Olhando para 2016, o embate autárquico teve outro sabor para a líder do maior partido da oposição. Pois, nessas eleições, após conhecer os resultados colocou o lugar à disposição, havia sido a grande derrotada quando venceu apenas duas câmaras, Mosteiros e Santa Cruz que, aliás, conseguiu manter desta vez.
Segundo os resultados provisórios divulgados no site oficial sobre as eleições autárquicas (www.eleicoes.cv), o PAICV venceu 8 das 22 câmaras municipais (36,4%), mais seis do que nas eleições anteriores. O MpD, que venceu em 14 câmaras, conseguiu eleger, ainda de acordo com os dados provisórios, 81 vereadores, enquanto o PAICV 39 e a União Cabo-Verdiana Independente e Democrática (UCID) 3, todos em São Vicente.
Já no que toca às Assembleias Municipais, o MpD, que venceu 15, elegeu 170 deputados municipais, o PAICV 132, seguindo a UCID com 9, a Alternativa Ribeira Grande (ARG) com 3, assim como o Partido Popular (na Boa Vista) e o Grupo Independente de Desenvolvimento do Tarrafal de São Nicolau (GRIDT). O Santa Catarina (de Santiago) Acima de Tudo (SAT) e o Sociedade em Acção para a Liberdade (SAL) (na ilha do Sal) elegeram dois deputados cada nos seus respectivos concelhos. O Movimento Independente Más Soncent (MIMS) (São Vicente) e o Movimento Independente Tarrafal de Santiago (MIT) conseguiram um deputado cada.
Os resultados provisórios apontam que 136.800 (41,6%) eleitores abstiveram-se de votar para as Câmaras Municipais, 3.412 (1,8%) votaram em branco, enquanto se registou 2.631 (1,4%) votos nulos. Para as Assembleias Municipais 136.749 (41,7%) dos eleitores não votaram, 3.521 (1,8%) votaram em branco e foram considerados 2.773 (1,4%) votos nulos.
Janira Hopfer Almada satisfeita
Nos primeiros momentos da vitória, a partir da sede nacional do partido, a presidente do PAICV agradeceu a confiança depositada nas suas candidaturas em vários municípios durante toda a campanha eleitoral, em absorver as propostas dos tambarinas.
Na mesma ocasião, Janira Hopffer Almada sublinhou a importância da vitória da candidatura do PAICV em oito câmaras municipais, entre as quais, a da capital do país (Praia), mas também de São Filipe (Fogo) que, conforme disse, sempre foi muito simbólica para o PAICV, a da Boa Vista, do Tarrafal e de São Domingos, que nunca foram governadas pelo PAICV, e a vitória do seu partido na Ribeira Grande de Santiago pela primeira vez.
Janira Hopffer Almada endereçou saudações aos munícipes dos Mosteiros e de Santa Cruz por renovarem a confiança nos projectos do PAICV, liderados por Fábio Vieira e Carlos Silva, respectivamente, realçando o facto do maior adversário, o MpD, ter perdido a maioria absoluta em duas câmaras importantes, São Vicente e Santa Catarina de Santiago, baseando nos resultados provisórios.
Ainda na mesma ocasião, Janira Hopffer Almada escusou-se a responder a perguntas dos jornalistas que queriam saber se a vitória de Francisco Carvalho na Praia representava uma possível ameaça à sua liderança, tendo em conta as próximas eleições legislativas que deverão acontecer dentro de seis meses.
MpD mantém estatuto
Mesmo perdendo quatro câmaras, o MpD conservou o seu estatuto de maior partido autárquico cabo-verdiano. Manteve o poder nas câmaras de São Vicente, Santa Catarina, Maio, Brava, Santa Catarina do Fogo, São Lourenço dos Órgãos, São Salvador do Mundo, São Miguel, Sal, Tarrafal de São Nicolau, Ribeira Grande, Paul e Porto Novo. Recuperou ainda Ribeira Brava de São Nicolau, que antes era governado pelo grupo independente GIRB, liderado por Pedro Morais, que não se recandidatou. Entretanto, por outro lado, viu escapar Praia, São Domingos, Ribeira Grande de Santiago, São Filipe e Tarrafal.
Na ilha da Boavista, que era governado pelo grupo independente BASTA, cujo líder, José Luís Santos, foi desta vez o escolhido como candidato do MpD, a vitória na Câmara Municipal foi para o PAICV, enquanto que o MpD ficou com a presidência da Assembleia Municipal.
Segundo os resultados aos 97,5% das mesas de voto, a abstenção chega perto dos 42%, até agora as mais elevadas na história das oito eleições municipais realizadas no País.
Praia, a grande surpresa
A derrota do Movimento para a Democracia na Praia foi a grande surpresa destas eleições autárquicas. Reagindo na noite eleitoral, o presidente da Câmara Municipal da Praia e candidato derrotado, Óscar Santos, mostrou-se desapontado. “Não era o resultado que estávamos à espera, mas temos ainda até amanhã para ver o que aconteceu, esperar pelo apuramento geral, mas em qualquer das circunstâncias nós aceitamos os resultados. A democracia é assim mesmo quando o povo fala tem sempre razão”, afirmou.
Óscar Santos vai ser substituído na Câmara Municipal da Praia por Francisco Carvalho, quadro do Ministério dos Negócios Estrangeiros que já foi Director Geral das Comunidades. Este dedicou a vitória a todos os munícipes, sublinhando que “esta é uma vitória da Praia”.
“Nós reafirmamos que tudo o que falamos ao longo deste período de campanha durante as duas semanas é para cumprirmos num espírito de alegria porque queremos trazer uma fórmula nova de fazer política aqui na Praia, junto dos praienses, de forma inclusiva”, reiterou.
O PAICV, na voz de Francisco Carvalho, asseverou que, a partir de agora, o olhar vai ser direcionada a todos os praienses, independentemente das suas vontades e posições.
“Desde o início estivemos seguros que íamos ganhar a câmara da Praia porque percebemos que os praienses estavam cansados de uma câmara que persegue e maltrata as pessoas, de uma câmara que não dialoga”, enfatizou.
O candidato do PAICV agradeceu a todos os praienses e aqueles que fizeram parte da equipa envolvida rumo a esta vitória.
Na sede do partido o ambiente era de festa com centenas de apoiantes que para lá se dirigiram para saudar o vencedor.
Ainda na Praia, na terceira posição, embora sem ter elegido nenhum vereador ou deputado, destacou-se o grupo independente “Liderança União Trabalho e Amor” (L.U.T.A), liderado por Carlos Lopes (o músico Romeu di Lurdes) com 866 (2,3%), ultrapassando outros grupos independente que, a priori, se apresentavam como mais fortes, incluindo a UCID e o PP, que são partidos já conhecidos nas andanças autárquicas na capital do país.
“Quando fazemos com e por amor, ou ganhamos ou aprendemos, nunca perdemos. Depois de tantos dias de LUTA, ainda tenho forças para dizer carinhosamente: Muito Obrigado Praia pela oportunidade, recepção e confiança demonstradas nesta primeira fase e um muito obrigado aos jovens fortes, cientes e conscientes que acreditaram e estiveram do meu lado. Agora é seguir com muito mais afinco e um compromisso social e solidário, pessoas primeiro, vou dar tudo de mim, como sempre dei, e não estou sozinho, o Povo está comigo”, escreveu Carlos Lopes na página oficial da sua candidatura na rede social Facebook.
“Excesso de confiança”
Reagindo, o líder do MpD disse esta segunda-feira que o “excesso de confiança” ditou a derrota do seu partido no mais importante município do País e prometeu que, enquanto primeiro-ministro, não fará “diferenciação nem discriminação negativa”.
“A leitura que fazemos é que a democracia funcionou e, quando é assim, temos que respeitar os resultados”, indicou Correia e Silva, que prometeu fazer “a melhor leitura” sobre a derrota na Praia que, segundo ele, foi uma “surpresa” e “não era esperado por ninguém”.
Ulisses Correia afirmou ainda que o seu partido irá fazer uma “avaliação tranquila” e saber exactamente o que se passou, quais são as motivações e começar já a preparar a “nova fase”.
Correia e Silva garantiu ainda continuar “focado na governação porque é necessário para o País nesta fase da pandemia [da COVID-19] e preparar o partido para os próximos embates eleitorais, particularmente as legislativas”.
Instado sobre as perspectivas para as legislativas que se realizam daqui a seis meses, tendo em conta os resultados na Praia, o presidente do MpD esclareceu que se trata de duas “eleições diferentes”.
“As eleições autárquicas e as legislativas são totalmente diferentes”, admitiu, explicando que as eleições locais “representam uma vontade”, em que os eleitores de um círculo não votam nos outros e os “resultados são a nível local”.
Para Ulisses Correia e Silva, os resultados obtidos nas oitavas eleições autárquicas vão ser uma “motivação adicional” para o MpD “reforçar” a sua acção política.
Perguntado se a abstenção terá beneficiado o PAICV, apontou que foi “elevada, particularmente na Praia” e que seria desejável que a maior parte dos eleitores fosse às urnas votar.
“É preciso também ter em conta que estamos num contexto extremamente difícil. É pela primeira vez que em Cabo Verde se realizam eleições num contexto [de pandemia de covid] que impõe uma série de restrições às pessoas”, precisou, acrescentando que esta situação pode ter indisponibilizado as pessoas a saírem de casa para ir votar.
Na sua perspectiva, o partido “continua forte e a ser o maior partido autárquico e de confiança dos cabo-verdianos”.
Considera, por outro lado, que há a necessidade de o MpD reforçar a sua acção política junto dos seus militantes e simpatizantes, em ordem ao “combate político forte” que é preciso que o partido continue a dar.
Para esta votação estavam inscritos 337.083 eleitores, distribuídos por 864 mesas de voto em todo o arquipélago, um aumento de 34.073 eleitores (+11%) face às eleições municipais anteriores, em 2016.
Nas eleições deste domingo concorreram 65 listas às Assembleias Municipais e 64 às Câmaras Municipais, das quais 53 de quatro partidos políticos e 12 de grupos de cidadãos, segundo dados da Comissão Nacional de Eleições.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 987 de 28 de Outubro de 2020.