"Os problemas estruturais da justiça cabo-verdiana continuam, no essencial, exactamente os mesmos, com pequenos avanços, recuos e sem conquistas substanciais, marcantes ou de ruptura com o status quo", disse o deputado do PAICV, Démis Almeida, durante a sua declaração política com base nos relatórios do Conselho Superior da Magistratura Judicial e do Ministério Público referentes ao ano judicial 2022/2023.
Démis Lobo citou preocupações específicas, incluindo o aumento de processos entrados nos tribunais em comparação com o ano anterior, um número crescente de processos tramitados e uma diminuição dos processos decididos.
Conforme argumentou, isso resultou em um aumento dos processos pendentes, afectando negativamente a capacidade da justiça em atender às necessidades dos cidadãos.
O deputado também apontou para a alta litigiosidade, especialmente em crimes contra a propriedade, integridade física, liberdade das pessoas e contra a família, ressaltando que mais de 50% dos processos judiciais referem-se a processos criminais.
O PAICV enfatizou a necessidade de investir em políticas públicas de justiça eficazes, medidas estruturantes, prevenção primária, controle da insegurança e criminalidade, reinserção social efetiva nas cadeias e mecanismos não contenciosos de resolução de conflitos.
Também referiu à falta de recursos humanos de justiça como um factor que contribui para a morosidade e as pendências processuais.
Além disso, Démis Lobo expressou preocupação com o atraso na implementação do Sistema de Informação da Justiça (SIJ) e a falta de cooperação institucional entre o Ministério Público e as forças policiais, o que acredita prejudicar a celeridade da tramitação de processos nas Procuradorias.
O deputado reforçou necessário soluções estruturantes para tornar a justiça acessível, célere e de qualidade.
MpD destaca progressos
Da bancada do MpD, o deputado João Gomes enfatizou a importância do debate anual sobre a justiça em Cabo Verde, destacando o papel constitucional e regimental que obriga os órgãos parlamentares a se reunirem para avaliar a situação da justiça no país.
João Gomes também sublinhou a responsabilidade tripartida no sistema de justiça, envolvendo o Governo, a Assembleia Nacional e as Magistraturas, através dos Conselhos Superiores.
O deputado do MpD observou que os indicadores de justiça no final do ano judicial 2022/2023 mostram melhorias em relação aos anos anteriores.
Alguns dos destaques incluem a redução de 5,8% no número de processos-crime registrados ao nível nacional, um aumento de 4,9% no número de processos-crime encerrados e um número significativo de processos julgados. Além disso, os valores de referência processual foram ultrapassados em 44,8%, demonstrando resultados positivos.
João Gomes também ressaltou a diminuição da pendência nacional em 2,3%, comparando-a com o ano judicial de 2021/2022 e realçou que, apesar de ainda haver desafios a superar, houve melhorias consideráveis na resolução de processos judiciais.
O deputado advogou que a morosidade da justiça está associada ao aumento do acesso à justiça e à preferência dos cabo-verdianos por instâncias judiciais em vez de mecanismos de resolução de conflitos.
No entanto, mencionou um Plano Nacional de Redução de Pendências, elaborado em parceria com os Conselhos Superiores, que visa melhorar o sistema judicial. Este plano inclui medidas como a qualificação e capacitação de recursos humanos, modernização dos serviços, reforma legislativa, aumento de recursos humanos e a implementação do Sistema de Informação da Justiça (SIJ).
João Gomes destacou ainda a criação do Instituto Nacional de Medicina Legal, a instalação do Campus da Justiça em Palmarejo e o reforço da aposta na humanização do sistema penitenciário e reinserção social.
“Não atingimos ainda o patamar de satisfação da Justiça que almejamos. Temos muito trabalho pela frente. Porém, a realidade da Justiça hoje, é diferente para melhor da de ontem e, estamos confiantes, que a de amanhã, muito melhor será”, reconheceu.
UCID pede uma justiça mais célere
Já o deputado da UCID, António Monteiro, chamou a atenção para a necessidade de uma justiça “mais célere e eficiente” e união entre os actores da sociedade civil na criação de soluções visando aprimorar o sistema da Justiça.
A UCID, salientou, avalia criticamente o estado da Justiça e ao mesmo tempo reafirma o seu compromisso e a sua determinação em dar o seu contributo no aprimoramento do sistema judicial em Cabo Verde, lembrando que os cabo-verdianos almejam uma justiça melhor.
“A Justiça não é apenas a espinha dorsal do nosso sistema democrático. Ela é o compromisso da República de que todos os cidadãos serão tratados de maneira justa e equitativa, independentemente de quem sejam, de onde venham ou do que tenham. A imparcialidade deve a todo momento e em que circunstâncias for manter-se como um dos pilares fundamentais da Justiça”, afirmou, considerando que ninguém deve ser vítima do sistema e todos tem o direito a julgamento “justo e imparcial”.
António Monteiro asseverou que apesar da redução do número de processos pendentes, a morosidade dos tribunais ainda continua uma questão merecedora de atenção, frisando que o arrastar de processos por ano, “chegando muitos deles a prescrever”, afigura-se “sonegação da justiça”.
“Precisamos todos nos unir em busca de outras soluções para aprimorarmos o nosso sistema da Justiça. Precisamos garantir que a Justiça seja verdadeiramente cega, imparcial e acessível a todos os cidadãos”, afiançou.