Com muitas interrogações, chegou 2021. Perante os condicionamentos causados pela pandemia e o aumento exponencial de casos nalgumas das principais economias do mundo, a incerteza também é nota forte em Cabo Verde.
Pelo menos nisto, patrões e trabalhadores convergem na antevisão que fazem dos próximos doze meses: adivinham-se tempos difíceis.
Na semana passada, o governo confirmou o prolongamento do regime de lay-off até 31 de Março, agora para empresas com quebras iguais ou superiores a 70%, mas o presidente da Confederação Cabo-Verdiana de Sindicatos Livres (CCSL), José Manuel Vaz, teme uma onda de despedimentos.
“Há sinais relativamente a esse aspecto. Ninguém previa uma situação destas. Os empregadores foram bastante solidários, tiveram coragem de pegar nos seus ganhos e pagar aos trabalhadores em casa. Agora, é evidente que isto já demorou quase um ano, as empresas ressentem-se. Devemos agilizar, no sentido de, nas reuniões no Conselho de Concertação Social, analisarmos estes aspectos e vermos, com o Governo, soluções para evitarmos o desemprego em massa. Isso para nós é fundamental”, comenta.
Por seu lado, a secretária-geral da União Nacional dos Trabalhadores de Cabo Verde – Central Sindical (UNTC-CS), Joaquina Almeida, espera que o governo que resultar das próximas eleições legislativas tome medidas que permitam “reerguer o país”.
“2021 perspectiva-se de desafios enormes. Devido às dificuldades vividas ao longo da legislatura, e com a dificuldade maior de 2020, os trabalhadores estão prontos para a luta. Vamos, muito brevemente, reunir com todos os sindicatos para prepararmos uma forma de luta, para mostrar que os trabalhadores não estão satisfeitos com a forma como este governo não tem dado a atenção devida. Poderá ser uma simples passeata, uma manifestação, quiçá uma greve”, prevê.
A líder sindical quer ver na agenda uma aposta clara na redução da taxa de pobreza absoluta e relativa, a promoção da igualdade e justiça social e melhorias no sector dos transportes.
Contas
O Banco Mundial reviu em alta as previsões de crescimento da economia nacional, para 2021, apontando agora para um aumento do Produto Interno Bruto (PIB) na ordem dos 5,5%. O Presidente da República comentou a estimativa da instituição liderada por David Malpass, considerando-a “verdadeiramente reanimadora” e pedindo um “clima apaziguador” entre parceiros sociais.
Do lado das empresas, o optismo é moderado.
A Câmara de Comércio, Indústria e Serviços de Sotavento (CCISS), através do seu presidente, Jorge Spencer Lima, estima um primeiro semestre de abrandamento económico e “sofrimento”.
“Apesar de todos os esforços que vêm sendo feitos pelas autoridades, não há um controlo real da pandemia, neste momento, no país, daí que seja extremamente difícil prever o que quer que seja. Fala-se numa vacina, mas não temos noção de quando é que a vacina chegará a Cabo Verde e quando é que será aplicada em massa. Estamos a contar que antes de Julho não haverá nenhuma retoma significativa. As empresas vão continuar a sofrer, a economia continuará a abrandar”, antecipa.
Se o turismo foi o sector mais afectado, nenhuma área de actividade terá ficado incólume às medidas restritivas impostas para travar a propagação do SARS-CoV-2. Para Spencer Lima, a acontecer, a retoma chegará só no segundo semestre, consoante a evolução da situação pandémica e económica a nível internacional.
“Se as coisas melhorarem nos países emissores, também podemos começar a pensar em sair deste sufoco em que nos encontramos”, espera.
A norte, o novo presidente da Câmara de Comércio do Barlavento, Jorge Maurício, recorda que, com aquilo que já se sabe sobre a covid-19, é possível adoptar uma atitude diferente. Motivado, o responsável associativo sublinha a importância da confiança, da liderança e da comunicação para vencer os obstáculos que surgirão em 2021.
“É importante que os agentes económicos, as empresas, de uma forma em geral, tenham muita confiança no mercado. Acima de tudo, que tenham lideranças efectivas, que consigam marcar uma posição, ser de combate, resilientes e que saibam ultrapassar as barreiras que nos poderão vir a ser impostas. É importante uma comunicação séria e eficaz. Não vale a pena enganarmo-nos uns aos outros, dizer que o mercado está bem, que está tudo perfeito. É um contexto difícil, mas estaremos cá com confiança. É preciso reinventar, produzir mais”, resume.
“Penso que 2021 deverá ser melhor do que o ano anterior”, vaticina.
colapso do sector turístico (que vale ¼ do PIB), a quebra nas receitas fiscais e o aumento das despesas, para fazer face à emergência sanitária, económica e social, fazem o governo estimar que em 2020 tenha ocorrido uma recessão na casa dos 10%. Para 2021, as previsões são abaixo das contas do Banco Mundial. Ainda assim, a tutela espera que a economia possa terminar o ano a crescer acima dos 3%, valor que dependerá da retoma da actividade turística, condicionada pela evolução da pandemia ao longo dos próximos meses.
*com Fretson Rocha
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 998 de 13 de Janeiro de 2021.