Artigos de João Cardoso no nosso arquivo
Prosas Soletradas & Herdeiras da LU-A-SOL. Água de Gato
1. Nos tempos que correm nós temos que viver o tempo que é o nosso. Água de Gato é o local carregado de memória e de cicatrizes profundas, onde as mulheres encostam a cabeça aos ombros dos príncipes encantados a murmurarem uma voz felina dentro da voz d’outra alma ensimesmada. Há histórias d’amor com outros temperos e com atmosfera de prazeres não silenciados por uma sublime leveza de nuvens brancas. Lá, os olhos dormem aos pares apaixonados de costas voltadas. Mas, hoje, não podem voar como uma águia careca no Alasca; não podem suportar os ventos alísios d’outrora nas suas costas; nem como os ultramaratonistas do Sahara em Marrocos, porque as nádegas, os peitos, os seios – sobretudo – as bocas já não têm protecção dos dentes e nem a cana-cana dá para aquecer as gengivas, apesar dos rostos que salivam até que os lábios fiquem bruxuleantes. (Mas aos pares só peço para sorrirem com um bom dia ou boa noite através das janelas abertas aos céus). Ali, não há lágrimas de pares que nos prendem olhares e a sedução não vai morrer. Logo, pensei na história da “Beleza Banida” nos Camarões, onde mulheres são obrigadas a prender os seios de forma a fazê-los desaparecer. Pensei também na crueldade do hinduísmo dominante no Nepal onde nasceu a crença de que uma mulher menstruada é impura e transforma em impureza tudo aquilo em que toca. É a história da prática de “chhaupadi” (assim se chama). Bate, bate à porta de todas as jovens que crescem. E volta a bater, mês após mês, como angústia ou eterna predestinação, até à menopausa ou até que à morte antecipa o tempo. Tristemente, interroguei-me sobre a história da vida de jovens do Panje Project, que ensina às mulheres nas águas purpureu, em Zanzibar, a regra de desencorajá-las a aprenderem a nadar.
Prosas Soletradas & Herdeiras da LU-A-SOL: A estupidez
Ó zarpar-me-ei sem arrepios. Sim. “Zarpar-me-ei sem arrepios”. Afanosamente, um franzino pássaro fez-me hoje, uma surpreendente visita. Logo, empoleirou-se num mapa globo detrás da minha janela entreaberta - à busca da luz e de uma finíssima aragem primaveril -; como a querer desafiar-me para uma longa viagem ao Mundo para juntos provarmo-nos que ele é redondo. Pareceu-me que o pássaro trazia, nas asas, um elegante smoking da alta-costura inglesa. Pronto! Apesar de Thomas L. Friendman, o Bestseller, do New York Times, ter percecionado através de uma longa viagem à Índia de que o Mundo é Plano. Retorqui (longe de se pensar que o franzino pássaro era desalmado; longe da vista; longe do coração e longe de uma solidão muito maior do que o Mundo!)
Prosas Soletradas & Herdeiras da LU-A-SOL: Avião é Pássaro
Prosas Soletradas & Herdeiras da LU-A-SOL: Avião é Pássaro
Prosas Soletradas & Herdeiras da LU-A-SOL
XÂXÂ GONGON Caminhar, caminhar com o desigual silêncio do tempo longe do diabo. Caminhar, caminhar com o desigual silêncio do tempo longe dos despojos dos dias e com o desigual silêncio do tempo longe dos inconsolados.
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