O renovado CNAD é um projecto com características únicas. Passemos em retrospectiva o caminho até à inauguração…
Na realidade, foi um caminho relativamente longo mas bastante desafiante e onde fomos concluindo as fases que estavam previstas. Quando entrei como director do CNAD, em 2015, a minha perspectiva, enquanto gestor e programador cultural, era desenhar um projecto que pudesse trazer ao CNAD a força que já tinha tido no passado. Então, a primeira coisa foi estudar tudo aquilo que tinha sido feito. Tivemos algum tempo no acervo, a fazer essa investigação. O Manuel Figueira já falava da questão de museus, da formação e de todas as questões. A partir desta base, desta visão que não foi implementada, o que poderíamos fazer? Daqui nasceu a necessidade de requalificar e ampliar o CNAD, com o objectivo de ser um equipamento cultural de referência, sustentável até determinado ponto, com projectos museológicos, galerias, loja, centro de investigação e pesquisa, centro de formação, espaço de residência e que pudesse também servir de base para depois ampliar às outras ilhas, a partir do projecto LEAAD (Laboratório Experimental de Arte, Artesanato e Design) e do projecto de rede de lojas. A partir desta visão, conhecemos o arquitecto Moreno Castellano, com quem falámos dessa vontade, dessa utopia. Ele, utópico também, com vontade de propor, trouxe-nos este projecto visionário, do ponto de vista da fachada e da distribuição do espaço. Chega 2016, a mudança do governo, e nós apresentámos essa proposta, que foi logo acolhida pelo ministro da Cultura, que propôs um encontro com o Primeiro-Ministro. Em 2019, iniciámos as obras. Com muito trabalho, não obstante a pandemia, a guerra, tivemos todas as condições para inaugurar com toda a qualidade, nessa visão projectada lá atrás.
O CNAD nasce com a ideia de como serão os próximos meses?
Um equipamento construído é um espaço morto, o que lhe dá vida é aquilo que pões lá dentro. Mais do que ter um edifício, é ter um projecto e a sua visão para o futuro. Cada galeria levará três grandes exposições por ano. Vamos abordar os nossos artistas e artistas internacionais de diferentes áreas, arte, artesanato e design. Neste momento, já estou a trabalhar na programação dos próximos dois anos. É um trabalho que tem sempre uma visão a médio e longo prazo. Não podemos pensar o equipamento cultural em ciclos de seis meses, pois não funciona, não ganha corpo, não ganha estrutura.
No vosso trabalho há uma preocupação em colocar em diálogo diferentes formas de expressão artística…
Entendemos que do cruzamento de linguagens nasce sempre uma coisa muito mais rica. Trabalhamos de forma muito vincada essa questão de o artesanato dialogar com o design numa perspectiva linear, sem sobreposições. O que vai fazer com que seja mais ou menos evidenciado, do ponto de vista estético, é a capacidade das pessoas que estão com a mão e a cabeça naquele conteúdo. Não gostamos muito de trabalhar a nível de graus, de posicionamento entre uma coisa e outra.
Um projecto como este cria à sua volta uma série de dinâmicas. O que se espera que surja daqui?
Mais do que um catalisador, o meu desejo, enquanto cidadão, é que o CNAD seja um influenciador. Que um jovem olhe para o CNAD, para o que está a ser feito, e se inspire a fazer. Quero convidar jovens e menos jovens e desafia-los nos campos de curadoria, da programação… A minha visão é que o CNAD inspire uma nova dinâmica a nível criativo. Não quero que seja uma árvore que chama tudo para si. Quero que seja um polo que influencie e crie espaços para que o Centro Cultural do Mindelo esteja programado, que o Zero Point Art esteja programado, que a ALAIM esteja programada e que os outros que virão estejam programados. Uma cidade vive de uma dinâmica, não de uma centralidade. Naturalmente que o CNAD, pela sua dimensão e propostas, vai abrindo campo para outras coisas. Temos explorado isso na URDI e tem funcionado muito bem. Agora temos um equipamento cultural que nos permite ir cada vez mais fundo, não só em São Vicente.
Podemos esperar que o CNAD contribua para a projecção internacional de Cabo Verde e o estabelecimento de diálogos para lá do país?
O pensamento no sector das artes tem de ser sempre expansivo e universalista. A arte, quando é boa em Cabo Verde, é boa na China ou em qualquer parte do mundo. Não é à toa que, para a abertura, trabalhámos a curadoria com a Adélia Borges, que é uma curadora brasileira que trabalha com o mundo. Também temos que trabalhar com artistas internacionais, porque temos que ter uma programação diversificada e pôr à disposição do nosso público a possibilidade de se confrontar com outras coisas. Não podemos almejar trazer um artista de renome se não tivermos um espaço onde acolhê-lo de forma digna. O CNAD tem todas as condições e foi desenhado para isso. Esse é o caminho que estamos a fazer.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1079 de 3 de Agosto de 2022.