OE 2024 “é realista, ambicioso e focado naquilo que é essencial”

PorJorge Montezinho,11 nov 2023 8:25

Olavo Correia, Ministro das Finanças
Olavo Correia, Ministro das Finanças

O Orçamento de Estado para o próximo ano (OE2024) vai subir ao parlamento. Segundo o Ministro das Finanças, está projectado para responder às necessidades emergenciais e focado para impulsionar a dinâmica das reformas das actividades económicas. Tem como principais pilares a procura pela estabilidade económica, a promoção de reformas e investimentos para criar empregos e o compromisso com a protecção dos mais vulneráveis. É também um Orçamento que quer aumentar o potencial de crescimento económico e que procura garantir uma economia mais aberta ao mundo através do turismo sustentável, mais verde, mais azul, mais digital, mais sustentável, mais inteligente, como explica Olavo Correia nesta entrevista ao Expresso das Ilhas.

Este é um orçamento com 3 objectivos: estabilidade; reformas, investimento e emprego e proteger os mais vulneráveis. Foi difícil chegar a estes objectivos?

Eu não diria difícil, mas é sempre desafiante. Porque, quando se começa a elaborar o Orçamento do Estado, temos de ter a perspectiva que ninguém tem todas as soluções para todos os desafios. É preciso trabalhar para se construir as soluções. Em segundo lugar, que o orçamento não é elástico, no sentido de que não pode chegar a todos ao mesmo tempo, com a mesma profundidade e com a mesma intensidade. Temos de fazer escolhas e opções. E em terceiro lugar, que o Orçamento, mais do que um instrumento anual, um exercício de escolhas anuais, é parte de um objetivo maior, no tempo, mas também na profundidade, que tem a ver com a nossa ambição. A ambição de desenvolver Cabo Verde. Por isso é que, no quadro desta ambição de fazermos de Cabo Verde um país desenvolvido, escolhemos as três prioridades, que são fundamentais para o nosso futuro colectivo.

Um farol de estabilidade num mundo ainda instável.

Em face da instabilidade com que o mundo está confrontado hoje temos de responder com estabilidade do plano interno, estabilidade a três níveis; estabilidade de rendimento, estabilidade monetária e estabilidade macroeconómica. Por outro lado, é muito importante e indispensável que a estabilidade não seja um fim em si, mas um objetivo. Estabilizar para podermos acelerar o crescimento económico através das reformas, para podermos fazer crescer mais a economia. Por isso é que Cabo Verde cresce hoje à volta 5% e que o nosso potencial de crescimento está à volta desses 5%. O grande desafio que temos de colocar à nossa frente é, como pode a economia de Cabo Verde crescer, aumentar o seu potencial de crescimento de 5% para 10%, ou seja, duplicar o nosso PIB potencial.

Como?

Reformando a economia. Por isso é que o nosso objetivo em relação este orçamento é reformar a economia, é investir, é acelerar a dinâmica de crescimento económico, através das reformas profundas nos mais diversos sectores. Nomeadamente, no sector energético, tendo em conta que temos uma energia que é muito cara, que é muito poluente, mas também que é muito dependente de fontes externas. Ao nível das conectividades e mobilidades, temos de melhorar de forma substancial o nível de serviço dos transportes aéreos, transportes marítimos, transportes terrestres, mas também o nível da conectividade tecnológica e digital, para conectarmos Cabo Verde consigo próprio e com o mundo. Temos estado a reformar esses sectores, estamos melhor do que estávamos em 2016, mas também estamos conscientes que precisamos melhorar ainda mais o nível do serviço para que possamos atingir a excelência, ao nível dos transportes aéreos, transportes marítimos, mas também da conectividade tecnológica. Daí a transição digital, ou revolução digital, seja na governança pública, central, municipal, mas também colocar o digital ao serviço de aceleração da dinâmica económica de Cabo Verde, isso é fundamental para o nosso futuro coletivo. Depois, o capital humano, precisamos de um capital humano com mais qualidade para poder enfrentar o mercado interno e o mercado externo e de um sistema de ensino e de educação profissional que esteja ancorado em três premissas fundamentais. Primeiro, o acesso de todos à educação e à formação. Em segundo, a relevância, formar e educar para o mercado de trabalho, para a empregabilidade e para os valores. E em terceiro, a qualidade do sistema de ensino e de formação. Temos que ter um sistema de ensino e de formação que seja comparado com a excelência a nível mundial. Não apenas estarmos melhor do que estávamos ontem ou no passado, mas estarmos cientes dos desafios que temos de vencer. Depois temos que ter um sector privado que tem de ser empoderado, o sector privado nacional, a nossa diáspora quer investir, mas precisamos também da melhoria do ambiente de negócios para captar mais investimentos estrangeiros, porque são os investimentos que criam empregos. E o emprego é, em última instância, o resultado final da nossa política pública. Porque é através do emprego é que as pessoas têm acesso ao rendimento. E é com o rendimento que as pessoas podem ser pessoas felizes, pessoas dignas, pessoas autónomas, pessoas independentes do poder central, do poder local. Portanto, estabilidade e reformas para promover o investimento, e é o investimento e as empresas que depois criam empregos, e são os empregos que depois geram os rendimentos. E em último lugar, as instituições. Nós precisamos combater a burocracia, ter instituições proactivas, empoderadas, focadas no serviço público, instituições que sejam capazes de implementar políticas públicas e de converter a visão política em resultados concretos para os nossos cidadãos. Temos de mudar o chip. E este orçamento tem de servir também para a mudança do chip. Nós precisamos de governar com mais escala, mais volume em termos de impacto. Precisamos de governar com maior celeridade, não só fazer bem, mas fazer bem com a escala e no tempo certo. Tudo o que estamos a fazer é para impactar a vida dos cidadãos. Para terem acesso à água, à energia, ao saneamento, acesso ao emprego, a educação, à saúde de qualidade, para poderem ser cidadãos dignos.

A dignidade passa também pela protecção de quem menos tem.

A proteção dos mais pobres, a proteção daqueles que estão a ser mais impactados por este contexto incerto mundial, por este contexto geopolítico instável, mas também por este contexto em que estamos a confrontar-nos com uma aceleração do aumento de preços, dos bens energéticos, etc. Por isso também, a nossa ambição, que é uma ambição corajosa, audaciosa, arriscada até em certa medida, mas vale a pena correr esse risco, que é de eliminar a pobreza extrema no horizonte de 2026. E para isso temos um programa forte. Nos últimos sete anos, duplicamos a dimensão do Estado Social. Passamos de 4 milhões de contos para mais de 9 milhões de contos. Nenhum governo antes fez isto. É claro que o contexto da pandemia obrigou a que o Estado Social aumentasse o seu cuidado e intervenção, mas, independentemente disso, conseguimos aumentar a dimensão do Estado Social. Com esses montantes, criamos o Regulamento Social de Inclusão, o Programa de Inclusão Produtiva, introduzimos a Tarifa Social para a Energia e Água, introduzimos o IVA Moderado para a Energia e Água, introduzimos a isenção de propinas para o ensino básico e ensino secundário, alargámos a taxa moderadora de saúde, aumentámos a pensão social, o regime não contributivo, duplicámos a pensão social para os cabo-verdianos que vivem na diáspora africana e criámos uma norma que diz hoje que qualquer cidadão cabo-verdiano que reúna os requisitos legais para ter acesso a uma pensão social de regime não contributivo vai ter este direito.

Se olharmos para o cenário macro deste Orçamento de Estado, prevê-se um crescimento de 4,7%, uma taxa de desemprego de 8,2%, dívida pública 110,2% e uma inflação de 2,8%. Diria que destes números, os mais difíceis de alcançar serão os da inflação e recordo também que o próprio Conselho de Finanças Públicas disse que se calhar esta meta é demasiado ambiciosa.

Quando o Governo fixa uma meta de inflação, não é apenas uma previsão, é mais do que uma previsão. Por isso, a perspectiva do Governo não é igual à perspectiva do Conselho de Finanças Públicas, como acontece em todas as paragens. O Governo, quando fixa uma meta, é para ser alcançada, é um objetivo. É mais do que uma previsão. É uma instrução clara ao Banco Central. Portanto, todos temos de trabalhar ao nível das políticas monetárias, orçamentais e cambiais, para que atinjamos esta meta. Mais do que uma previsão, esta meta é um objetivo, é um target para ser atingido. E estou convencido que, se não houver muita perturbação no plano externo, estaremos em condições de trabalhar no plano interno para garantirmos que esta meta possa ser atingida. Mas não nos podemos contentar com os indicadores macroeconómicos. Os resultados das avaliações que foram feitas pelo Fundo Monetário Internacional, na semana passada, são altamente satisfatórios. Portanto, aquilo que Cabo Verde tem feito em matéria de crescimento económico, em matéria de evolução de défice, em matéria de redução da dívida pública, em matéria da capacidade de arrecadação de impostos e também na inflação têm sido muito positivos esses resultados. Mas, é sempre um equilíbrio precário, é sempre um equilíbrio no fio da navalha, qualquer perturbação interna ou no plano externo pode pôr em causa estes equilíbrios. Temos de olhar para isto com responsabilidade. Temos riscos internos, temos riscos externos, e o quadro económico é sempre muito precário, muito instável, por isso, temos que nos esforçar todos os dias, todos os anos, para que possamos consolidar o quadro e manter a estabilidade macroeconómica. É uma luta quotidiana, diária, semanal, mensal, trimestral, semestral, anual, para mantermos a estabilidade macroeconómica.

Qual é o grande desafio para manter essa estabilidade macroeconómica?

Nos próximos 20 anos, África vai precisar de criar cerca de 450 milhões de postos de trabalho para os seus jovens. Mas, de acordo com os dados que temos, a economia formal só será capaz de criar cerca de 100 milhões de postos de trabalho. Temos um gap de cerca de 350 milhões de postos de trabalho para os jovens africanos. Isso significa frustrações, dissensões, migrações, instabilidade, é quase uma bomba atómica para o continente africano, que pode explodir a qualquer momento. Em Cabo Verde também temos que criar, por ano, entre 1.700 e 2.000 empregos para podermos combater a taxa de desemprego jovem em Cabo Verde e mantermos o quadro de estabilidade em que estaremos perto da taxa de desemprego natural. Para que isso aconteça, não podemos continuar a crescer a 4,5% ou 5%. Como o continente africano não pode continuar a crescer a 3% ou 4%. O que temos de fazer é trabalhar para duplicarmos o potencial de crescimento da nossa economia. E só assim estaremos em condições de criar empregos perenes, empregos estáveis, que possam criar oportunidades de rendimentos para os nossos jovens. O desafio que temos é, em cima do estabilidade macroeconómica, reformar a economia para duplicarmos o nosso nível de crescimento potencial em Cabo Verde, para que a economia possa crescer a uma taxa perto de dois dígitos e dar resposta às demandas de emprego e de rendimento que são colocadas na economia e na sociedade de Cabo Verde.

Não são objetivos demasiado ambiciosos?

Por isso é que é importante que este orçamento olhe para aquilo que eu chamo de mudança de cultura. Essa mudança de cultura que este orçamento tem de imprimir tem a ver com o sentido de urgência. Não é ansiedade, é urgência. Urgência em desenvolvermos políticas públicas, em garantirmos resultados, em fazermos as coisas acontecerem em todos os domínios de atividade económica e social. Não fazer amanhã o que pode ser feito hoje e fazer as coisas certas no tempo certo. Em segundo lugar, é fundamental que tenhamos uma coligação de lideranças para fazermos acontecer. Porque não é um líder, ou um único líder, é um sistema que tem de funcionar de forma alinhada. E depois é fundamental que tenhamos uma cultura de resultado, uma cultura de avaliação, uma cultura de seguimento para podermos governar, aí está, com a escala, podemos governar com velocidade, com celeridade, com tempestividade para produzir impacto nos cidadãos. E o impacto mais importante que podemos provocar na sociedade e nos cidadãos tem a ver com a nossa capacidade de geração de empregos qualificados e bem remunerados para os nossos jovens, para as nossas mulheres, mas também para os nossos concidadãos. É dentro dessa perspectiva que estamos a encaixar o Orçamento do Estado para 2024. Por isso é que temos medidas impactantes ao nível da estabilização dos rendimentos e do aumento dos rendimentos, temos medidas impactantes ao nível das reformas nos mais diversos sectores, temos medidas impactantes ao nível dos investimentos públicos e privados nos mais diversos domínios, e também medidas para a proteção dos mais desfavorecidos e daqueles que precisam de uma proteção ativa da parte da coletividade. Estamos a falar de um Orçamento à volta de 86 milhões de contos. Se nós incluirmos mais cerca de 26 milhões de contos de investimentos que irão ser aportados pelas empresas públicas, teremos um Orçamento ligeiramente acima de um bilião de euros, que já demonstra uma dimensão importante ao nível do funcionamento da economia cabo-verdiana.

Falou de ter que se trabalhar sempre no fio da navalha. Há folga, ou melhor, este é um orçamento capaz de lidar também com eventuais crises económicas, até porque a incerteza ainda não passou?

Esses riscos estão devidamente avaliados e quantificados, em cerca de 8 milhões de contos, e, ao nível da execução orçamental, levaremos em devida conta todos esses riscos internos e externos, e teremos uma equipa que estará a geri-los de forma permanente e de forma intensa. Os riscos existem sempre, nós é que temos de ter a capacidade para os gerir. É claro que temos de gerir o orçamento com alguma folga. Durante o próximo ano, até para aumentarmos a nossa capacidade em matéria de execução de todo o nosso Programa de Investimentos Públicos, vamos tentar eliminar tudo aquilo que tem a ver com as cativações, portanto, vamos criar um espaço para que os Ministérios possam executar de forma mais célere os seus orçamentos, e temos um Plano de Investimentos à volta de 59 milhões de contos já garantidos para os próximos 3 anos, em que 2024 vai ser o ano de charneira em matéria de execução, mas que depois vai continuar até 2026. É um portfólio muito significativo de investimento, que vai abranger todas as ilhas e todos os sectores, a saúde, com o envelope forte, a educação, as conectividades, a requalificação urbana, a água, o saneamento, a energia, a transição digital, e tudo isso vai permitir-nos criar as condições para que o investimento público seja catalisador do investimento privado, ou seja, o investimento público não tem apenas o objetivo exclusivo de ser investimento público, mas também de capitalizar, catalisar, impulsionar o investimento privado. O que temos de fazer para ganharmos folga tem a ver com a nossa capacidade em matéria de arrecadação de recursos endógenos. Hoje estamos a arrecadar cerca de 19% de impostos em percentagem do PIB, mas nós temos capacidade e folga para ir muito acima dos 20%. Como? Racionalizando incentivos fiscais, combatendo a fuga, fraude e evasão fiscais, e aumentando a base tributária. Do ponto de vista da gestão dos riscos, penso que o importante não é termos medo dos riscos, mas estamos cientes dos riscos, e preparar toda uma máquina ao nível da gestão para os antecipar, os mitigar, os gerir, caso eles venham a acontecer, seja no plano interno como também, e particularmente, no plano externo.

Em relação a algumas das medidas novas, qual consideraria a principal? O aumento do salário mínimo, o subsídio de desemprego para os trabalhadores domésticos, ou o fim da precariedade na administração pública?

Tudo aquilo que estamos a tratar, em matéria de rendimentos, é importante. Desde logo, temos um conjunto de medidas para estabilizar os rendimentos, nomeadamente ao nível da remuneração daqueles que intervêm na máquina pública. Estamos a propor uma atualização salarial de 3% para o quadro comum e também a implementação daquilo que chamamos de planos de cargos, funções e remunerações. No final, isso vai dar um aumento salarial muito importante e muito relevante para aqueles que estão a trabalhar ao abrigo do quadro comum na administração pública. O quadro especial tem tido aumentos importantes nos últimos anos, com alterações nos estatutos, mas também com promoções e classificações. Só para dar um número, em 2015, a massa salarial era de cerca de 17,5 milhões de contos. Em 2024, a massa salarial será de cerca de 25 milhões de contos. Para os professores, temos algumas medidas também impactantes. Temos cerca de 100 mil contos para resolver algumas disfunções que existem ainda ao nível das carreiras. Temos cerca de 300 mil contos para eliminar todas as pendências que ainda existem no que tange ao relacionamento entre o Governo e os professores, tendo em conta as promoções, progressões e subsídios de carga horária. E está aberto um processo de revisão dos estatutos da carreira docente, que também, seguramente, vai acontecer em 2024, e provocará de novo um aumento salarial. Mas também o aumento do salário mínimo, que vai passar para 15 mil escudos para o setor privado e para 16 mil escudos para o sector público, e há compromisso de, no próximo ano orçamental, 2025, possamos atingir o mínimo de 17 mil escudos. Isso significa, em sete anos, aumentar o salário mínimo em mais de 50%. Ao mesmo tempo estamos a aumentar o número de beneficiários com a pensão social, do regime contributivo, que vai atingir cerca de 26 mil beneficiários, que vão ser contemplados. E para além disso, vamos aumentar as pensões de forma escalonada, 2,8%, 2%, 1%, em função do nível de pensões, e vamos também eliminar aquilo que chamamos de precariedade laboral ao nível da gestão pública. Temos muitos quadros que trabalham ao nível do Estado, que têm contrato precário, um ano, sem estabilidade, que não conseguem estabelecer vínculos financeiros com o sector bancário, porque não têm estabilidade, e vamos, durante o próximo ano, eliminar essa situação de precariedade ao nível do sector público. Mais, ao nível do rendimento social de inclusão, que em 2023 abrangia apenas 2.166 cabo-verdianos, para 2024 vamos atingir cerca de 9.200 cabo-verdianos. Em 2023 tínhamos previsto apenas 143 mil contos, em 2024 são mais 600 mil contos. São pessoas que não têm rendimento e que vão passar a ter rendimentos a partir de 2024.

Vou só fazer mais três questões. Como é que vai o Orçamento de Estado recuperar o poder de compra dos trabalhadores e proteger as famílias mais vulneráveis?

Ao atualizar os rendimentos para o quadro comum, implementar o plano de cargos, funções e remuneração, ao acabar com os precários na máquina pública, ao eliminar as pendências que ainda existem com determinadas classes, mas também ao aumentar o salário, ao aumentar as pensões, ao aumentar o salário mínimo. Ao implementar um sistema de acesso ao subsídio de desemprego para os trabalhadores domésticos, aumentando a cobertura em matéria de rendimento social de inclusão. Ao também manter a gratuidade ao nível do ensino básico e secundário, taxa moderadora de saúde, benefício social para a energia e a água, IVA reduzido para a energia e para a água, o acesso à formação profissional a custos baixíssimos e até com a isenção para todos aqueles que fazem parte de famílias que estão nas classes sociais do nível 1 e 2 do cadastro social único. Para além disso, o nosso plano de retoma, que prevê injetar cerca de 6 milhões de contos na economia cabo-verdiana, para quê? Para aumentar o investimento do sector privado, com o investimento do setor privado vamos aumentar o emprego gerado pelo sector privado e com o emprego vamos também aumentar o volume de rendimentos. Mas também através do investimento que vamos realizar ao nível público. E os investimentos públicos do Estado vão gerar empregos e esses empregos vão gerar rendimentos, investimentos na habitação, na requalificação urbana, no sector da energia, da água, do saneamento, ao nível do turismo, das estradas, da acessibilidade, das conetividades, da economia azul, das pescas, da agricultura. Portanto, em todos esses sectores vamos ter investimentos públicos que vão criar empregos e quando depois criarem condições para que privados invistam, vamos ter aqui uma duplicação de empregos. Por outro lado, a nossa política em matéria de estabilidade da moeda, estabilidade da taxa de juros, taxas de câmbio e taxas de inflação, são políticas que visam também a estabilização dos rendimentos. Portanto, quando falamos de estabilidade macroeconómica, é para estabilizar os rendimentos.

O senhor Primeiro-Ministro chamou a este orçamento um orçamento realista. Acha que esta é a melhor definição?

Eu acho que é realista, e é realista porque dá resposta às necessidades emergenciais, em matéria de proteção de rendimentos, em matéria de alargamento de rendimentos e em matéria de aumento de rendimentos em relação àqueles que hoje não têm rendimentos. Portanto, estamos a fazer face às emergências com sentido de responsabilidade e com sentido de realismo. Mas é também um orçamento ambicioso. Ambicioso porque estamos a ambicionar reformas. E depois é um orçamento que protege. Conseguimos, nos últimos anos, duplicar a dimensão do Estado Social, no fundo, revolucionámos a política social em Cabo Verde.

O que é que espera da discussão no Parlamento? Há abertura para aceitar as propostas da oposição?

Acho que o Orçamento do Estado para 2024, como eu disse, é mais do que um exercício de escolhas anuais, ou mais do que quanto é que tem um sector ou um ministério. Acho que a grande discussão que hoje temos de travar em Cabo Verde é: como podemos gerar mais empregos. E como fazer os empregos gerar mais rendimentos. Esse é o foco. Outra grande discussão: como podemos duplicar o potencial do nosso crescimento económico. Se olharmos para o crescimento do passado, é um bom nível de crescimento. Mas se olharmos para aquilo que é demanda em termos de emprego jovem, qualificado e bem remunerado, é um crescimento aquém daquilo que seria desejado. Para mim, o debate deve centrar-se à volta de como podemos introduzir políticas públicas, melhorar a governação, para duplicarmos o potencial de crescimento da nossa economia. E um segundo aspecto que parece importante discutirmos é a mudança da abordagem, a mudança do chip. Olharmos para este novo ciclo com base em novos paradigmas. Temos de mudar a velocidade na gestão das políticas públicas e na produção de resultado, temos de aumentar a escala e o volume em termos de intervenção e temos de governar com sentido de impacto para os nossos concidadãos. E para fazermos tudo isso, precisamos de garantir três coisas importantes. Um, sentido de urgência. Reconhecermos que temos urgência em fazer acontecer. E muitas vezes tenho a impressão que não temos esse sentido de urgência. Em segundo lugar, uma mudança do chip muito importante tem a ver com a coligação das lideranças. Ao nível do governo, do parlamento, do Presidente da República, das universidades, das empresas, das igrejas, da família, todos temos de ter esse sentido de coligação de lideranças para fazer acontecer. E ao mesmo tempo, garantirmos uma cultura de resultado, de seguimento e de avaliação para poder fazer acontecer, com base na transparência e na boa governação. Também, aqui um tema muito crítico, que temos de discutir sempre, quando propomos uma despesa, temos de ter uma receita correspondente. E essa receita não pode ser mais dívida, tem de ser mais imposto no plano interno, tem de ser mais uma mobilização de recursos endógenos, que temos de mobilizar para podermos garantir o financiamento do Estado, sem provocarmos uma crise macroeconómica. Resumindo, penso que estamos perante um orçamento realista, um orçamento ambicioso e um orçamento focado naquilo que é essencial, que é acelerar a dinâmica de crescimento económico, procurando a duplicação do PIB potencial. O que nós queremos é pessoas felizes. Pessoas felizes são pessoas independentes, autónomas. E pessoas independentes, autónomas, são pessoas que têm rendimentos permanentes e sólidos, mas com base no suor do seu esforço. Isso só é possível através de um emprego qualificado e de um emprego bem remunerado. Portanto, é disso que estamos a falar. É um orçamento ambicioso, otimista quanto necessário, tendo em conta este contexto, um orçamento reformista, mas um orçamento também muito focado e até obcecado com a criação de empregos e rendimento. É um orçamento que não consegue dar resposta a todo mundo, de igual forma, com a mesma profundidade, mas que olha para aquilo que é essencial, que são as pessoas e que procura protegê-las, criar-lhes oportunidades e dar-lhes condições para que sejam mais felizes.

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1145 de 8 de Novembro de 2023. 

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Autoria:Jorge Montezinho,11 nov 2023 8:25

Editado porEdisângela Tavares  em  28 abr 2024 23:28

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