veio reforças a articulação entre entidades nacionais.
*Com André Amaral
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1097 de 7 de Dezembro de 2022.