Este é um Orçamento que aposta na resiliência. Na resiliência não só no sector da água, do saneamento e da agricultura, mas na diversificação da economia. Não podemos ter uma economia baseada na monocultura do turismo. Temos de apostar no sector portuário, no sector aeroportuário, transportes aéreos, transportes marítimos, sector energético, tecnologias. Temos de ter uma economia mais diversificada”, disse esta terça-feira o ministro das Finanças, Olavo Correia, durante a conferência de imprensa em que apresentou as linhas gerais do Orçamento do Estado para 2020 e cuja proposta já foi aprovada em Conselho de Ministros e entregue ao presidente da Assembleia Nacional.
“Este Orçamento vai colocar Cabo Verde num patamar de sustentabilidade, porque os maiores activos que um país pode apresentar é confiança, estabilidade macroeconómica, previsibilidade macroeconómica e melhoramento de negócios para que possamos reforçar a confiança na economia nacional”, acrescentou Olavo Correia.
Sem aumentos ou reduções de impostos
As duas centrais sindicais ouvidas pelo Expresso das Ilhas reclamaram por aumentos salariais e pela diminuição de impostos.
Para Joaquina Almeida, secretária geral da UNTC-CS, as perspectivas para o próximo Orçamento do estado “são péssimas”.
“São péssimas porque o governo está em constante incumprimento. O governo tinha dito que iria dar todos os anos 1% de aumento. No primeiro Orçamento, em 2016, não deu nada. O governo assinou com os parceiros, em 2017, um acordo de concertação estratégico que tem vindo a não cumprir. O governo é uma pessoa de bem, tem de honrar e cumprir com os seus compromissos. Em 2016 a actualização salarial foi de 0%, em 2017 0%, em 2018 0%, em 2019 fez uma actualização salarial para uma pequeníssima parte dos trabalhadores do quadro comum da função pública”, reclamou Joaquina Almeida.
“No OE acabado de ser apreciado pelos parceiros, em termos de actualização e actualização do poder de compra dos trabalhadores, 0%. Então, os parceiros – os representantes dos trabalhadores – reprovaram o OE, porque não resolve os problemas dos trabalhadores. Nós exigimos uma actualização salarial na mesma proporção da produção da riqueza nacional, porque quem produz são os trabalhadores e eles devem ter essa percentagem”, acrescenta.
Do lado da CCSL a questão da actualização salarial é também uma preocupação.
José Manuel Vaz, presidente daquela central sindical, também recorda que “há um acordo de concertação estratégica em que se prevê que o reajustamento salarial é feito em função da taxa de inflação e que desde 2006 não vem sendo cumprido, sobretudo pelo anterior governo. De 2006 a 2016 os trabalhadores perderam 25,5% do seu poder de compra. Nós vamos reunir na próxima sexta-feira, vamos analisar a situação e, em função disso, vamos pronunciar-nos sobre o que a CCSL deverá fazer a nível nacional”.
Vaz defende, por isso, um aumento salarial na ordem dos 1,3% (valor da taxa de inflação projectada para 2013), já Joaquina Almeida defende 5% de aumento. “Nós queremos um aumento de 5%, porque se o país está a progredir nessa proporção nós queremos um aumento igual” e acrescenta “Diz-se aos quatro ventos que há aumento do PIB em 5%, 6%, com possibilidade de 7%. Então porque não se dá nada aos trabalhadores? Nós estamos indignados, tristes com a posição deste governo que não respeita os trabalhadores”.
“A primeira nota”, respondeu Olavo Correia “é que temos de ter, em primeiro lugar um sentido de responsabilidade. Porque ninguém pode pensar em como o país conseguirá criar melhores condições de vida para todos aumentando salários de forma indiscriminada e irresponsável. Qualquer um de nós queria ter um salário melhor, mas o salário é resultado da produtividade. Em 2016 a inflação foi de -1,4%, em 2017 -0,8%, em 2018 1,3% e em 2019 1,3%”.
“A inflação acumulada é de 1,9% e nós demos, no ano passado, um aumento de 2,2% para o quadro comum. Para o quadro especial aumentamos, nos últimos três anos, só nos Planos de Cargos, Carreiras e Salários, 2,5 milhões de contos o que é um aumento, em média, de 10%. Seria muito irresponsável colocar em cima desses aumentos mais aumentos salariais. O país precisa de uma abordagem voltada para o equilíbrio entre a compensação e a produtividade. Não podemos olhar para salários sem olhar para a produtividade.”, disse ainda Olavo Correia.
“Não há espaço para mais aumentos”, concluiu o ministro.
No entanto, do lado da UNTC-CS, Joaquina Almeida reivindica que se “conseguimos aumentar o nosso PIB foi à custa dos trabalhadores. Este governo tinha o dever de, pelo menos, concretizar o que está no seu programa. Aos patrões convém que o governo não dê nada, porque se o governo não der eles também não dão. O governo pode dizer que actualizou os estatutos do PCCS, mas as promoções e as progressões são uma coisa à parte, são direitos adquiridos dos trabalhadores. São um direito natural de serem promovidos e de progredirem nas suas carreiras”.
Também a CCSL alinha pelo mesmo tom.
“Nós apresentamos uma lista das preocupações que a CCSL acha por bem deve ser analisada. Propusemos ao governo que relativamente ao salário mínimo na administração pública, que é de 15 mil escudos, seja aumentado para 25 escudos. Já ouvimos partidos políticos a defender esse aumento para 17 mil, somos contra, já ouvimos o aumento para 18 mil, somos também contra. O salário mínimo da administração pública é de 15 mil escudos e já há vários anos que os funcionários públicos não têm tido aumento, sobretudo as classes mais baixas. Por isso, a nossa proposta é passar de 15 para 25 mil escudos, porque aumentando para 17 ou 18 mil escudos o que vai acontecer é que, depois dos descontos, o trabalhador recebe na mão, líquidos, 15800$00. Isso não é aumento nenhum”.
IRPS mantém-se
Já em termos fiscais, “o governo não teve qualquer preocupação na proposta. Nada”, lamenta a secretária geral da UNTC-CS. “Apenas foi tido em atenção o IRPC para as empresas”, acrescenta Joaquina Almeida que defendeu que os trabalhadores “devem, em massa, pronunciar-se contra este governo nas próximas legislativas porque esteve a enganar-nos e os trabalhadores de Cabo Verde não merecem”.
“Nós estamos a trabalhar e no próximo ano vamos fazer uma reforma do IRPS. Por isso não quisemos estar a introduzir medidas avulsas. Estamos a fechar a reforma do IRPC e no próximo ano teremos as reformas do IRPS. Não podemos fazer tudo ao mesmo tempo, existem riscos no planos externo e no plano interno. Temos de ser prudentes, vamos fechar a gaveta do IRPC e depois vamos abrir a do IRPS, embora em 2017 já tenhamos introduzido uma série de alterações no IRPS. Mas vamos concluir esse processo para o Orçamento de 2021”, respondeu Olavo Correia
Progressões garantidas
Motivo de satisfação para José Manuel Vaz é o facto de o governo ter resolvido algumas pendências que ainda estavam por solucionar.
“O OE2020 tem aspectos com os quais nós estamos de acordo como a resolução de algumas reivindicações dos quadros privativos da Administração Pública como a aprovação do estatuto do pessoal da DNRE, do estatuto da Polícia Nacional, do estatuto do pessoal da IGAE e dos trabalhadores da Assembleia Nacional. O Orçamento prevê ainda a resolução dos pendentes na Administração Pública, as promoções, progressões e reclassificações de muitos funcionários de quase todos os ministérios e também os subsídios. Nomeadamente o subsídio por não redução da carga horária dos professores”.
Outro motivo de satisfação para o líder da CCSL está no facto de para 2020 estar igualmente previsto “o aumento do salário mínimo de 13 mil para 15 mil escudos, que é um acordo proposto pelo governo”.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 933 de 16 de Outubro de 2019.