1991
A primeira eleição presidencial por sufrágio universal e directo foi antecedida pelas primeiras eleições pluripartidárias de Cabo Verde, a ambas estão, na verdade, umbilicalmente ligadas. Mas é preciso ir um pouco mais atrás.
Dessas eleições presidenciais saiu, não o primeiro Presidente da República do Cabo Verde independente, mas o segundo. Aristides Pereira – o primeiro chefe de Estado – foi eleito a 4 de Julho de 1975, pela Assembleia Nacional Popular, órgão de soberania criado nesse mesmo dia, véspera da “Independência” pela Assembleia Constituinte. Depois, foi novamente investido no cargo em 1981 e 1986. Isto porque na altura, no regime do partido único, a escolha do Presidente era feita pelos deputados ANP e vinculada ao cargo de Secretário-geral do PAIGC/PAICV.
Com o processo de abertura política, iniciado em Fevereiro de 1990, começa a desenhar-se todo um novo contexto eleitoral em que o PR já não pode ser líder do partido. Em Abril, Aristides Pereira anuncia uma revisão constitucional para Setembro (na qual cai o famoso artigo 4.º e se institui o princípio de separação e interdependência dos poderes)e propõe a realização das eleições presidenciais por sufrágio directo e secreto em Novembro.
A ideia era, pois, realizar primeiro as eleições presidenciais, sendo que o Chefe de Estado eleito marcaria, posteriormente, as legislativas pluripartidárias.
O MpD discordou desta “ordem” e após múltiplas negociações com o PAICV chegou-se ao acordo: as eleições legislativas seriam marcadas para Janeiro de 1991. As presidenciais, por sufrágio directo e universal, para pouco depois, em Fevereiro.
A 13 de Janeiro, deram-se então as legislativas, nas quais o MpD liderado por Carlos Veiga venceu com cerca de 70% dos votos, garantindo 56 deputados na nova assembleia contra 23 do PAICV.
Logo depois, a 18 de Janeiro arrancou a campanha para as presidenciais. A concorrer contra Aristides Pereira, que tentava manter o título, estava António Mascarenhas Monteiro, apoiado pelo MpD.
Depois dos resultados das legislativas, e como o próprio Mascarenhas reconhecera, este tinha a sua caminhada facilitada “porque o povo mostrou claramente que quer mudança”. Assim foi. Mascarenhas Monteiro venceu as eleições de 17 de Fevereiro, com 72,1% dos votos.
Aristides Pereira ainda “ganhou” no Sal, Boa Vista, Maio e Fogo, mas os votos não chegaram para compensar a larga margem com que perdeu em outros círculos, nomeadamente em Santo Antão.
1996
As eleições de 1996, ocorridas a 18 de Fevereiro desse ano, foram um caso ímpar. Apenas um candidato entrou na corrida: António Mascarenhas Monteiro. A votação, não competitiva, apenas contemplava as opções “A Favor” e “Contra”.
O PAICV estava agastado com a derrota legislativa, e atravessava ainda o “deserto” que começara em 1991. Também não houve candidaturas sem cunho partidário.
Talvez por isso só haver um candidato, mais de metade dos eleitores (54,3%) decidiu ficar em casa naquele dia 18 de Fevereiro de 1996. Uma abstenção que foi igualada na segunda volta das eleições de 2011 e ultrapassada (64,3%) em 2016.
Em 96, o “Sim” a Mascarenhas Monteiro foi inequívoco (90.1%).
2001
As eleições de 2001 alinharam, mais uma vez, as cores vencedoras das legislativas e das presidenciais. Esse ano, marca o regresso do PAICV, agora liderado por José Maria Neves, ao poder.
Foi nesse novo quadro que, cerca de um mês depois, a de 11 de Fevereiro, decorreram as eleições presidenciais. Apresentaram-se à corrida cinco candidatos: Pedro Pires, Carlos Veiga (que abandonara o cargo de Primeiro-ministro para concorrer ao de Presidente), Jorge Carlos Fonseca, David Hopffer Almada e Onésimo Silveira, sendo que este último acabaria por desistir ainda na primeira volta.
Carlos Veiga, apoiado pelo MPD, conseguiu 45,15% dos votos, e Pedro Pires, apoiado pelo PAICV, 45,84%. Arredados da disputa ficaram os candidatos independentes, Jorge Carlos Fonseca (3,82%) e David Hopffer Almada (3,71%).
A 25 de Fevereiro ocorreu a segunda volta que resultou na vitória mais renhida da história das eleições. Pedro Pires conquistou 49,43% dos votos e Carlos Veiga 49,42% (menos 12 votos).
2006
Em Janeiro de 2006, o PAICV obteve nova maioria, elegendo 41 deputados para a Assembleia, contra 29 do MpD e 2 do UCID. José Maria Neves foi reconduzido no cargo de primeiro-ministro.
E no mês seguinte, Veiga e Pires voltam a defrontar-se nas presidenciais de 12 de Fevereiro. Presidente eleito, é muito frequentemente reeleito, e foi o que aconteceu. Pedro Pires vence, com uma vitória agora por margem pequena mas mais definida: 50,98%, contra 49,02%.
A abstenção foi de 41%, igual à da segunda volta das eleições transactas. Assim, é de salientar que até hoje, os embates presidenciais entre Pires e Veiga foram os que tiveram mais participação do eleitorado.
2011
Em 2011, o PAICV vence as legislativas em Fevereiro e as presidenciais, que por norma se realizavam em Fevereiro, aconteceram só em Agosto.
Concorreram a estas eleições quatro candidatos. Jorge Carlos Fonseca, que apesar de assumidamente independente (apresentara-se como candidato muito tempo antes) foi apoiado pelo MpD, Joaquim Monteiro, que faz aqui a sua estreia como candidato, Manuel Inocêncio, apoiado pelo PAICV e o deputado, também do PAICV, Aristides Lima (que já em 2009 assumira a candidatura). A candidatura de dois “homens” do PAICV vai colocar o partido em posição sensível. É que embora a cúpula do PAICV, incluindo o seu líder, tenha sido “eleito” Inocêncio como candidato, Lima decidiu também avançar com a sua candidatura, para a qual contou com várias figuras importantes do partido. A cisão interna foi evidente e chegou a temer-se consequências na estabilidade governativa.
A 7 de Agosto mais de metade (53,7%) dos eleitores foi às urnas e face às sondagens o resultado não deixou de ser algo surpreendente.
“As últimas sondagens colocam Aristides Lima na liderança das intenções de votos, Manuel Inocêncio em segundo lugar, seguido de Jorge Carlos Fonseca e de Joaquim Monteiro (1%)”, lia-se, a poucos dias das eleições, na PANA.
O resultado da primeira volta acabaria por ser, na realidade o seguinte: Jorge Carlos Fonseca conquistou 37,79% dos votos, Manuel Inocêncio, 32,65%; Aristides Lima, 27,71% dos votos e Joaquim Monteiro, 1,84% dos votos.
Mais uma vez, apenas vingam os candidatos com apoio partidário. Na segunda volta, ocorrida a 21 de Agosto, mais de metade dos eleitores ficam em casa (54,3%).
Contados os votos, Jorge Carlos Fonseca vence com 54,16% dos votos contra 45,7% dos conquistados por Manuel Inocêncio.
Nestas presidenciais de 2011 há um outro marco a registar: parece não ter havido um efeito contágio das legislativas. Pela primeira vez, o presidente eleito não era apoiado pela mesma “cor” do partido do governo.
2016
Magistratura de influência, Constituição acima de tudo, proximidade, entre outras linhas guias marcaram o primeiro mandato do Presidente Jorge Carlos Fonseca e parece terem convencido os eleitores quanto à reeleição.
O escritor e jurista conquistou 74,1% dos votos, nas eleições que a 2 de Outubro disputou com Albertino Graça (22,5%) e Joaquim Monteiro (3,4%). Apesar de várias personalidades do PAICV apoiarem o então reitor da Universidade do Mindelo, Albertino Graça, o partido – que foi derrotado nas legislativas desse ano – decidiu não apoiar oficialmente nenhuma candidatura.
2021
Este ano, Cabo Verde é de novo chamado a escolher o seu máximo representante. Concorrem a estas eleições, Carlos Veiga, que pela terceira vez se apresenta como candidato e conta com o apoio do MpD e da UCID. Outro veterano das presidenciais, que também concorre pela terceira vez é Joaquim Monteiro.
José Maria Neves, que cumpriu já três mandatos como primeiro ministro é outro candidato que se apresenta com apoio partidário, no seu caso do PAICV. Gilson Alves, Hélio Sanches, Casimiro de Pina e Fernando Delgado completam a lista de candidatos ao mais alto cargo da Nação.
A escolha do quinto presidente de Cabo Verde acontece a 17 de Outubro. A segunda volta, caso nenhum dos candidatos ultrapasse os 50% dos votos, está marcada para 31 de Outubro.
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Curiosidades
- Nunca houve eleições presidenciais tão concorridas como estas, de 2021
- Nunca venceu um candidato que não tivesse apoio partidário do PAICV ou do MpD. Aliás, sem esse apoio nem à segunda volta passaram.
- Nunca uma mulher se candidatou ao mais alto cargo da Nação
- Mascarenhas Monteiros foi o único candidato a vencer um presidente em funções. Foi também o único a concorrer sozinho (1996)
- As eleições presidênciais têm tido sempre taxas de abstenção bastante elevadas, pelo que convencer o eleitorado a ir às urnas é um dos maiores desafios de todos os candidatos. Nas eleições de 2016 a abstenção foi de 64,3%, um recorde.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1036 de 6 de Outubro de 2021.